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sexta-feira, 1 de abril de 2016

Primeiro-de-abril. Do poeta goiano Alisson Azevedo.


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Primeiro-de-abril

“Marcha da família com Deus pela liberdade”
Deus certamente não marchou
E provavelmente não gostou de ver seu nome usado em vão, de novo

A liberdade também não marchou
 “Quae sera tamen...”

Quanto à família
 aliás, quanto às famílias...

Marighella morreu – e deixou família
Lamarca morreu – e deixou família
No Araguaia – meu rio calmo!
Morreram Dina, osvaldão, os Grabois – pai e filho – e tantos mais
E deixaram família

Morreram soldados, coitados
“Amados ou não”
E deixaram família

Homens foram torturados, aviltados
E tinham família
Meninas foram fustigadas, estupradas
(“Que bom te ver viva!”)
E tinham família

Eles eram comunistas?
Eles eram guerrilheiros? – terroristas, em jargão?
Eles eram corajosos.
E tinham família

Eles eram muito jovens
Elas eram mais que lindas
Muitos não alcançaram a idade de Cristo
Com mais ou menos sangue, contudo,
 Todos provaram do calvário cristão 

Suas mães, irmãs, filhas, viúvas
Ecoam Antígona
A reivindicar – não uma sepultura
Mas corpos a sepultar

O poeta “vê o visto”
O poeta sonha que morrera
Quimera! Que merda!

O poeta está vivo para ver a farsa
O poeta está vivo para exumar a história
(Ninguém viu aqueles filmes, diabo!
 “Pra frente, Brasil”)

No delírio do pau-de-arara
O soldado se recusa
O oficial diz NÃO
O general se rebela

Deus interrompe a Marcha funesta
A família, humanizada, segue de mãos dadas
A liberdade, enfim, entra na história

Mas a história se repete
Senão como tragédia, ao menos como farsa, vá lá
Por isso mesmo é bem capaz de,  num domingo qualquer
A família brasileira voltar  ao Clube Militar

Como a um pavoroso jardim de infância
Como a um paraíso perdido

Mas não será difícil saber
 Quem foi mesmo que perdeu o paraíso

Alisson Azevedo

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