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segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A celeuma em torno do sotaque de Wagner Moura e o viralatismo crescente.


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Wagner Moura interpreta Pablo Escobar em ‘Narcos’, nova série do Netflix (divulgação)

por Lelê Teles, fatosenefatos

Na semana passada, fiquei passado com a quantidade de citações ao sotaque que Wagner Moura impôs ao seu personagem, Pablo Escobar, na série Narcos, do Netflix.

Branquim achou que Moura se entregou, todo mundo percebeu, pelo sotaque, que ele era brasileiro.

Um jornalista progressista chegou a perguntar, por quê não chamaram um ator hispano hablante para fazer o papel.

Pergunta bisonha essa, o espanhol é idioma oficial em 21 países, ele tem uma gama enorme de variações e sotaques.

Bobagem, portanto.

E mais, copiar o idioleto, que é a marca individual de fala, é um recurso de imitadores e não de atores.

Para mim, essa celeumazinha é apenas mais uma manifestação do Viralatismo, um movimento que cresce a cada dia no Brasil.

É bom saber, o Viralatismo se opõe ao Modernismo e seu expoente símbolo é o cantor Ed Motta, aquele que não aceita ser reconhecido como um artista latino e prefere definir a si mesmo como um artista latindo.

O Viralatismo, antípoda do Modernismo, tem como conceito e meta síntese “só a autofagia nos desune”.

O negócio é meter o pau em qualquer traço de excesso brasilidade de patrícios com sucesso no exterior.

Só deglutimos bem, nas estranjas, o sucesso de brasucas loiras de olhos claros como Gisele Bundchen.

Padilha, Moura, Coelho e Britto não nos representam, latem os vira-latas.

Se antes, no Modernismo, a proposta era deglutir o legado cultural europeu e regurgitá-lo como uma arte tipicamente brasileira; hoje, no Viralatismo, queremos nos deglutir a nós mesmos para ver se extraímos daí novamente a arte europeia pura, sem resquícios de brasilidade.

Absurdo, paradoxal e oximórico, o Brasil é capaz de produzir vira-latas com pedigree.

Espécimes endêmicos destas terras tropicais e exclusivos destas paragens, o viala-lata com pedigree tem como marca o rabo fino e sua meta síntese é tentar morder o próprio rabo.

Paulo Coelho é um escritor aclamado no mundo inteiro, mais de 130 milhões de livros vendidos em mais de 160 países. por isso mesmo, no Brasil, ele é odiado por uma multidão que nunca leu um único livro dele.

O odeiam simplesmente por ele ser brasileiro e ter feito sucesso como escritor. imagina, um ex-parceiro de Raul Seixas, um ex-tomador de chás de cogumelo!

Romero Britto é igualmente odiado pelo viralatismo. o pernambucano, com cara de trabalhador, faz uma pop art – mais pop do que art – alegre, vibrante, colorida e que encanta uma multidão; palmas pra ele.

Só que não.

Há algo no sotaque de Coelho, Britto e Moura, que incomoda os vira-latas.

quando ouço o ladrar dos cães de rua contra Wagner Moura pelo sucesso que faz no papel de Pablo Escobar, lembro que nunca os ouvi ladrar contra o sotaque do Olivier Anquier.

Aliás, todo vira-lata acha lindo um francês falando português com aquele sotaque engraçado do Grilo Falante.

Por isso os franceses fazem sucesso nos programas de gastronomia, é mais pelo sotaque que pela comida que fazem.

Todos querem ouvi-los dizer alhô, cebolá, macarrón…

É por isso que gênios do marketing pessoal como Inri Cristo, Padre Quevedo e o ex-rabino Henri Sobel carregam no sotaque.

É como jogar um osso para um vira-lata.

No mais, o cinema americano está repleto de atores alemães, belgas, italianos, espanhóis, ingleses… todos com o seu sotaque.

Aliás, o sotaque do austríaco Arnold Schwarzenegger não lhe atrapalhou em nada, tanto é que ele se tornou governador da Califórnia.

Só atrapalha o sotaque de Moura.

Lanço essa crônica como o manifesto autofágico não oficial; carece ainda de uma marca, uma logomarca: um cão vila-lata a morder o próprio rabo.

Algum artista se habilita?

Palavra da salvação.

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