Pesquisar este blog

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Mitos e verdades sobre a independência do Banco Central


Do blog Pragmatismo Político 
28/08/2014

A volta dos que não foram”.
*Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental















Mitos e verdades sobre a 'independência do Banco Central'

O que é a independência do Banco Central? 

Por que Marina e Aécio a defendem com unhas e dentes? 

Não é mera coincidência que ambas as candidaturas tenham transformado esta pauta em tema de destaque nas eleições



marina aécio banco central

Por que Marina e Aécio querem a independência do Banco Central? Não é mera coincidência que as candidaturas de Aécio e Marina incluam a proposta de independência do Banco Central como elemento de destaque (divulgação)

Paulo Kliass*

Ao que tudo indica, ainda não foram suficientes todos os ensinamentos a serem retirados da profundidade da atual crise econômico-financeira internacional, que teve início nos próprios Estados Unidos. 
Assistimos à falência amplamente reconhecida dos principais fundamentos de natureza teórica e conceitual que dão sustentação ao regime do financismo contemporâneo.
Pouco importa, pois o modelo que é considerado um paradigma a ser copiado pelos adeptos da perpetuação da desigualdade é o norte-americano. 
Não satisfeitos com a trombada da realidade objetiva, ainda assim eles insistem com a restauração da antiga ordem, com a reabilitação do antigo regime.
Ocorre que, para esse pessoal, a incapacidade revelada pela própria crise do mercado em encontrar soluções satisfatórias para os conflitos econômicos pouco importa.
 O Estado é sempre lento, ineficaz e incompetente. E ponto final! 
Esse pressuposto vale para os mais variados aspectos da vida social. Desde a oferta de serviços públicos básicos como saúde, educação e previdência. 
Até a operação de empresas como Petrobrás, Banco do Brasil ou BNDES. 
E passando por organismos de regulação, como as agências do tipo ANATEL, ANEEL e o Banco Central. 
É impressionante, mas vira e mexe esse tema volta à baila na agenda da política econômica.
Agora, à medida que avança o debate eleitoral, as candidaturas começam a estabelecer seus limites e revelar suas verdadeiras faces. 
A questão econômica ganha espaço em razão das dúvidas e incertezas a respeito do que fazer em 2015. 
E dentre os assuntos preferidos pelos defensores do financismo – sempre a postos! , diga-se de passagem – começa a despontar a tal da independência do Banco Central.
 Afinal se o “Federal Reserve” (conhecido por Fed, o BC dos Estados Unidos) é mesmo quase independente da Casa Branca, nada mais adequado do que importarmos esse sistema.
As concepções mais conservadoras do fenômeno econômico sempre tentaram emplacar esse tema.
 Na verdade, trata-se de sua preocupação em como tornar operacional o conceito de “autoridade monetária”. No modelo ideal de funcionamento da economia, algumas variáveis importantes devem ser submetidas a algum tipo de controle.
 É o caso, por exemplo, da quantidade ofertada de moeda na sociedade e do “preço” dessa mesma mercadoria muito especial – o dinheiro. E que vem a ser a própria taxa de juros, o chamado custo do dinheiro.
Por mais radical que seja o espírito liberal do interlocutor, a maior parte deles ainda aceita a idéia de que a moeda nacional seja um bem cuja responsabilidade é atribuição do Estado. 
Porém, o próprio sistema capitalista construiu um arcabouço financeiro de tal ordem, que a maior parte da oferta de “moeda” existente na sociedade é criada pelo próprio sistema bancário e demais instituições assemelhadas. 
O papel moeda tradicional é hoje em dia quase uma curiosidade, uma espécie em extinção. 
Assim, não basta mais sugerir apenas uma rígida supervisão das rotativas da Casa da Moeda. 
O controle efetivo sobre os meios de pagamento envolve uma ação mais incisiva da autoridade monetária sobre o universo financeiro.
Por outro lado, a definição da taxa oficial de juros (SELIC, no caso do Brasil de hoje) é também uma função do Banco Central. Ela é usada como referência mínima para a formação das taxas de juros praticadas pelos bancos em suas operações de depósito e de empréstimo. 
Além disso, é a taxa utilizada para remunerar a dívida pública. O BC pode atuar também no chamado “mercado cambial”, definindo a taxa de câmbio da moeda nacional em sua relação com as dos demais países. 
Caso deixe esse importante preço de referência ao livre sabor das forças de oferta e demanda, pode ocorrer o fenômeno que tem arrasado a realidade brasileira ao longo dos últimos anos: a sobrevalorização do real e a desindustrialização de nossa economia.
As regras institucionais também atribuem ao BC as funções de órgão regulador e fiscalizador do sistema financeiro. 
Cabe a ele a definição das condições de concessão de empréstimos e dos limites para a prática das taxas de juros nas operações de crédito. 
É mais do que sabido a enormidade dos spreads praticados em nossas terras, bem como o absurdo dos níveis das tarifas cobradas pelas instituições em suas relações com a clientela. 
O chamado “banco dos bancos” deve atuar como uma espécie de xerife do sistema financeiro, defendendo os interesses do conjunto da sociedade contra todo e qualquer tipo de abuso cometido pelos bancos
Pois bem, frente a esse significativo encargo de responsabilidades, nada mais recomendado que a nomeação dos dirigentes dessa instituição seja atribuída à Presidência da República. 
A indicação de nomes para ocupar essa função ainda passa pela sabatina efetuada pelo Senado Federal, em uma indicação de que o poder legislativo também possa alertar a respeito de algum exagero. 
No caso brasileiro mais recente, o ex-Presidente Lula contribuiu inclusive para ampliar ainda mais a autonomia existente, ao encaminhar uma Medida Provisória equiparando o cargo ocupado por Henrique Meirelles ao de Ministro da República.
Ocorre que para o financismo esse quadro é pouco; eles querem mais. 
Não basta a autonomia concedida a um ex-presidente internacional do Bank of Boston, que ficou exatamente 8 anos à frente do BC, atendendo a todos os interesses da banca privada. 
Um período em que a autoridade monetária governou mais para os bancos e menos para o conjunto da sociedade. 
Dois mandatos em que as taxas de juros estratosféricas eram definidas pela COPOM sem nenhuma prestação de contas, nem ao governo oe menos ainda à sociedade.
Com o argumento malandro de que o governo pode influenciar “politicamente” na definição da política monetária, o financismo agora pede um pacote completo: deseja a independência do BC.
Voltam com a argumentação surrada e mal lavada de que é importante haver “técnicos” não suscetíveis de serem influenciados por quem estiver ocupando o Palácio do Planalto.
Mas o presidente do BC deve ser independente de quem, cara pálida? 
O sonho de consumo da banca é um quadro de dirigentes no comando da autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda que não respondam a ninguém. 
Ou melhor, que atendam tão somente aos interesses das instituições que deveriam controlar.
Ora, todos sabemos que as decisões e as consequências relativas ao rumo da economia são de natureza absolutamente política. 
Daí que a responsabilidade por elas deve ser de que tem legitimidade para tanto – o Presidente da República. 
Não existe isenção ou neutralidade nas decisões de política econômica. 
Exatamente por sua natureza multidisciplinar, a economia é parte integrante das ciências sociais. 
Não existe apenas uma alternativa técnica e adequada para cada caminho a se trilhar.
Assim, um desenho institucional que confira independência política e administrativa a seus dirigentes é de uma irresponsabilidade inimaginável. 
As funções da autoridade monetária são políticas e os responsáveis por elas devem ser passíveis de remoção a qualquer instante. 
Conceder um mandato com prazo fixo para eles equivale a assinar um cheque em branco para atuarem da forma que bem entenderem.
 A tecnocracia não tem legitimidade para tanto: ela não foi eleita para nada. 
Cabe ao dirigente político efetuar a boa escolha de seus assessores de confiança a cada momento. E responder pelos equívocos cometidos.
Não é mera coincidência que as candidaturas de Aécio e Marina incluam este ponto como elemento de destaque. 
Afinal, os conselheiros econômicos de ambos foram os principais responsáveis pela condução da política econômica no auge do neoliberalismo, durante a gestão de FHC. 
Estiveram à frente do processo de privatização das empresas estatais, promoveram um importante desmonte do aparelho do Estado, desregulamentaram a economia concedendo todo tipo de facilidades ao chamado “mercado” e aprofundaram a hegemonia do capital financeiro em nosso sistema econômico e social. 
Agora, ao que tudo indica, pretendem continuar a obra inacabada. Como passaram os últimos 12 anos trabalhando diretamente no interior do financismo, propõem agora a efetivação da independência do BC. 
Algo como o roteiro de um filme que poderia ter como título
... A VOLTA DOS QUE NÃO FORAM...

Nenhum comentário:

Postar um comentário