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sexta-feira, 17 de abril de 2015

5 sinais de que os EUA não estão conseguindo superar a crise estrutural capitalista

11/04/2015 - Copyleft

Carta Maior

As especulações com o petróleo, as pressões econômicas sobre a Rússia e a influência geopolítica sobre o Oriente Médio: nada disso tem surtido mais efeito







Antônio Gelis Filho
The White House / Flickr




















As últimas semanas trouxeram notícias surpreendentes, mesmo para aqueles acostumados a analisar os eventos geopolíticos. 

É muito difícil fugir da conclusão de que atingimos uma etapa crítica na transição entre o sistema-mundo capitalista que conhecemos e algo que ainda está por vir.

 Parece ter expirado o prazo de validade do modelo adotado pelos países ricos para lidar com a crise estrutural que se tornou mais visível a partir de 2008, modelo esse que inclui a criação de dinheiro sem qualquer lastro em riquezas reais, a negação maciça da existência de qualquer problema maior pela mainstream media e a repressão policial crescente como única “política social” para lidar com a crescente pobreza nessas sociedades outrora tão afluentes. 

Vários são os sinais de que atingimos o “fim do começo” da transição.  



1. Desespero norte-americano em Lausanne?


Um “acordo para firmar um acordo” foi assinado em Lausanne, Suíça, entre o governo do Irã e o grupo de potências conhecido por P5 1: China, EUA, França, Rússia, Reino Unido e Alemanha. 

Na realidade, as dificuldades nas discussões sempre foram entre EUA e Irã. Este último deseja prosseguir com seu programa nuclear que alega ter finalidades pacíficas. Os EUA há tempos consideram o Irã um dos integrantes do dito “eixo do mal” e exige o fim das atividades nucleares que considera suspeitas.

 A surpresa vem da análise minuciosa do texto assinado: compreende-se porque o governo de Teerã o celebra como uma vitória. 

Após anos exigindo e comandando sanções contra o Irã, negando-lhe o benefício de qualquer dúvida, Washington assinou um texto que essencialmente baseia-se em apenas postergar o momento no qual Teerã poderá desenvolver sua bomba se assim o desejar. 

Não surpreendentemente, o governo de Israel, os republicanos norte-americanos e mesmo alguns democratas já anunciaram sua oposição ao texto e sua recusa em aceitar a assinatura do texto definitivo em três meses. Por que Washington cedeu tanto em Lausanne? 

Os críticos de Obama argumentam que o presidente teria colocado seu desejo de alcançar um importante resultado diplomático, um “legado” qualquer, acima dos interesses nacionais. Pouco provável. 

Mais razoável é supor que o governo norte-americano já não tem condições de impor seus interesses no Oriente Médio e busca desesperadamente a aparência de uma vitória diplomática. 

Chega a ser impressionante que o governo norte-americano tenha assinado um documento, ainda que não definitivo, no qual aparentemente o Irã não terá a obrigação de franquear suas instalações militares aos inspetores internacionais e que cala sobre o reconhecimento de Israel. 

Tudo isso enquanto EUA apoiam o ataque saudita a grupos iemenitas que por sua vez são apoiados por Teerã. 

É difícil não perceber nesse acordo uma espécie de fadiga dos Estados Unidos em relação à disputa geopolítica no Oriente Médio.



2. A queda da demanda mundial e o estouro da “bolha do xisto”


Vendido como uma solução “mágica” para o problema de oferta mundial de petróleo, ainda que altamente poluente, o petróleo extraído de depósitos de xisto (“tight oil”) revela-se como mais uma bolha insuflada pela indústria financeira. 

As denúncias já vinham sendo feitas há tempos, mesmo em publicações de negócios como Forbes (vide o texto “Why shale oil boosters are charlatans in disguise”, publicado em janeiro de 2014). 

Com a queda mundial da demanda econômica, que pode ser vista, por exemplo, em um preço muito baixo para o frete marítimo, o preço do petróleo também caiu.

 Arábia Saudita e Rússia podem ainda lucrar com seu petróleo convencional cujos custos de produção são baixos, mas os altos custos da produção de xisto já cobram seu preço: o número de sondas de perfuração em operação é o mais baixo desde 2011. 

A inviabilidade do petróleo do xisto como alternativa ao petróleo convencional ficou clara nesse evento. E muito da esperança norte-americana de uma recuperação real de sua economia e de seu poder geopolítico baseava-se nisso.



3. Mais uma “recuperação espetacular” da economia norte-americana vira pó em semanas


Em dezembro de 2014 jornais do mundo inteiro publicaram a notícia de que a economia norte-americana vinha crescendo a taxas anualizadas de 4% (alguns diziam 5%). 

Comentaristas eufóricos explicavam que finalmente a economia dos EUA tinha saído da crise, que seu crescimento seria saudável e sustentado. Previa-se um 2015 róseo para a economia norte-americana. 

Para quem segue os eventos internacionais, entretanto, parecia apenas a manifestação de um ritual semestral que se repete desde a crise de 2008: alguns indicadores econômicos positivos isolados são analisados fora de seu contexto maior, análises estridentemente eufóricas são publicadas na mídia e meses depois, quando a “recuperação” mostra-se inexistente, todos se esquecem do assunto. 

Esta vez, porém, parece ter sido a gota d’água: escrevendo no excitável Financial Times, o comentarista Gavyn Davies recentemente (29/03/2015) afirmou que as expectativas otimistas do Banco Central dos EUA (Federal Reserve) para 2015  já estavam sendo desmentidas pelos dados reais.  

Quem ainda acreditará quando The Economist e Wall Street Journal anunciarem novamente o fim da “recessão”? A verdade, dura e incontornável, é que não há recuperação econômica real à vista, seja nos EUA, na Europa ou no Japão.  



4. A criação do AIIB e o vexame público de Washington


O AIIB - abreviatura em inglês de Banco da Ásia para Investimento em Infraestrutura - era uma proposta do governo da China lançada no final de 2013 para contornar as limitações encontradas pelo país asiático em instituições lideradas pelo ocidente, tais como Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Banco para o Desenvolvimento da Ásia. Com sede em Beijing, a proposta sempre foi resistida pelos Estados Unidos. 

Finalmente lançado em outubro de 2014, o banco atraiu países asiáticos com grandes economias, tais como Índia e Indonésia.

 Mas a grande surpresa viria em março de 2015: a despeito das ressalvas públicas feitas por Washington à instituição, países tradicionalmente aliados aos EUA, como Reino Unido, Austrália, Coreia do Sul, Alemanha, França e até Taiwan submeteram ou decidiram submeter suas candidaturas a membros do banco.

 Até mesmo o ex-Secretário do Tesouro dos EUA, Larry Summers, publicou um texto em seu blog afirmando que “o mês passado [março de 2015] pode ser lembrado como o momento no qual os Estados Unidos perderam sua posição de garantidores do sistema econômico mundial”, em grande parte baseando sua análise nos eventos que cercaram a criação do banco.



5. E a economia da Rússia não entrou em colapso


Esquecida pela mídia ocidental, a guerra econômica contra a Rússia parece ter fracassado. 

O rublo continua existindo e o governo de Moscou não mostra qualquer sinal do enfraquecimento tão sonhado pelo ocidente. 

A situação na Ucrânia, cuja integração à União Europeia parece ter desaparecido da pauta de discussões em Bruxelas, evolui para uma verdadeira guerra interna pelo poder, onde “oligarca devora oligarca”. O leste do país tornou-se de fato independente. 

A histeria ocidental anti-Rússia parece ter consumido seu combustível, ao menos por enquanto.  Com isso, mais uma trapalhada geopolítica ocidental perde fôlego, embora a proximidade de eleições em países europeus importantes sugira que políticos desesperados possam pensar em ações desesperadas.
O fim do começo é também o fim do período pós-crise de 2008 durante o qual os governos ocidentais acreditavam em sua capacidade de recuperação.

 A próxima etapa será, salvo surpresas, a de uma difícil negociação com suas populações, que finalmente começam a entender que o passado não retornará, que os níveis de vida pré-2008 foram embora para sempre e que o futuro não será mais o que costumava ser. 

Desnecessário dizer, esses serão momentos de extraordinário risco, de grandes oportunidades e de permanente surpresa para todos que vivem nestes tempos tão intensos.   


quinta-feira, 16 de abril de 2015

MANIFESTO DA ASSOCIAÇÃO DOS ANISTIADOS POLÍTICOS SOBRE A SITUAÇÃO POLÍTICA ATUAL

                                            



Neste momento, o Brasil passa por uma crise política e econômica. Presenciam-se sérias denúncias de corrupção na Petrobras; pós-eleição, governo se viu obrigado a implementar o ajuste fiscal que, com maior ou menor grau, penaliza a população


Em decorrência de erros acumulados nos últimos anos a inflação começa a subir com a economia dando sinais de recessão, o que demonstra a dimensão do problema. 


Tudo isso tem levado parte considerável dos brasileiros a manifestar-se contra o governo da presidente Dilma Rousseff. 


Frente a esse quadro de crises e insatisfações,  a Associação dos Anistiados Políticos se posiciona e externa a sua preocupação, quando setores minoritários da sociedade brasileira -- de extrema direita –, aproveitando os movimentos populares, legítimos e democráticos, exortam as Forças Armadas a intervirem e darem um fim no que eles consideram como sendo a “construção, no Brasil, de um regime comunista”. 


É bom lembrar que essas forças agiram assim na década de 1960, o que culminou no golpe militar de 31 de março de 64, que completou 51 anos.


As dificuldades que o País vive hoje não justificam que atitudes aventureiras aconteçam e ameacem as nossas instituições democráticas.


 É bom lembrarmos que a ditadura instalada em 1964 promoveu intervenção criminosa em nosso Estado e depôs o governo Mauro Borges, violou os direitos humanos de forma indescritível, com prisões, sequestros, torturas, assassinatos e desaparecimentos de opositores do regime, como são os casos, em Goiás, dos estudantes Marcos Antônio Dias Batista, Ismael Silva de Jesus e do deputado Estadual José Porfírio de Souza.

                 

Em nossa recente história, conquistas democráticas foram conseguidas com muita luta. 


A anistia política de 1979 só foi possível com a criação em todo o País, a partir de 1975, dos Comitês pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita; as Diretas-Já, em 1984, e as mobilizações populares para eleger Tancredo Neves como Presidente do Brasil foram importantes para o fim do regime militar e a consolidação de nossas instituições democráticas, que mobilizaram milhões de brasileiros.

                    

Numa sociedade democrática, há de se levar em consideração que as crises se resolvem dentro da lei e no respeito às instituições. 


A Associação dos Anistiados Políticos de Goiás representa essa consciência e tem, por obrigação, externar a sua posição: não concordamos e não aceitamos nenhum tipo de ditadura, seja de direita ou esquerda, civil ou militar.  


As Forças Armadas, responsáveis pela garantia dos poderes constitucionais, não têm se manifestado ante ao chamamento irresponsável de grupos minoritários dentro das manifestações. Tudo indica que o sentimento legalista prevalece entre os militares, o que torna inócuo tais chamamentos.

                  

Também há de se considerar que o povo tem plena liberdade de se manifestar pacificamente, mas sem retrocesso no que conquistamos e construímos com muito sacrifício: a democracia, que pressupõe a preservação e o aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito.

                 

As manifestações populares, por sua natureza, devem significar avanço no processo civilizatório para que todos sejam beneficiados com uma educação melhor, com saúde de ótima qualidade e para todos, com a diminuição das desigualdades sociais, com o respeito aos que pensam de forma diferente e, acima de tudo, que se possa construir, a cada dia, uma sociedade generosa, fraterna, de plena liberdade, que cuide das pessoas respeitando os direitos humanos. Democracia sempre.


Goiânia, abril de 2015. 

                 

Associação dos Anistiados Políticos de Goiás-ANIGO



A operação Datafolha


Observatório da Imprensa

Programa nº 2584

A operação Datafolha

Por Luciano Matins Costa em 14/04/2015 | comentários
Comentário para o programa radiofônico do Observatório14/4/2015

O noticiário de terça-feira (14/4) ainda faz o rescaldo das manifestações realizadas no domingo anterior, e os principais diários de circulação nacional tentam compor um quadro no qual a cena central é o movimento da própria imprensa em favor do impeachment da presidente da República.

O conteúdo das reportagens sobre a crise política, editoriais, artigos e até algumas notas daquelas colunas de inconfidências e fofocas convergem para uma ideia estapafúrdia: justificar um pedido de interrupção do mandato da presidente com base numa pesquisa Datafolha. A lógica dessa manobra depõe não apenas contra a honestidade intelectual dos autores da ideia e dos editores que a abrigam, mas chega a lançar uma sombra de dúvida sobre a sanidade das mentes que conduzem as decisões editoriais da mídia tradicional.

Trata-se do seguinte: se o Datafolha registra que 63% dos consultados são a favor de um processo de impeachment, então há uma maioria de brasileiros que querem reverter o resultado das eleições. Observe-se que não se está falando apenas da lógica falaciosa que se tornou parte central do discurso jornalístico no Brasil. Diferente do paralogismo – que, segundo filósofos e estudiosos da linguística, não é produzido de má-fé, com intenção de enganar, mas nasce da ignorância de quem o produz –, o que estamos observando é a utilização de sofismas maliciosos como suporte para uma proposta moralmente indefensável.

O editorial do Estado de S. Paulo merece ser guardado para uma leitura mais criteriosa, longe do calor da atual crise política (ver “O não a Dilma persiste”). O núcleo de seu raciocínio está na seguinte frase: “O apoio popular ao impeachment de Dilma Rousseff existe, por ampla maioria, como comprovam as pesquisas de opinião pública”. Restaria, apenas, segundo o raciocínio do jornal, “caracterizar a base legal para levar a presidente da República a julgamento”.

Não seja por isso: em perfeita sintonia com a imprensa, o PSDB escala, para “caracterizar a base legal”, o jurista Miguel Reale Jr., que herdou do pai o nome honrado mas ainda luta para compor sua própria biografia. Uma vez que a primeira tentativa, pelas mãos do tributarista Ives Gandra Martins, não produziu efeito, convoca-se o Júnior para a tarefa controversa.

Risco de descontrole

A estratégia de revestir a proposta de impeachment com uma embalagem de legitimidade inclui uma seleção das bases que o jornal paulista chama de “apoio popular” – por isso, a imprensa isolou as facções que defendem o golpe militar puro e simples, e outros propagandistas de ações violentas, que alguns líderes das manifestações chamam de “neuróticos alucinados”. A imprensa reconhece agora como válidos apenas os grupos intitulados “Movimento Brasil Livre” e “Vem pra Rua”.

A mídia tradicional quer substituir o processo eleitoral pelos editoriais, criando a nova receita pela qual o Datafolha vai às ruas, no momento em que se articulam as manifestações, e “constata” a aceitação, por uma maioria contingencial, de um processo de impeachment. Daí, essa aceitação da hipótese de um processo é transformada em verdade absoluta, por meio de artigos, editoriais e reportagens baseadas em declarações.

Em texto analítico (ver aqui), o Estado de S. Paulo apresenta uma visão oposta à que tem sido aqui oferecida, segundo a qual a imprensa brasileira se comporta como o Tea Party, organização de extrema-direita que mobiliza os setores mais conservadores do Partido Republicano nos Estados Unidos. O jornal tenta desvincular movimentos golpistas surgidos na internet, e abrigados pela mídia, da ação de orientação partidária que caracteriza o Tea Party, mas a manobra para legitimar a proposta de impeachment demonstra que a imprensa cria uma agenda favorável a essa oposição que não se conforma com o resultado das urnas.

Os artífices do impeachment teriam que negociar, paralelamente, uma blindagem para Renan Calheiros e Eduardo Cunha, na sequência do caso Lava Jato, e apoiar a agenda conservadora que vai tramitando no Congresso à sombra da crise: propostas como liberação do porte de armas, redução da maioridade penal e extinção de direitos civis e trabalhistas.

Parte do PSDB, que, segundo alguns colunistas, rejeita uma guinada à direita, recomenda cautela, mas alguns de seus aliados, em especial os antigos comunistas do PPS, forçam a agenda do golpe dissimulado.

Resta saber até onde iria a imprensa. Um processo como esse carrega um alto risco de descontrole, porque não se sabe com se comportariam os que votaram em Dilma Rousseff. Eles não leem o editorial do Estado. Eles não usam black-tie.

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