Análise comparativa entre o tratamento tributário conferido aos juros sobre capital próprio e aos dividendos no Brasil e nos Estados Unidos da América
Os juros sobre o capital próprio representam o valor pela compensação do capital investido em uma empresa. Após algumasdiscussões entre os economistas e contabilistas a respeito de considerar os referidos juros como custo de um produto[1], a Lei nº 9.249/95 passou a conferir tratamento tributário ao pagamento dos juros sobre capital próprio nos seguintes termos:
Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP.
Ressalte-se que não se tem noticia de instituto idêntico aos juros sobre capital próprio no direito comparado[2]. Na realidade, o que tradicionalmente seria considerado dividendos – inclusive nos outros ordenamentos jurídicos internacionais -, isto é, uma forma de remuneração do capital para os investidores, no Brasil foi subdivido em dividendos e juros sobre capital próprio. Esclareça-se que essa divisão não é meramente acadêmica ou didática, pois dela resultam efeitos tributários diferentes, conforme se verá adiante.
Da análise da exposição de motivos do Projeto de Lei nº 913/1995[3], que deu origem ao artigo 9º da Lei 9.249/1995, acima transcrito, percebe-se que a intenção de permitir a dedução do imposto de renda por parte da pessoa jurídica que realiza o pagamento dos juros sobre capital próprio foi baseada no princípio da isonomia. Vale dizer, antes da referida alteração legislativa, as pessoas jurídicas que possuíam capital financiado de terceiros, poderiam deduzir os juros desse tipo de empréstimo da base de cálculo do imposto de renda, enquanto que não havia previsão legal para a mesma dedução no caso de investimento com capital próprio[4]. Buscou-se, portanto, criar um ambiente propício para que aumentasse o autofinanciamento das empresas, o que gera um aumento de liquidez das referidas empresas, tendo em vista a formação de capitais próprios, em detrimento do uso dos empréstimos.
Percebe-se, pois, que a possibilidade de dedução do imposto de renda confere um benefício para a pessoa jurídica que efetua o pagamento dos juros sobre o capital próprio.Entretanto, para que a pessoa jurídica possa gozar do referido benefício, faz-se mister a observância de alguns requisitos legais, que se passará a expor.
A primeira exigência encontra-se no §1º do art. 9º da Lei 9.249/95, e se refere à necessidade deque o efetivo pagamento ou crédito dos juros fique condicionado à existência de lucros,computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros, emmontante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados. Por sua vez, os §§ 2º e 3º do mesmo artigo, preveemque os juros ficarão sujeitos à incidência do imposto de rendaretido na fonte à alíquota de quinze por cento, na data do pagamento ou crédito ao beneficiário, e será considerado: a) antecipaçãodo devido na declaração de rendimentos, no caso de beneficiário pessoa jurídica tributadacom base no lucro real; b) tributação definitiva, no caso debeneficiário pessoa física ou pessoa jurídica não tributada com base no lucro real, inclusive isenta.
No caso de pagamento de juros sobre capital próprio por parte dos fundos de investimento, os beneficiários estão isentos do recolhimento do imposto de renda (alínea b do §10. do art. 28 da Lei nº 9.523/97). De seu turno, em caso de creditamento de juros sobre capital próprio a residentes em paraísos fiscais, tais valores se sujeitam ao pagamento do imposto de renda na fonte à alíquota de 25%[5], conforme previsão do §1º do art. 13 da Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal nº 252/02.
Da análise dos referidos dispositivos, percebe-se que não houve uma isenção de pagamento em relação ao imposto de renda sobre os juros sobre capital próprio. Na realidade, a legislação estabeleceu como sujeito passivo do tributo o beneficiário dos valores, mas determinou que o recolhimento deva ser realizado de forma antecipada por parte da pessoa jurídica que realiza o pagamento. Dessa forma, mais uma vez se observa que o intuito foi estimular o desenvolvimento da atividade produtiva da empresa, a qual passa a ter a sua disposição mais uma alternativa juridicamente viável para diminuir a carga tributária, além de melhorar o seu capital de giro e, consequentemente, o seu fluxo de caixa[6].
Outra vantagem concedida à pessoa jurídica que realiza o pagamento dos juros sobre o capital próprio encontra-se normatizada no §7º do art.9º da Lei 9.249/95, o qual permite que o valor dos juros pagos ou creditados pela pessoaljurídica, a título de remuneração do capital próprio, poderá ser imputado ao valor dosdividendos obrigatórios, de que trata o art. 202[7] da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sem prejuízodo disposto no § 2º. Nesse sentido,o valor despendido pela empresa no pagamento dos juros sobre o capital próprionão representa uma saída adicional de recursos a ser paga ao titular, sócios ou acionistas, visto quepode ser deduzida em relação ao cálculo dos dividendos obrigatórios.
Os dividendos são uma parte dos lucros de uma empresa que é dividida entre os acionistas. Nesse sentido, pessoas, físicas ou jurídicas, que possuem ações, títulos ou fundos mútuos, podem receber dividendos de tais investimentos.Cabe esclarecer que tanto os dividendos quanto os juros sobre capital próprio são formas de remuneração do investidor, com uma grande diferença tributária, uma vez que o pagamento dos dividendos não confere à pessoa jurídica o direito à dedução do imposto de renda, uma vez que há isenção do imposto de renda para o beneficiário.
Destarte, no Brasil, quaisquer valores pagos a título de dividendos como forma de remunerar os acionistasnão são tributados, razão pela qual os investidores recebem integralmente os valores distribuídos. Nesse ponto, cabe esclarecer que a isenção em relação aos dividendos ocorre tanto no caso de o beneficiário ser pessoa física quanto pessoa jurídica.
Nesse ponto, pode-se identificar uma diferença entre o direito brasileiro e o norte-americano. Explique-se. Nos Estados Unidos da América[8] os dividendos estão sujeitos à tributação e há uma diferenciação de tratamento no caso de os dividendosserem consideradosordinários ou qualificados. Os primeiros são o tipo mais comum de distribuição de lucros por parte das empresas e são considerados como receita ordinária para quem os recebe, o que significa que eles não recebem tratamento tributário como ganho de capital e se sujeitam a mesma alíquota do imposto de renda normalmente suportada por quem o declara.Quanto ao aspecto procedimental, os dividendos ordinários devem ser preenchidos no campo 1a do Formulário 1099-DIV da declaração de imposto de renda.
De seu turno, os dividendos são qualificados nas hipóteses em que o investidor mantem em bolsa os valores por mais de 60 (sessenta) dias durante o período de 121 (cento e vinte e um) dias, o qual começa 60 (sessenta) dias antes da data ex-dividendo. Tais dividendos estão sujeitos a uma alíquota máxima de 15%, que é aplicada aos ganhos de capital líquidos. A aplicação dessa alíquota ocorre da seguinte maneira: Se o indivíduo tem uma taxa de imposto de renda regular de 25% ou superior, então a taxa de imposto qualificado de dividendos é de 15%. Se a taxa do imposto de renda da pessoa é inferior a 25%, então os dividendos qualificados são tributados à alíquota zero. Quanto ao recolhimento do tributo, os dividendos qualificados devem ser preenchidos no campo 1b do Formulário 1099-DIV da declaração de imposto de renda.
Esclarecido como ocorre a tributação dos dividendos no direito norte-americano, cabe registrar que essa forma de tributação é objeto de críticas, ao argumento de que se está penalizando o investimento através da dupla tributação dos dividendos. Afinal, quando a empresa paga os dividendos, tais valores não são deduzíveis do seu imposto de renda e o empresário recolhe o tributo sobre todo o lucro que auferiu – diferentemente do que acontece no Brasil em relação aos juros sobre capital próprio, que é considerado, como visto anteriormente, um custo dedutível da apuração do seu lucro real para fins de tributação do imposto de renda. Somado ao fato de não seremdedutíveisdo imposto de renda da entidade pagadora dos dividendos, as pessoas, sejam físicas ou jurídicas, que recebem os dividendos também sofrem a incidência do imposto de renda, visto que a legislação norte-americana considera os dividendos como renda tributável.
Referencias Bibliográficas
BIASIO, Roberto; MECCA, Marlei Salete. Juros sobre o capital próprio: uma ótima opção de planejamento tributário para o fortalecimento do capital de giro e do capital próprio das empresas. http://www.convibra.com.br/2009/artigos/126_0.pdf. Acesso em 17 de novembro de 2011.
HIGUCHI, Hiromi; HIGUCHI, Fábio e HIGUCHI, Celso. Imposto de Renda das Empresas: Interpretação e prática. São Paulo: IR Publicações, 2006.
Internal Revenue Service United States Department of the Treasury.Disponível emhttp://www.irs.gov/publications/p550/ch01.html#en_US_2010_publink100010066. Acesso em 21 de novembro de 2011.
MAIA, Mary Elbe Gomes Queiroz. Tributação das Pessoas Jurídicas. Brasília: Universidade de Brasília, 1997.
PRESSI, Guilherme. Modelo para avaliação do impacto dos juros sobre o capital próprio na estrutura de capital e no fluxo de caixa das empresas. Disponível em http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/4565/000412893.pdf?sequence=1. Acesso em 17/11/2011.
ROLIM, João Dácio. Remuneração do Capital Próprio das Pessoas Jurídicas – Aspectos Fiscais in ROCHA, Valdir de Oliveira (coord). Imposto de renda - alterações fundamentais. Dialética: São Paulo, 1996.
SÁ, A. Lopes de; SÁ, A. M. Lopes de. Dicionário de contabilidade. 9 Ed. São Paulo: Atlas, 1995.
[1] Sá, A. Lopes de; Sá, A. M. Lopes de. Dicionário de contabilidade. 9 Ed. São Paulo: Atlas, 1995, p. 199.
[2] ROLIM, João Dácio. Remuneração do Capital Próprio das Pessoas Jurídicas – Aspectos Fiscais in ROCHA, Valdir de Oliveira (coord). Imposto de renda - alterações fundamentais. Dialética: São Paulo, 1996, p.110.
[3]PRESSI, Guilherme. Modelo para avaliação do impacto dos juros sobre o capital próprio na estrutura de capital e no fluxo de caixa das empresas. Disponível em http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/4565/000412893.pdf?sequence=1. Acesso em 17/11/2011.
[4] MAIA, Mary Elbe Gomes Queiroz. Tributação das Pessoas Jurídicas.Brasília: Universidade de Brasília, 1997, p.192.
[5]HIGUCHI, Hiromi; HIGUCHI, Fábio e HIGUCHI, Celso. Imposto de Renda das Empresas: Interpretação e prática. São Paulo: IR Publicações, 2006, p. 95-96.
[6]BIASIO, Roberto; MECCA, Marlei Salete. Juros sobre o capital próprio: uma ótima opção de planejamento tributário para o fortalecimento do capital de giro e do capital próprio das empresas. http://www.convibra.com.br/2009/artigos/126_0.pdf. Acesso em 17 de novembro de 2011.
[7]Art. 202. Os acionistas têm direito de receber como dividendo obrigatório, em cada exercício, a parcela dos lucros estabelecida no estatuto ou, se este for omisso, a importância determinada de acordo com as seguintes normas:
I - metade do lucro líquido do exercício diminuído ou acrescido dos seguintes valores:
a) importância destinada à constituição da reserva legal (art. 193); e
b) importância destinada à formação da reserva para contingências (art. 195) e reversão da mesma reserva formada em exercícios anteriores;
II - o pagamento do dividendo determinado nos termos do inciso I poderá ser limitado ao montante do lucro líquido do exercício que tiver sido realizado, desde que a diferença seja registrada como reserva de lucros a realizar (art. 197);
III - os lucros registrados na reserva de lucros a realizar, quando realizados e se não tiverem sido absorvidos por prejuízos em exercícios subseqüentes, deverão ser acrescidos ao primeiro dividendo declarado após a realização.
[8]Internal Revenue Service United States Department of the Treasury.Disponível em http://www.irs.gov/publications/p550/ch01.html#en_US_2010_publink100010066. Acesso em 21 de novembro de 2011.
Nenhum comentário:
Postar um comentário