VIOMUNDO
A disparada do Itaú na Bolsa de Valores e o papel dos bancos públicos
publicado em 26 de setembro de 2014 às 12:39
Sorrindo à toa
por Luiz Carlos Azenha
No Facebook, escrevi que sinto falta de “um jornalista como o Aloysio Biondi, para ir fundo e nos mostrar quem está ganhando dinheiro no mercado financeiro especulando com resultados das pesquisas eleitorais. As páginas econômicas dos jornais brasileiros separaram política de economia. São vitrines do deus mercado. Um deserto. Entre nelas e você corre o risco de morrer de sede”.
Biondi, no livro O Brasil Privatizado, fez um raio xis do entreguismo de Fernando Henrique Cardoso, e concluiu que a venda de todas as estatais no período FHC deu ao Brasil um prejuízo de R$ 2,4 bilhões.
Em seguida, recebi mensagem de um amigo, que escreveu: “Quando a Marina começou a subir [nas pesquisas], as ações da holding Itausa (itsa4) chegaram a se valorizar 30%. É a empresa em que a Neca [Setubal, que ajudou a formular o programa de Marina Silva] é sócia. Para você ter uma idéia [o valor da ação] chegou a bater em R$ 12,00. Hoje fechou a R$ 9,83″.
Numa recente entrevista com o economista André Biancarelli, da Unicamp, ele se mostrou surpreso com a ousadia das propostas econômicas adotadas por Marina e encampadas pelo Partido Socialista Brasileiro: “A agenda financeira para essa questão de banco público, [fim do] crédito direcionado, é a agenda do setor financeiro brasileiro, que é muito forte, muito lucrativo, muito influente. É muito complicado um partido assumir de forma tão linear a agenda de um setor da economia. A indústria corre riscos!”
André está se referindo ao fato de que Marina propõe reduzir o papel dos bancos públicos (BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal), o que vai ao encontro dos interesses do Banco Itáu. Consideremos que Neca Setubal, como diz Marina, de fato é apenas uma educadora e — ainda que acionista da holding Itausa — não tenha palpitado sobre o programa econômico da candidata.
Atentem, no entanto, para o que disse o presidente do Itaú, Roberto Setúbal, em entrevista a O Globo em dezembro de 2013, sobre o papel dos bancos públicos:
Sobre o BNDES e os projetos de infraestrutura com financiamento público:
O programa de Marina, portanto, adota as linhas mestras do pensamento de Roberto Setubal, o principal executivo do Itaú.
Vendo aí uma oportunidade política, a campanha de Dilma Rousseff reagiu oficialmente e disparou a seguinte mensagem, por e-mail:
Bancos públicos permitem crescimento econômico com inclusão social
“Diminuir o papel dos bancos públicos vai acabar com o financiamento do investimento, da agricultura, de todas as obras de infraestrutura. Quando cheguei ao governo, o financiamento de longo prazo no Brasil era de 5 a 7 anos. A taxa de juros era de duas casas. Não existe obra de infraestrutura se não tem financiamento de 30 anos, que não tenha taxa de juros compatível com longo prazo”.
Quando fez a afirmação, durante entrevista em um telejornal, a presidenta Dilma Rousseff, candidata à reeleição, chamou atenção para a possível paralisia nos investimentos em políticas sociais e em infraestrutura, caso vigorem as propostas de candidatos opositores, de dar independência ao Banco Central e de deixar nas mãos dos bancos privados decisões sobre crédito e juros, por exemplo.
Os bancos públicos brasileiros, especialmente Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), funcionam como financiadores das obras de infraestrutura do país, promovendo o desenvolvimento da matriz energética (hidrelétricas, linhas de transmissão, projetos de geração de energia eólica), da matriz logística (rodovias, ferrovias, portos e aeroportos) e da Mobilidade Urbana (trens, metrôs, VLT, BRT).
Sem a alavanca dos bancos públicos, estes investimentos não sairiam do papel e o Brasil estaria estagnado nestes setores.
Segundo a presidenta Dilma, a ampliação da presença dos bancos públicos na economia ao longo dos governos Lula e Dilma foi decisiva para o estabelecimento de parcerias com o setor privado para as obras de infraestrutura que já estão concluídas e as que estão em curso em todo País.
“Estou falando de obra de energia elétrica, de metrô, rodovia, ferrovia, portos e aeroportos. Sem
essas condições de financiamento, não terá investimento nesse País”, disse.
Além da infraestrutura, diminuir a atuação dos bancos públicos significa diminuir também as condições essenciais para a existência de programas sociais, como o Minha Casa Minha Vida.
Dilma explica que, para uma família que ganha R$ 1,6 mil, nas condições do mercado praticadas pelos bancos privados, a prestação de um apartamento no valor de R$ 60 mil sairia a R$ 940. “Hoje, com o financiamento da Caixa, a prestação do Minha Casa Minha Vida é de 5% da renda do beneficiário”, exaltou.
Riscos
O ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, afirma que é um grande risco terceirizar instrumentos fundamentais que os governos democráticos dispõem para a implementação da política fiscal e orçamentária e o enfrentamento de crises.
Segundo ele, essas medidas “levam para o caminho da recessão, com o choque de preços de energia, o encarecimento do crédito, o aperto monetário e fiscal, a terceirização da política fiscal e, consequentemente, o rompimento completo com os compromissos sociais e com a própria estrutura produtiva do país”.
A presença e atuação dos bancos públicos têm sido fundamentais no financiamento de projetos estratégicos para o desenvolvimento econômico do Brasil, como grandes obras de infraestrutura e de modernização da indústria.
“É evidente que é importante desenvolver o crédito privado e novos instrumentos de crédito de longo prazo, mas é um equívoco privatizar o mercado de crédito e abrir mão de instrumentos públicos, para o investimento de longo prazo”, disse Mercadante.
Para o ministro, a atuação dos bancos públicos foi muito importante não apenas para a reação à crise de 2008, mas também para a manutenção de boa parte do dinamismo do mercado doméstico e para a recuperação do investimento, que permitiram combinar crescimento econômico com inclusão social.
“Diante da crise internacional, a política industrial e os bancos públicos têm sido utilizados pelos governos como instrumentos de política anticíclica e de renovação da estrutura produtiva”, disse.
Mercadante acredita que seria um retrocesso retomar uma velha proposta do sistema financeiro, que acabaria com o crédito direcionado e barato para atividades estratégicas em áreas como agricultura, habitação e investimento de longo prazo.
“Estariam comprometidos os R$ 180 bilhões de reais/safra para a agricultura comercial e familiar, previstos no plano Safra 2014-2015, os R$ 190 bilhões de reais/ano destinados pelo BNDES principalmente à indústria e infraestrutura, e os recursos destinados aos programas de financiamento à habitação popular, como o programa Minha Casa Minha Vida. Com isso, o crédito ficaria mais caro, tanto para quem produz, quanto para quem quer comprar sua casa própria, derrubando assim os Investimentos e empurrando nossa economia para um ajuste ortodoxo e recessivo”, disse.
Banco Central
O ministro Mercadante explica, ainda, que a proposta de independência legal do Banco Central, retira da população o direito de influir, ainda que indiretamente, em decisões que afetam o seu dia a dia, como, por exemplo, se o Banco Central deve considerar os impactos de suas decisões sobre o emprego e a renda.
“O que está se propondo é praticamente um quarto poder, o poder dos bancos, traduzido em um Banco Central com uma diretoria blindada diante de qualquer governo democraticamente eleito pelo povo. A autonomia operacional do Banco Central vem sendo praticada há décadas no Brasil, mas a independência completa representa um retrocesso na relação entre o governo democraticamente eleito e o capital financeiro”, explicou.
Mercadante cita economistas renomados como Joseph Stiglitz, Paul Krugman e Simon Johnson, que destacaram que os excessos dos bancos centrais independentes, sempre dispostos a atender os pleitos dos mercados financeiros em matéria de regulação bancária e política monetária, estão na raiz da crise de 2008.
“Também ressaltam que os países com bancos centrais menos independentes, como o Brasil, a Índia e a China, foram aqueles que melhor enfrentaram a recente crise internacional”, afirmou.
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