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quarta-feira, 26 de junho de 2013

Em nota, PCdoB apoia Dilma por mudanças

Rumo  avançado para a mobilização social que agita o Brasil.

Do Vermelho


Em nota, PCdoB apoia Dilma por mudanças

26 junho 2013

Em reunião extraordinária realizada nesta terça-feira (25), em Brasília, a Comissão Política Nacional do PCdoB debateu a situação do país diante das manifestações populares que tomaram as ruas de diversas cidades brasileiras e as medidas anunciadas pela presidenta Dilma Rousseff na segunda (24) na reunião com governadores e prefeitos das capitais.

O Partido reafirmou a atitude política adotada desde o começo da jornada de mobilizações, que trata da importância de “o governo e as forças progressistas ouvirem atentamente a voz das ruas e se empenharem para atendê-la”. 

Ao mesmo tempo, os comunistas rechaçaram “os atos de violência, vandalismo e destruição que nada têm a ver com o brio e o espírito patriótico da maioria dos manifestantes”. 

Leia abaixo a íntegra da nota da Comissão Política Nacional do PCdoB:

 Com a energia das ruas, unir forças progressistas por mais conquistas para o povo

No decorrer da última semana, eclodiram manifestações sociais massivas e espontâneas em várias capitais e cidades do país, com a presença destacada da juventude estudantil. 

Como há muito tempo não acontecia, a política nacional foi pautada por um vigoroso protesto das ruas, inicialmente voltado contra o aumento das tarifas de transporte público, mas que rapidamente assumiu bandeiras mais amplas como as reivindicações por melhores serviços públicos nas áreas de saúde, educação, mobilidade urbana e contra a corrupção. 

Diante de tais acontecimentos, o PCdoB reafirma a atitude política que adotou desde que começou essa jornada de mobilizações: o governo e as forças progressistas precisam ouvir atentamente a voz das ruas e se empenharem para atendê-la. 

Ao mesmo tempo, os comunistas rechaçam os atos de violência, vandalismo e destruição que nada têm a ver com o brio e o espírito patriótico da maioria dos manifestantes.

Os fatos desencadeadores das grandes manifestações se deram na cidade de São Paulo com o movimento pela redução das tarifas do transporte coletivo. 

No dia 13 de junho, a Polícia Militar, sob o comando do governo estadual do PSDB, empreendeu uma truculenta repressão contra os manifestantes. Este ato de violência afrontou a consciência democrática de milhares e, daí por diante, em ondas crescentes emergiram passeatas em várias capitais do país e mesmo em municípios do interior.

 O ápice delas, até aqui, se deu no último dia 20, quando se calcula que mais de um milhão de pessoas foram às ruas. À medida que se configuraram como um movimento espontâneo, a grande mídia tentou, de modo oportunista, “assumir o comando” de tais manifestações, manipulando o seu significado e buscando direcioná-las contra o governo da presidenta Dilma Rousseff. 

Incentivou a equivocada hostilidade e aversão aos partidos políticos, inclusive dando guarida a deploráveis atos de agressão a militantes de legendas de esquerda, promovidos por grupelhos de extrema-direita.

Objetivamente, pelo forte eco no Brasil e no exterior, as passeatas transbordaram das ruas para o âmago da política nacional. Em razão disto, a presidenta da República, no último dia 21, fez um importante pronunciamento à Nação no qual destacou, corretamente, que as manifestações “mostram a força de nossa democracia e o desejo da juventude de fazer o Brasil avançar”. 

Quanto às possibilidades desencadeadas pela luta em curso, ela afirmou ser preciso aproveitar o vigor das ruas “para produzir mais mudanças que beneficiem o conjunto da população brasileira”. Posteriormente, no dia 24, ela sistematizou a proposta de um pacto, envolvendo governadores, prefeitos, partidos e lideranças do movimento social.

 Este pacto, segundo ela, tem por finalidade dar resposta concreta às reivindicações que vêm das ruas e que abordam os seguintes temas: responsabilidade fiscal, com o objetivo de manter a estabilidade da economia e o controle da inflação; proposta de um debate sobre a convocação de um plebiscito que autorize uma Constituinte para fazer a reforma política democrática; projeto que tipifique a corrupção como crime hediondo; melhoria do sistema de saúde do país, acelerando os investimentos; melhorar a qualidade do transporte público e criar o Conselho Nacional do Transporte Público, com participação da sociedade e dos usuários; e, por fim, mais recursos para a educação com a destinação de 100% dos recursos dos royalties do petróleo.

O PCdoB apoia a conduta política da presidenta Dilma Rousseff de ouvir as ruas e de procurar atender às suas reivindicações com agilidade. Enquanto não for destinado um volume consideravelmente maior de recursos e investimentos para o Sistema Único de Saúde (SUS), sobretudo os que dele mais precisam – os trabalhadores e os pobres –, diariamente vão continuar a sofrer uma verdadeira via crucis por uma consulta, por um exame, sem falar de cirurgias. 

Enquanto a educação pública não tiver mais recursos, o povo verá seus filhos com o futuro comprometido. Do mesmo modo, a péssima qualidade de vida nos centros urbanos impõe a necessidade de uma ampla Reforma Urbana que garanta moradia digna, saneamento ambiental, mobilidade - principalmente transporte público eficiente e barato. 

É preciso também garantir ao povo o direito à paz e à segurança uma vez que violência ceifa a vida de milhares de brasileiros, especialmente jovens. 

O PCdoB também concorda com a presidenta de que é preciso romper o cerco do conservadorismo e realizar uma reforma política democrática ouvindo amplos setores da sociedade. 

Reforma que abra as portas da política para o povo e que coíba a influência do poder econômico nos processos eleitorais, com adoção do financiamento público exclusivo das campanhas; e reforma que fortaleça os partidos políticos e institua formas de democracia participativa e direta. 

Finalmente, o Partido apoia um combate ainda mais severo à corrupção e que este tipo de crime seja considerado hediondo.

A grande mídia inunda a opinião pública com mil análises sobre a razão e o sentido das grandes manifestações ocorridas. Mas a maioria delas, pura falsificação, faz crer que o ciclo progressista iniciado em 2003 está superado. 

Para o PCdoB, as manifestações são justamente produto deste ciclo político das forças democráticas e progressistas. Nos últimos dez anos, o povo obteve conquistas, elevou seu nível de consciência política e o país respira democracia. As manifestações fazem parte do legado deste último decênio: uma população que se levanta, disposta a lutar pelos direitos e por um Brasil melhor. As ruas dizem que as conquistas iniciadas não podem parar e que as mudanças precisam ser aceleradas, uma vez que um decênio de mudanças é insuficiente para superar a enorme desigualdade social herdada de séculos de história. 

A oposição de direita e a grande mídia pretendem acirrar ainda mais a luta política contra o governo e se possível fomentar uma grave crise política. Este estratagema da direita não pode ser minimizado, mas o PCdoB está convicto de que este intento oportunista pode e será derrotado.

Ao contrário do que trama a direita, o governo poderá sair desse processo fortalecido. O caminho foi apontado pela própria presidenta Dilma Rousseff: aproveitar o vigor das manifestações para que mais mudanças aconteçam em benefício do povo. 

A realidade política criada pelas ruas em ebulição pode ajudar a gestar e formar um novo bloco das forças políticas e sociais progressistas e populares, de todos quantos estejam comprometidos com uma plataforma que impulsione o desenvolvimento e o progresso social. 

Este novo bloco se constituirá em torno de uma plataforma que dê resposta às exigências das ruas e à realização das reformas democráticas sem as quais as mudanças não avançam. Para o PCdoB, além das bandeiras já propostas pela presidenta, são urgentes a reforma dos meios de comunicação, a reforma do Judiciário e a reforma tributária progressiva que inverta a lógica reinante na qual quem paga impostos são os trabalhadores e os mais pobres. Uma reforma que taxe as grandes fortunas e seja fator de combate às desigualdades.

As grandes mobilizações de massa criaram uma situação política instável e nova, cujo desfecho ainda está por acontecer. Seu sentido e rumo estão em disputa. E tal situação exige mobilização e ação do campo político democrático e popular, em especial da esquerda, para que efetivamente avancem as mudanças, fortalecendo o governo e a liderança da presidenta Dilma Rousseff.

Brasília, 25 de junho de 2013
A Comissão Política Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)

quarta-feira, 12 de junho de 2013

As razões secretas para não aprovar a Reforma Política ( 2a parte)

Nesta segunda parte do artigo, você compreenderá por que o STF declarou inconstitucional a malfadada cláusula de barreira da lei partidária. Compare os dados da planilha e se escandalize com as  restrições à democracia que os grandes partidos impuseram na lei. 


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DISTRIBUIÇÃO DOS RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO16


As planilhas do TSE16, referentes à distribuição dos recursos do Fundo Partidário dão a exata dimensão que o assunto encerra: somente em 1999, por exemplo, o Tesouro Nacional, via do TSE, destinou mais de 51 milhões de reais ao funcionamento dos partidos políticos.

 Não se questiona seja aplicado dinheiro público em prol do funcionamento da democracia, mas sim a péssima distribuição que lhe é dada, privilegiando alguns poucos, em detrimento da grande maioria dos partidos.

Visualizada a gritante injustiça do rateio, em que a um único partido são destinados até 20% do total, é de perguntar-se como, de 1995 para 1996, operou-se tanto a milagrosa multiplicação de recursos como a concentração de somas milionárias nos cofres de alguns poucos partidos? 

Como o PMDB, que recebeu em 1995 a quantia de R$ 490 mil, deu espetacular salto, para receber no ano seguinte a incrível soma de R$ 10,5 milhões? Simples. Bastou às grandes bancadas aprovarem uma lei no Congresso, a atual lei partidária. 

Ali se inscreveu que a União fará, a cada ano, dotação orçamentária correspondente a R$ 0,35 por eleitor.17 E assim, com o advento da Lei 9.096/95, sepultou-se o que restava do entulho autoritário, a Lei Orgânica dos Partidos, que sobreviveu por precisos dez anos após o fim da ditadura.

 Inegável que a atual lei representou avanços consideráveis em relação ao ordenamento legal anterior. Mas é indubitável, igualmente, que a mesma encerra contradições gravíssimas, eivada que está de disposições de caráter antidemocrático, que lançam nódoas na presente experiência de democracia liberal burguesa.

Em breve resumo, a distribuição dos recursos do Fundo Partidário é feita pela seguinte regra: do total, 1% é dividido entre todos os partidos que tenham estatuto registrado no TSE; 29% são divididos entre os partidos que obtiveram mais de 1% da votação nacional; e 71% são divididos apenas entre os partidos que obtiveram no mínimo 5% da votação nacional.

 Essas são as disposições do art. 41, incisos I e II , da LPP. Há que se ressaltar que apenas parcela ínfima, correspondente a 1% do Fundo Partidário é dividida por igual entre todos os partidos. As outras duas parcelas são destinadas a cada um na proporção dos votos obtidos pelos partidos na eleição imediatamente anterior para a Câmara dos Deputados.

Além do mais, apenas os sete partidos que ultrapassaram a barreira dos 5% (PFL, PSDB, PMDB, PPB, PT, PTB E PDT) participam do rateio em todas as faixas, o que faz avultar a desigualdade.

Não há como negar: a atual Lei dos Partidos não prima pelo respeito aos princípios da igualdade e da democracia. Como se vê na tabela apresentada, no exercício de 1999, os sete maiores partidos abocanharam 97,19% do total de recursos do Fundo Partidário. 

No entanto, no pleito de 1998 elegeram, juntos, apenas 90,05% dos deputados federais, o que comprova a tese de que os chamados grandes partidos dão a si próprios direitos maiores que o resultado eleitoral que auferem.

É de se refletir: afinal, quem são os pilares da democracia? Os partidos políticos, que devem ser permanentes, ou as suas representações parlamentares, que são transitórias? E pior: isso ainda não é tudo. Há mais maldades no texto da lei, mais e mais regras discriminatórias, sempre ancoradas nas magnitudes das bancadas parlamentares, como se prossegue a analisar.


DISTRIBUIÇÃO DO HORÁRIO GRATUITO


Com disciplinamento dado pelos artigos 45 a 49 da LPP, e ainda por Resoluções do TSE18, temos que os sete partidos que se enquadram no art. 13, ou seja, ultrapassaram a barreira de 5% dos votos para a Câmara dos Deputados, dispõem de 20 minutos por semestre para transmissão em cadeia nacional, e de igual tempo para a cadeia estadual. 

Têm direito ainda a 40 minutos por semestre para inserções nas redes nacionais de rádio e tv, e mais 40 minutos para inserções nas emissoras estaduais (art. 49, incisos I e II), sempre para a divulgação de plataforma programática, sendo nele vedada qualquer propaganda de cunho eleitoral. A propaganda eleitoral gratuita dispõe de espaço específico nos meios de radiodifusão, e é disciplinada, também de forma arbitrária, pela lei eleitoral.

Já os partidos tratados pela lei como de "segunda categoria", aqueles que se encaixam na norma provisória do art. 57, que ultrapassaram apenas a "barreirinha" de 1%, só podem utilizar 10 minutos por semestre para a cadeia nacional e 20 minutos para as inserções nas redes nacionais. Para esses, não há cadeias estaduais. As inserções nas emissoras estaduais, de 20 minutos por semestre, somente são autorizadas para os partidos que elegerem pelo menos um Deputado Estadual e obtiverem no mínimo 1% dos votos do Estado para a Assembléia Legislativa.

Existem ainda os partidos tratados pela LPP como de "terceira categoria": são aqueles que não conseguiram nem mesmo atingir 1% dos votos para a Câmara dos Deputados. Para esses, o art. 48 da lei supra reservou apenas uma cadeia nacional de 2 minutos de duração, para a divulgação da plataforma programática.

O quadro abaixo, relacionando todos os partidos com registro no TSE em 1998, resume a desigualdade: 

                  





                          PARTIDO


DEPUTA-
DOS FEDE-RAIS ELEI-
TOS (1998)

    

    % VOTA-ÇÃO NACIO-

NAL (1998)


TEMPO
 P/ 
CADEIA NACIO-
NAL TV e RADIO (MIN/ SEMES-
TRE.)


   TEMPO

 P/

 CADEIA ESTA-

DUAL 

TV e 

RÁDIO (MIN/ SEMES-

TRE.)


TEMPO P/ INSERÇÕES
NACIONAIS TV 
e RÁDIO (MIN/
SEMES-
    TRE)

 


TEMPO P/
INSERÇÕES ESTA-
DUAIS 
TV e RÁDIO (MIN./
SEMES-
TRE)
1. Partido da  Frente Liberal – PFL

105

18,59%
20
20
40
40
2. Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB
99
18,85%
20
20
40
40
3. Partido do Movimento Democrático Brasileiro- PMDB
83
16,30%
20
20
40
40
4. Partido Progressista Brasileiro – PPB
60
12,19%
20
20
40
40
5. Partido dos Trabalhadores - PT
59
14,18%
20
20
40
40
6. Partido Trabalhista Brasileiro – PTB
31
6,08%
20
20
40
40
7. Partido Democrático Trabalhista – PDT
25
6,09%
20
20
40
40
8. Partido Socialista Brasileiro – PSB
18
3,67%
10
20
20*
9. Partido Liberal – PL
12
2,65%
10
20
20*
10. Partido Comunista do Brasil – PCdo B
7
1,40%
10
20
20*
11. Partido Popular Socialista - PPS***
3
2
12. Partido Social Democrático – PSD
3
2
13. Partido da Mobilização Nacional – PMN
2
2
14. Partido Social Cristão – PSC
2
2
15. Partido Verde – PV
1
2
16. Partido Social Liberal – PSL
1
2
17. Partido da Reedificação da Ordem Nacional – PRONA
1
2
18. Partido Social Trabalhista - PST
2
19. Partido Republicano Progressista – PRP
2
20. Partido da Reconstrução Nacional – PRN
21. Partido Trabalhista do Brasil – PT do B
2
22. Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados – PSTU
2
23. Partido Comunista Brasileiro – PCB
2
24. Partido Renovador Trabalhista Brasileiro - PRTB
2
25. Partido da Solidadariedade Nacional – PSN
2
26. Partido Social Democrata Cristão – PSDC
2
27. Partido da Causa Operária – PCO
2
28. Partido Trabalhista Nacional – PTN
2
29. Partido dos Aposentados da Nação – PAN
2
30. Partido Geral dos Trabalhadores - PGT **
2

* somente para os que elegeram pelo menos um Deputado Estadual e obtiveram no mínimo 1% dos votos do Estado para a Assembléia Legislativa.

** à época, com registro definitivo "ad referedum".

*** de 11 a 30, partidos que não atingiram a votação mínima de 1%.


Não se poderia deixar de registrar nessas linhas que é bem verdade que existem aqueles partidos ditos de aluguel, que funcionam como meros apêndices de outros; que são agremiações criadas por espertalhões que os reduzem a verdadeiro balcão de negócios, mormente por ocasião dos pleitos. Mas tal fato, em hipótese alguma, pode justificar as agudas distinções contidas na lei. 

Aliás, que espertezas poderão ser maiores que as concessões de rádio e tv que viabilizaram os votos necessários à prorrogação do mandato de Sarney em 1988 ? Ou a desbragada compra de votos denunciada em fita gravada por deputados acreanos, quando da votação da Emenda Constitucional nº 16, de 04/06/1997, que permitiu fosse reeleito o Presidente Fernando Henrique Cardoso?

Definitivamente, o discrímem, a restrição antidemocrática não é o caminho. Há medidas outras, que adiante se vão apresentar, de natureza democrática, que podem e devem ser tomadas para impedir o oportunismo e o mercantilismo partidário. 

Ademais, é evidentemente excessiva a preocupação manifestada pelas elites políticas, imediatamente a partir de 1985, de se controlar o número de partidos no Brasil. Observe-se que na Espanha, durante a abertura controlada do primeiro ministro Adolfo Soares, após a morte de Franco, quando não havia propriamente um modelo liberal, existiram nada menos que 160 partidos19

Enquanto isso, no Brasil, que possui um universo de mais de 100 milhões de eleitores, somam 30 os partidos com registro definitivo no TSE.20

A permanecer inalterada a legislação vigente, resta concluir que, a partir da proclamação dos resultados da eleição de 2.006, com o fim da regra de transição, os partidos que não alcançarem o percentual mínimo de 5% da votação nacional, sofrerão rebaixamento para aquela faixa que aqui denominamos de "terceira categoria".

 Vale dizer: só participarão do rateio de 1% do Fundo Partidário e terão apenas 2 minutos em cadeia nacional por semestre. A partir daí é que se terá que dar conteúdo preciso ao dispositivo inserto no artigo 13 da LPP, que afirma só ter direito ao funcionamento parlamentar os partidos que atingirem a votação mínima de 5% dos votos para a Câmara dos Deputados.

Note-se ainda que esse horário gratuito destina-se à difusão do programa do partido e de sua execução, das atividades congressuais, ou à divulgação do posicionamento partidário frente a temas político-comunitários21

Consagra a lei, dessa forma, uma premissa falsa: a de que alguns partidos têm mais a dizer que outros.

(continua...)

Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/6142/o-dificil-caminho-da-democracia/2#ixzz2W2ClgK2H


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Informações sobre o texto

Trabalho acadêmico apresentado para obtenção do título de especialista em Políticas Públicas pela UFG (Departamento de Ciências Sociais), em agosto de 2000.

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

FREITAS, Luiz Carlos Orro de. O difícil caminho da democracia: crítica da legislação eleitoral e partidária do Pós-85. Jus Navigandi, Teresina, ano 10n. 5431 jan. 2005 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6142>. Acesso em: 12 jun. 2013.


Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/6142/o-dificil-caminho-da-democracia/2#ixzz2W2HJGPas

Ódio de classe contra o Bolsa Família

terça-feira, 11 de junho de 2013

Ódio de classe contra o Bolsa Família

Por Fátima Oliveira, no blogViomundo:

Eu não tinha a dimensão do ódio de classe contra o Bolsa Família. Supunha que era apenas uma birra de conservadores contra o PT e quem criticava o Bolsa Família o fazia por rancor de classe a Lula, ou algo do gênero, jamais por ser contra pobre matar a sua fome com dinheiro público.

Idiota ingenuidade a minha! A questão não é de autoria, mas de destinatário! Os críticos esquecem que a fome não é um problema pessoal de quem passa fome, mas um problema político. E Lula assumiu que o Brasil tem o dever de cuidar de sua gente quando ela não dá conta e enquanto não dá conta por si mesma. E Dilma honra o compromisso.

Estou exausta de tanto ouvir que não há mais empregada doméstica, babá, “meninas pra criar”, braços para a lavoura e as lidas das fazendas que não são agronegócios… E que a culpa é do Bolsa Família!

Conheço muita gente que está vendendo casas de campo, médias e pequenas propriedades rurais porque simplesmente não encontra “trabalhadores braçais” nem para capinar um pátio, quanto mais para manter a postos “um moleque de mandados”, como era o costume até há pouco tempo! E o fenômeno é creditado exclusivamente ao Bolsa Família.

Esquecem a penetração massiva do capitalismo no campo que emprega, ainda que pagando uma “merreca”, com garantias trabalhistas, em serviços menos duros do que ficar 24 horas por dia à disposição dos “mandados” da casa-grande, que raramente “assina carteira”. Eis a verdade!

Esquecem que a população rural no Brasil hoje é escassa. Dados do IBGE de setembro de 2012: a população residente rural é 15% da população total do país: 195,24 milhões.

Não há muitos braços disponíveis no campo, muito menos sobrando e clamando por um prato de comida, gente disposta a alugar sua força de trabalho por qualquer tostão, num regime de quase escravidão, além do que há outras ocupações com salários e condições trabalhistas mais atraentes do que capinar, “trabalhar de aluguel”, que em geral nem dá para comprar o “dicumê”. Dados de 2009 já informavam que 44,7% dos moradores na zona rural auferiam renda de atividades não agrícolas!

Basta juntar três pessoas de classe média que as críticas negativas ao Bolsa Família brotam como cogumelos. Após a boataria de 18 de maio, que o Bolsa Família seria extinto, esse assunto se tornou obrigatório. Fazem questão de ignorar que ele é o maior e mais importante programa antipobreza do mundo e foi copiado por 40 países – é uma “transferência condicional de renda” que objetiva combater a pobreza existente e quebrar o seu ciclo.

Atualmente, ajuda 50 milhões de brasileiros: mais de 1/4 do povo! E investe apenas 0,8% do PIB! Sem tal dinheiro, mais de 1/4 da população brasileira ainda estaria passando fome!

Mas há gente sem repertório humanitário, como as que escreveram dois tuítes que recebi: “Nunca vi tanta gente nutrida nas filas dos caixas eletrônicos para receber o Bolsa Família, até parecia fila para fazer cirurgia bariátrica”; e “Eu também nunca havia visto tanta gente rechonchuda reunida para sugar a bolsa-voto!”.

Como disse a minha personagem dona Lô: “Coisa de gente má que nunca soube o que é comer pastel de imaginação; quem pensa assim integra as hostes da campanha Cansei de Sustentar Vagabundo, que circulou nas eleições presidenciais de 2010”. São evidências de que há gente que não se importa e até gosta de viver num mundo em que, como escreveu Josué de Castro, em Geografia da Fome (1984): “Metade da humanidade não come e a outra não dorme com medo da que não come…”.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Marx e Engels e a tradição democrática - Augusto Buonicore

- Do vermelho
Marx e Engels e a tradição democrática
Por Augusto Buonicore
Podemos afirmar que, ao contrário do que dizem os teóricos e políticos liberais, Marx e Engels se inserem, plenamente, no interior da tradição democrática, na qual também se incluem Rousseau, Blanqui e os cartistas ingleses.
 Para esses a democracia não podia ser definida – à moda schumpeteriana – como um simples método de selecionar os líderes encarregados de governar. 
Democracia, para Rousseau e seus sucessores, se confundia com “soberania popular”. Ou seja, era a condição pela qual o conjunto dos cidadãos, efetivamente, decidia sobre os rumos da política.
Podemos afirmar que, ao contrário do que dizem os teóricos e políticos liberais, Marx e Engels se inserem, plenamente, no interior da tradição democrática, na qual também se incluem Rousseau, Blanqui e os cartistas ingleses. Para esses a democracia não podia ser definida – à moda schumpeteriana – como um simples método de selecionar os líderes encarregados de governar.
Democracia, para Rousseau e seus sucessores, se confundia com “soberania popular”. Ou seja, era a condição pela qual o conjunto dos cidadãos, efetivamente, decidia sobre os rumos da política. No entanto, sabiam muito bem que, enquanto o povo estivesse submetido ao “reino da propriedade privada”, a soberania popular não poderia ser realizada plenamente. Rousseau foi uma exceção – ou uma excrescência – na tradição liberal. O mesmo podemos dizer de seu fiel discípulo Robespierre, que levou a revolução democrático-burguesa na França até os seus limites; ou seja, levou-a a um ponto que tornou-a irreconhecível para a própria burguesia.
Até a primeira metade do século XIX, na retórica liberal-burguesa, a democracia política se confundia com o “despotismo das massas” e o “comunismo”. A operação ideológica de fusão entre liberalismo e democracia ainda não havia começado. Processo analisado de maneira primorosa por Domenico Losurdo.
Foi nesse ambiente que dois jovens comunistas alemães, Marx e Engels, ingressaram no movimento democrático e socialista internacional que se formava, constituindo assim uma espécie de ala esquerda e proletária. Engels escreveu em 1847: “Os comunistas, longe de provocar, nas atuais circunstâncias, confrontos inúteis com os democratas, se comportam como democratas em todas as questões práticas do partido.
 A democracia tem como consequência necessária em todos os países avançados o poder político do proletariado, e o poder político do proletariado é a primeira condição prévia da iniciativa comunista”. Ainda neste ano afirmaria: “onde a democracia não haja sido conquistada, os comunistas e os democratas lutam lado a lado, e os interesses dos democratas são também os interesses dos comunistas. Até esse momento as divergências de ambos partidos têm um caráter puramente teórico (...) sem prejuízo algum para as ações comuns”.
Karl Marx, representando a Associação Fraternal Democrática da Bélgica, num discurso, afirmou: “Os democratas da Bélgica estão convencidos de que os cartistas da Inglaterra são verdadeiros democratas e de que no momento em que tenham realizado os seis pontos de seu programa, o caminho da liberdade estará aberto para todo o mundo.
 Alcançai este grande objetivo, trabalhadores da Inglaterra, e sereis considerados os salvadores de toda a humanidade.” Quais eram essas reivindicações que, se conquistadas, abririam o caminho da liberdade para a classe operária e “toda a humanidade”? 1º) Instituição do sufrágio universal; 2º) igualdade dos distritos eleitorais; 3º) supressão do censo exigido dos candidatos ao Parlamento; 4º) eleições anuais; 5º) voto secreto; e 6º) remuneração aos membros do Parlamento. Algo não muito radical, aos olhos de hoje.
Assim, o esboço de um programa do que chamamos atualmente de democracia burguesa foi expresso pela primeira vez, de maneira mais ou menos articulada, pela classe operária inglesa a partir de 1842 e, imediatamente, condenado pelas classes proprietárias de todo o mundo. O sufrágio universal seria utilizado de maneira pioneira na França após a revolução democrático-popular de fevereiro de 1848. O princípio havia sido estampado anteriormente na Constituição jacobina de 1793, mas não pôde ser implementado devido à contrarrevolução liberal.
Quando eclodiu a Revolução Alemã, Marx e Engels voltaram do exílio e passaram a editar o jornal Nova Gazeta Renana, como “órgão da democracia”. Então, apresentaram uma plataforma política para aquela revolução, as Reivindicações do Partido Comunista na Alemanha – uma adaptação do Manifesto do Partido Comunista à situação da revolução burguesa que se desenvolvia. A primeira das reivindicações era: “Toda Alemanha será declarada uma República una e indivisível”.
Outra atitude tomada foi ingressarem na Associação Democrática de Colônia, buscando fortalecer a sua ala mais avançada, que era composta por elementos radicais da burguesia liberal, da pequena burguesia e do proletariado alemão. Tais decisões foram duramente criticadas pelos elementos esquerdistas da Liga dos Comunistas, que pediram a imediata expulsão dos dois revolucionários alemães, acusando-os de traírem o programa internacional que eles mesmos haviam elaborado: o Manifesto do Partido Comunista.
Engels, mais tarde, em 1884, justificaria as posições tomadas em 1848: “Os operários alemães tinham que conquistar, antes de tudo, os direitos que lhes eram indispensáveis para se organizarem de modo independente, como partido de classe. (Por isso) quando fundamos na Alemanha um grande periódico, nossa bandeira não podia ser outra senão a bandeira da democracia; porém uma democracia que destacava sempre, e em cada caso concreto, o caráter especificamente operário que ainda não podia estampar de uma vez para sempre em seu estandarte.
 Se não houvéssemos procedido desse modo, se não houvéssemos aderido ao movimento, incorporando-nos àquela ala que já existia, que era a mais progressista, e que, no fundo, era uma ala proletária, para impulsioná-la para frente, não nos teria sobrado outro remédio senão pormo-nos a predicar o comunismo em algum jornalzinho local e fundar, em vez de um grande partido de ação, uma pequena seita. Porém o papel de pregadores no deserto não nos caía bem; havíamos estudado demasiado bem os utopistas para cair nisso. Não era para isso que havíamos traçado nosso programa”.
Do sufrágio universal ou da transição por vias democráticas ao socialismo
Marx e Engels sempre defenderam que a melhor – e mais curta – via para a conquista e construção do socialismo era a democrática. Eles não negavam a possibilidade de que a transição ao socialismo em alguns (poucos) países pudesse prescindir de violência revolucionária.
Num discurso pronunciado em setembro de 1872, o próprio Marx afirmou: “O operário deve um dia conquistar a supremacia política para estabelecer a nova organização do trabalho; ele deve abater a velha política que sustenta as velhas instituições (...). Mas nunca pretendemos que os meios para chegar a esse objetivo sejam idênticos. Sabemos o papel que se deve reconhecer às instituições, aos costumes e às tradições das diferentes regiões; e não negamos que existam países, como a América, a Inglaterra (...) onde os trabalhadores podem alcançar seu objetivo por meios pacíficos. 
Se isto é verdade, devemos reconhecer também que, na maioria dos países do continente, é a força que deve ser a alavanca de nossas revoluções: é à força que será preciso recorrer, durante algum tempo, para estabelecer o reino do trabalho”. Assim, para Marx e Engels, não haveria uma forma única de se transitar para o socialismo.
Como vimos, eles acreditavam, ainda na segunda metade do século XIX, que seria possível a transição socialista na Inglaterra – e mesmo nos Estados Unidos – sem a necessária quebra da máquina do Estado burguês. Muitos anos mais tarde, outro grande revolucionário, Vladimir Ilitch Lênin, iria dizer que essa tese havia perdido a atualidade no limiar do século XX. Escreveria no seu O Estado e a Revolução de 1917: “Isso se compreendia em 1871, quando a Inglaterra era ainda um modelo de país puramente capitalista, mas sem militarismo e, até certo ponto, sem burocracia (...). 
Em 1917, na época da primeira guerra imperialista, esta restrição de Marx caiu por terra: a Inglaterra e os Estados Unidos, os maiores representantes do mundo da ‘liberdade’ anglo-saxônica, sem militarismo e sem burocracia, se atolaram completamente no pântano infecto e sangrento das instituições burocráticas e militares europeias”. Por isso, segundo Lênin, a revolução violenta e a necessidade de destruição do aparelho estatal militar-burocrático haviam entrado na ordem do dia também nesses países.
A democracia política – ainda que num sentido bastante limitado da palavra – pressupõe a existência do direito de todos os cidadãos e cidadãs (acima de determinada idade) poderem eleger e serem eleitos. Ela exige, por conseguinte, o fim dos critérios eleitorais censitários, classistas, machistas e racistas – que predominaram na maioria dos regimes liberais ocidentais até o início do século XX.
 Lembremos que o voto censitário predominou amplamente no século XIX, as mulheres só adquiriram o direito ao voto nas primeiras décadas do século XX e os negros norte-americanos até recentemente (anos 1960) estavam excluídos do direito ao voto em várias regiões dos Estados Unidos.
A democracia exigiria também o controle dos eleitores sobre os eleitos e, destes últimos, sobre as rédeas efetivas do Estado, pois existe sempre a possibilidade de que o parlamento, mesmo nos regimes parlamentaristas, seja apenas peça decorativa, e de que as principais decisões sobre a política do Estado sejam tomadas pela alta burocracia que exerce, na prática, o poder Executivo a serviço da grande burguesia. De fato, é isso que geralmente acontece nas chamadas democracias ocidentais dominadas pelo capital financeiro.
O sufrágio universal foi um dos primeiros passos para a implantação da democracia política moderna e, por isso mesmo, se tornou uma das principais bandeiras do movimento operário e passou a integrar todos os programas da social-democracia europeia. No entanto, existiam correntes que não pensavam da mesma maneira. Os anarquistas e esquerdistas tendiam a menosprezar sua importância e, por isso, não o incluíam como uma exigência em suas plataformas de luta.
Qual posição assumida por Marx e Engels diante dessa questão crucial? Para eles, o sufrágio universal seria um mero instrumento de ludíbrio, conforme afirmavam os anarquistas e esquerdistas, ou um meio de emancipação dos trabalhadores, como pensariam os socialistas reformistas? A resposta não é fácil de ser dada. Para Marx e Engels, contraditoriamente ou dialeticamente, o sufrágio universal poderia representar as duas coisas e ao mesmo tempo.
Já observamos que, no caso inglês, os dois revolucionários alemães depositavam muitas esperanças no sufrágio universal. Na contraface da esperança operária estava a resistência feroz imposta pelos latifundiários e pela burguesia em relação à sua aplicação. A lógica dominante era: se os trabalhadores constituem a maioria da população, o direito ao voto necessariamente lhe dará também a maioria no parlamento.
 A maioria parlamentar proletária seria o toque de finado para a propriedade privada dos meios de produção. Assim pensavam todos os operários e burgueses conscientes dos seus interesses de classe. Por esse motivo não poderia haver acordo quanto à implantação de um mecanismo, aparentemente, tão perigoso.
Marx, novamente, escreveu no New York Daily Tribune (1850) sobre a luta dos cartistas ingleses pelo sufrágio universal: “Os seis pontos da Carta pela qual combatem não afirmam nada mais do que a reivindicação do sufrágio universal e as condições sem as quais o sufrágio universal seria ilusório para a classe operária, por exemplo: escrutínio secreto, uma retribuição para os membros do parlamento, eleições gerais anuais. 
Mas o sufrágio universal é sinônimo de poder político para a classe operária na Inglaterra, onde os proletários formam a grande maioria da população, onde, numa longa guerra civil conduzida subterraneamente, eles adquiriram a clara consciência de sua situação enquanto classe (...). A conquista do sufrágio universal na Inglaterra seria, por conseguinte, uma reforma que mereceria ser qualificada de socialista, mais do que qualquer outra medida agraciada com esse nome no continente. Na Inglaterra, seu resultado inevitável é a supremacia política da classe operária”.
Na França o sufrágio universal não teria a mesma importância que na Inglaterra. No mesmo ano (1850), fazendo um balanço do movimento revolucionário ocorrido entre 1848 e 1850, Marx afirmou: “O sufrágio universal não possuía a virtude mágica que lhe haviam atribuído os republicanos da velha escola. Em toda a França, ou pelo menos na maioria dos franceses, eles enxergavam cidadãos, que tinham os mesmos interesses, o mesmo discernimento etc. Praticavam o culto do povo. 
Mas, no lugar de seu povo imaginário, as eleições trouxeram à luz o povo real, isto é, representantes das diferentes classes (...). Mas, se o sufrágio universal não era a milagrosa varinha mágica imaginada por bravos republicanos, ele tem o mérito, infinitamente maior, de desencadear a luta de classes, de fazer com que as diferentes camadas médias da sociedade burguesa (...) percam rapidamente suas ilusões e decepções, e de elevar de um só golpe todas as frações da classe exploradora ao topo do Estado, arrancando suas máscaras enganadoras”.
O sufrágio universal teria um papel diferente em países que tinham maioria operária, como a Inglaterra, e naqueles que a maioria da população era camponesa (pequeno-burguesa), como a França e a Alemanha. Embora o sufrágio universal fosse importante nos dois casos, apenas no primeiro ele teria um caráter emancipador imediato. No segundo caso o processo era mais complexo e conheceria várias etapas.
Esse esquema sofreria algumas, mas significativas, alterações nos últimos textos de Marx. Em 1880 ele ditou as suas Considerações ao Programa do Partido Operário Francês, dirigidos à Guesde e Lafargue, nas quais afirmou: “a apropriação coletiva só pode decorrer da ação revolucionária da classe produtora – ou proletariado – organizada em partido político distinto; que semelhante organização deve ser buscada por todos os meios de que disponha o proletariado, inclusive o sufrágio universal, transformando-o assim de instrumento de ludíbrio que foi até agora em instrumento de emancipação”.
Sem dúvida, essa ideia vinda do próprio Marx de que o sufrágio universal poderia ser convertido num “instrumento de emancipação” dos trabalhadores na França – e não mais apenas na Inglaterra e nos Estados Unidos – soa um pouco estranha aos nossos ouvidos. 
A esquerda revolucionária sempre encarou as eleições como mero “instrumento de ludíbrio” ou, no máximo, um expediente tático para avaliar e acumular forças. A bem da verdade, Marx não fala aqui numa revolução feita pelo sufrágio universal, mas do papel do sufrágio universal no processo de unificação e organização da classe operária criando as melhores condições para que ela realize a ruptura revolucionária com o capitalismo e conquiste o socialismo.
Na Crítica ao projeto de Programa de Erfurt (1891), seria Engels que insistiria nas possibilidades da chamada via pacífica em alguns países. A novidade era que entre estes incluiu, explicitamente e pela primeira vez, a França. “Pode-se”, afirmou ele, “conceder-se que a velha sociedade possa evoluir pacificamente para a nova nos países em que a representação popular concentra em si a maioria da nação; em repúblicas democráticas como a França e a América, em monarquia como a Inglaterra (...)”, e continuou: “Uma coisa absolutamente certa”, disse ele, “é que nosso Partido e a classe operária só podem atingir a dominação sob a forma da república democrática. Esta última é mesmo a forma específica da ditadura do proletariado”.
Contrariando as afirmações de Lênin, no início dos anos 1890, o número de países que poderiam transitar ao socialismo pela “via pacífica” havia aumentado. Nele, entraria a França, país símbolo do domínio da burocracia e do militarismo, conforme o próprio Marx afirmou em As Lutas de Classes na França e no Dezoito de Brumário de Louis Bonaparte. A possibilidade de uma “evolução pacífica” não deve ser confundida com a necessidade (fatalidade) dela. Nem tudo o que é possível é o que necessariamente ocorre.
Para Marx e Engels a existência de um regime democrático não eliminava a possibilidade e a necessidade do uso da violência revolucionária pelo proletariado. Neste caso, a violência seria meramente defensiva. Uma resposta às tentativas golpistas da burguesia contra a vontade popular expressadas por institutos democráticos. A revolução, assim, seria um meio de defender e ampliar – através de elementos da democracia direta – a democracia política e não eliminá-la.
Repito: isso não deve nos conduzir à falsa conclusão de que Marx e Engels tivessem qualquer fetiche em relação à democracia política em geral e ao sufrágio universal, em particular. Eles, por exemplo, foram bastante críticos em relação aos revolucionários alemães (1848-1849) e aos comunardos parisienses (1871), que perderam um tempo precioso tentando organizar eleições em vez de marchar sobre seus adversários reacionários e implantar uma ditadura, ainda que provisória, sobre eles.
Por outro lado, a Comuna de Paris (1871) apontou elementos para a construção de uma democracia socialista, mais avançada que a burguesa. Os seus ensinamentos extraídos por Marx foram expressos nos textos organizados e publicados sob o título Guerra Civil na França. Quais medidas tomadas pelos comunardos parisienses  apontavam no sentido da construção de um novo poder de Estado, operário e radicalmente democrático? 
Eram elas: supressão do exército permanente, substituído pelo povo em armas; os conselheiros (representantes do povo), eleitos por sufrágio universal, passavam a ter mandatos imperativos, que podiam ser revogados a qualquer momento por aqueles que os elegeram; o conselho passou a ter funções legislativa e executiva, ou seja, era responsável pela aplicação das leis que ele mesmo aprovara; o salário dos dirigentes do Estado foi igualado ao salário médio do operário qualificado; os juízes passaram a ser eleitos e, como os conselheiros da Comuna, poderiam ser revogados de suas funções. 
Esses mecanismos democráticos, entre outras coisas, visavam a reduzir o fosso existente entre governantes e governados, uma condição essencial para a construção de qualquer poder verdadeiramente popular e socialista.
Marx e Engels nunca deixaram de considerar as liberdades políticas – conquistadas pelo povo – como burguesas, pois elas além de limitadas estavam aprisionadas nos estreitos limites da estrutura socioeconômica do capitalismo. Sabiam que a igualdade formal (jurídico-política) neste sistema se assenta numa desigualdade real (econômico-social). Isso faz com que as liberdades políticas sejam sempre distorcidas a favor dos donos do capital.
Mesmo essas liberdades burguesas, limitadas, às vezes assustam a burguesia e precisam ser defendidas pelos trabalhadores. Engels, referindo-se a elas, escreveu: “Ainda que essas instituições sejam puramente burguesas, já se observou que uma burguesia amedrontada pode perfeitamente passar sem elas, enquanto os operários, sem elas, jamais poderão conquistar sua emancipação.
”Continuou: “Mesmo no caso extremo em que, por temor aos operários, a burguesia se refugiasse no colo da reação, apelando à força de seus inimigos para proteger-se dos operários, não restaria ao partido operário outra alternativa a não ser prosseguir, a despeito dos burgueses, a agitação traída por eles em defesa das liberdades burguesas, da liberdade de imprensa, do direito de associação e de reunião. Sem essas liberdades, ele não pode ter as mãos livres; ao reivindicá-las, ele luta por seu elemento vital, pelo ar que necessita para respirar.”
Em 1850 Marx havia dito: “Ora, a contradição fundamental desta Constituição (burguesa) consiste no seguinte: as classes de que ele deve perpetuar a escravidão social – o proletariado, o campesinato, a pequena burguesia – são postas por ela na posse do poder político por meio do sufrágio universal. E a classe cujo antigo poder social ela confirma – a burguesia – é privada das garantias desse poder. 
A Constituição enquadra a dominação política dessa classe em condições democráticas que ajudam, a cada instante, as classes inimigas a lhe arrebatarem a vitória e a questionar os próprios fundamentos da sociedade burguesa”. Nos casos acima os institutos democráticos “puramente burgueses” parecem – e são – mais úteis ao proletariado que à própria burguesia.
O longo período de dominação burguesa e de subordinação política e ideológica dos trabalhadores nas democracias capitalistas ocidentais após a Segunda Guerra Mundial, em certo sentido, turvou esta perspectiva marxiana. 
Nestes casos, os “institutos da democracia” parecem ter se mostrado mais úteis à submissão do que à emancipação do trabalho. Contudo, acredito que mais do que negar Marx e Engels, eles confirmam a dupla dimensão que pode ter a democracia numa sociedade marcada pela luta de classes.
* Augusto Buonicore é historiador, secretário-geral da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e a revolução burguesa e Meu Verbo é Lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas, ambos publicados pela Editora Anita Garibaldi.
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