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quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Criança comove o mundo contra racismo nos EUA


Nessa semana, os moradores de Charlotte nos EUA se reuniram para falar sobre a morte de um homem negro que foi morto pela polícia da cidade. 

Uma menina chamada Zianna Oliphant deu um depoimento que vai te permitir ver como é ser uma criança, lidar com o racismo e as suas consequências mais violentas. 
 
spoiler: vai partir seu coração

QUEBRANDO O TABU - no facebook


https://www.facebook.com/quebrandootabu/videos/1219533844769667/

EUA iniciaram uma guerra não declarada contra os BRICS?




AMÉRICAS 11:05 29.09.2016 (atualizado 11:20 29.09.2016)

Mostrar mais: https://br.sputniknews.com/americas/20160929/6445029/eua-guerra-nao-declarada-brics.html



O conflito entre os EUA e os BRICS iniciou-se ainda alguns anos atrás. 

Washington temia a influência crescente do bloco dos cinco países e, pelo que se viu, os EUA não ficaram de braços cruzados, disse ao serviço russo da Rádio Sputnik o especialista russo Ilya Kharlamov.

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© SPUTNIK/ VLADIMIR ASTAPKOVICH


Às vezes especialistas norte-americanos são bastante sinceros nas suas declarações sobre a intenção dos EUA de manter o domínio global. 

Especialmente aqueles que vivem fora dos EUA. Um deles publicou um texto em que afirma que a primeira etapa de destruição do bloco BRICS já se iniciou. 

Na sua opinião, este grupo é o que coloca maior ameaça à hegemonia econômica norte-americana, hegemonia que Washington e o mundo de negócios leal aos EUA estão prontos a defender por todos os meios possíveis, inclusive de armas na mão.

 Trata-se principalmente do Brasil. Foi o Brasil que tentou enfrentar os oligarcas ocidentais no mercado energético brasileiro, mas perdeu esta luta. 

Washington usou o seu "método de mudança de governos" ligado ao habitual tema da corrupção. 

Por exemplo, este mesmo método foi usados na Ucrânia e em outros países. 

Há tentativas de manipular as pessoas e de provocar protestos em contextos de situação econômica desfavorável, nos países onde o problema da corrupção pode servir de rastilho. 

Na opinião do analista russo Ilya Kharlamov, este cenário foi muito eficaz no caso do Brasil. A ex-presidente do Brasil foi afastada depois de uma campanha para manchar a sua imagem.

 Michel Temer, destacou o especialista, foi informador da Agência Central de Inteligência (CIA), segundo as informações do portal WikiLeaks. 

O novo líder brasileiro já anunciou a venda dos ativos petroleiros do Estado, que podem ir parar às mãos dos que não estavam satisfeitos com Dilma. 

Uma outra coisa interessante é que foram as agências de rating norte-americanas que prestaram a maior atenção ao fato de o país estar numa situação econômica muito grave. 

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© REUTERS/ WANG ZHAO/POOL 'BRICS seriam excelentes membros permanentes do CS da ONU' – enviado da Rússia na ONU 
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É o que o Brasil vinha consolidando gradualmente a sua soberania e a sua influência, inclusive no quadro do BRICS.

 O novo bloco transformou-se em um novo centro de poder, o que não agrada de maneira nenhuma aos EUA.

 A competição entre os BRICS e os EUA começou ainda alguns anos atrás quando, por exemplo, os países dos BRICS começaram a discutir o problema de desigualdade de quotas no Fundo Monetário Internacional (FMI) entre os países ocidentais e o resto do mundo.  

O apetite dos EUA estende-se também para outros países da América Latina, inclusive à Venezuela, que desenvolve de forma ativa relações com a Rússia.

 O presidente deste país fala abertamente  sobre conspirações organizadas pelos EUA. 

Agora o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, declarou mesmo o seu desejo de desenvolver boas relações com os EUA, o que aconteceu no meio das discussões sobre o referendo e sobre a saída de Maduro do poder. 

A tentativa de neutralizar a influência dos BRICS tornou-se uma tendência política estável. No contexto das ambições globais podemos lembrar também a Europa, o Oriente Médio e a África do Norte, afirmou Kharlamov. 

Com certeza, os EUA não conseguem fazer tudo o que querem. Este é o maior perigo para os EUA, que podem não ter capacidade suficiente para manter os seus apetites geopolíticos, como aconteceu no caso do o Império Otomano, que se estendia dos países Balcânicos até a Ásia Central e da Crimeia até Marrocos. 

No início do século XX esta construção gigantesca desintegrou-se. Quem sabe se o mesmo não pode acontecer aos EUA se estes não desistirem das suas ambições? 11

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Wells Fargo: O cambalacho já foi longe demais

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Wells Fargo: O cambalacho já foi longe demais

23/9/2016, Rob Urie,* Counterpunch


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu



Um dos aspectos politicamente mais frustrantes da última década no ocidente é a nenhuma disposição dos poderes que haja, para corrigir a disfunção radical que subjaz à economia política ocidental. 

De fato, como microcosmo e como metáfora, aí está hoje diante de nós o 'escândalo' do banco Wells Fargo – cujos banqueiros criaram milhões de contas falsas, cobraram correspondentes 'tarifas' dos clientes e depois mandaram às favas os supostos reguladores (que tampouco manifestavam qualquer interesse em regular coisa alguma). Em 2011, quando se diz que o banco teria iniciado essa prática, o Wells Fargo ainda estava sendo ativamente 'resgatado', e tomavam-se medidas 'extraordinárias' para reviver as fortunas dos ricos e bem relacionados, e ainda não se sabia claramente que 'a mudança na qual você pode acreditar' significava total ressuscitamento do mesmo sistema que criara as repetidas crises das últimas décadas.

A incansável propaganda da recuperação econômica isolou lado 'a economia' do sistema mais amplo de controle político e econômico, e impôs um ciclo ascendente pesadamente 'arquitetado', como se fosse um novo estado de coisas permanente. Também criou a ficção de que fatos que centenas de milhões de pessoas tinham diante dos olhos não seriam fatos, nem ali estariam. Em lugar deles, só governos e bancos centrais de EUA, UE e Grã-Bretanha, a insistir que – dessa vez vai! – a recriação das circunstâncias que levaram às três mais recentes crises consecutivas levaria agora a resultados benevolentes, os quais seriam distribuídos com equanimidade. 

O que o 'escândalo' de Wells Fargo põe às claras é que a única coisa que sempre é 'recuperada', cuja 'recuperação' é sempre bem-sucedida é o sistema de finança predatório que existe, com capitalistas institucionalizados que puseram a serviço deles uma pequena, mas muito poderosa plutocracia.

VALOR LÍQUIDO x PIB – O golpe capitalista que começou nos anos 1970s foi uma resposta a uma crise real, exposta como taxa de lucro decrescente e/ou declinante controle plutocrático sobre a economia política ocidental. A financeirização alterou o equilíbrio de poder, fazendo-o pender na direção do capital através do sistema monetário. Bancos criam dinheiro contra passivos separáveis [orig. separable liabilities]. Analogia grosseira mas clara é você poder legalmente tomar um empréstimo, dando como garantia a casa de seu vizinho: você (os capitalistas conectados) fica com o dinheiro; e a casa de seu vizinho é tomada pelo credor quando você não pagar o empréstimo. Resultado eventual é que as demandas sobre a produção econômica vão-se concentrando cada vez mais, conforme o sistema econômico torne-se instável. Fonte: St. Louis Federal Reserve.

A luta de classes visível na atual temporada política foi lançada 'de cima' nos anos 1970s por capitalistas conectados – riqueza herdada com apoio de uma classe gerencial comprometida, com o objetivo de retomar o poder e o controle sobre a economia política ocidental. A promessa, feita contra os resultados reais de vários séculos de história imperial do ocidente, seria algo como uma prosperidade amplamente partilhada a ser alcançada graças à auto-realização limitada, à autocontenção, dos capitalistas democratas... O que realmente aconteceu é uma circunstância econômica fortemente declinante para muitas pessoas; uma rala prosperidade para os gerentes burgueses do 'apoio'; e uma nova Era Dourada para a classe que se autoenriquece, executivos das grandes empresas, os que herdam patrimônio e os predadores financeiros.


Aqui, novamente o caso do banco Wells Fargo serve como microcosmo exemplar – um porão de trabalho escravo financeiro para trabalhadores de baixa qualificação, comandado por executivos dedicados ao autoenriquecimento (e 'acionistas') cujo modelo de negócio implica usar poder social assimétrico para roubar todos que eles consigam roubar. 

Inicialmente, só o banco Wells Fargo sabia que o cambalacho de abrir contas fraudulentas para cobrar taxas ilícitas era sistêmico. Sem saber do que estava acontecendo, clientes individuais acreditavam, de boa fé, que contas abertas fraudulentamente eram erros; tomados um a um, o dinheiro roubado de correntistas era muito pouco e não justificaria contratar advogados com o objetivo de reavê-lo; e em 2011, quando a fraude foi afinal notificada e supõe-se que teria começado, Wall Street já havia conquistado o 'direito', que o governo de (Barack) Obama garantiu-lhe, de criar documentos falsos e cobrar taxas ilícitas para despejar fraudulentamente milhões de tomadores de empréstimos garantidos por hipotecas.


Mudança quinquenal [talvez "trianual"?(NTs)] do PIB – Apesar de a promessa de prosperidade partilhada ser ainda tida em alta conta e repetida por capitalistas, executivos de grandes empresas e os seus respectivos "idiotas úteis" de Academia quando o golpe capitalista foi lançado nos anos 1970s, à altura de 2008 as provas já se acumulavam a ponto de já se terem tornado irrefutáveis: o capitalismo, o imperialismo econômico apresentado como de 'livre escolha', é modo de organização social que existe para gerar catástrofe, e só beneficia uma ínfima minoria, à custa de todos os cidadãos do planeta. Se se consideram os termos de que se servem os explicadores de academia do capitalismo (economistas), o sistema existente só é plausível durante os breves períodos de respiro entre crises recorrentes. A grande tendência do declínio da economia sugere que o torvelinho e a agitação social só aumentarão, até que se encontre outra solução. Fonte:  St. Louis Federal Reserve.


A atual temporada de campanha política mostra duas alas da tungocracia [orig. griftocracy] que disputam uma mesma carcaça. Hillary Clinton e Donald Trump são renomados gerentões 'da patuleia', a saber, dos eleitores, sempre ativos a favor da riqueza e do poder como os temos hoje. 

O banco Wells Fargo foi empoderado para fraudar e roubar clientes, primeiro pelos Clintons com as leis de desregulação, na sequência por Barack Obama mediante os 'resgates' sem qualquer consequência e os programas para falso alívio da tragédia das famílias despejadas. 

John Stumpf, presidente do Wells, ‘gerencia' seu banco mais ou menos como Donald Trump administra seus negócios, servindo-se sempre do poder econômico assimétrico disfarçado como relações 'de mercado'. Fazendo pose de capitalistas supostos bem-sucedidos, os dois assaltam o dinheiro público que chega até eles sob a forma de 'resgates', privilégios, redução de impostos, tribunais 'especiais' e, mais importante, mediante o sistema de 'livre' empresa, pelo qual bater carteira de trabalhadores e consumidores é prática negocial generalizada.

Esse último ponto foi exposto e defendido com alarido e sem descanso durante os primeiros dias do governo Obama, quando os arquitetos da catástrofe econômica – Timothy Geithner, Larry Summers, Ben Bernanke e sortimento variado de apparatchiks do capitalismo financeiro estavam sendo escalados para enterrar os mortos e arquitetar uma 'recuperação' econômica que, não se entende como, talvez por milagre, não viu os que realmente careciam de tudo, e só 'recuperou' o sistema de finanças predatório que os pôs no comando e deu-lhes emprego e poder

Só aquele sistema foi 'recuperado', e tornou os atores específicos em larga medida supérfluos. 

As diferenças mais notáveis entre Hillary Clinton e Donald Trump aparecem nas respectivas políticas externas. Por isso a história da candidata Clinton, sociopata com obsessão por poder imperial, a compromete tão gravemente. Mas os dois candidatos são encarnações do ethos do batedor-de-carteiras que enriquece 'por méritos seus', da mesma classe da qual brotam banqueiros cambalacheiros como o do banco Wells Fargo.


Gráfico 3: SOMA DE TODAS AS BOLHAS – O golpe capitalista que começou nos anos 1970s usou a finança como mecanismo para concentrar em poucas mãos a ação sobre a produção econômica. A taxa declinante da produção econômica no ocidente desenvolvido (parte média do gráfico) coincide com crises de magnitude crescente, ligadas à jogatina financeira. Moradia, como arte e outros 'ativos' tangíveis, foram financeirizados e mercadorizados [ing. commodified] para facilitar a propriedade, agora concentrada, de todos esses ativos. A fungibilidade dos ativos é uma função da 'liquidez', o aspecto pelo qual as demandas sobre a produção econômica são realizadas socialmente. É o que dá conteúdo político às políticas do Federal Reserve que economistas de Academia pretendem que seriam neutras. Método: Ln(h) + Ln(s) = Ln(h*s) = Soma de Todas as Bolhas. Fonte: St. Louis Federal Reserve.


Como ficou claro depois da última crise, a economia política que foi recuperada funciona mediante o emprego do poder social para esmagar trabalhadores e fraudar consumidores. Acrescentem-se colonialismo e neocolonialismo, e temos o imperialismo ocidental dos últimos vários séculos. 

Nenhum dos candidatos dos grandes Partidos nos EUA cuidará de modo significativo da questão do aquecimento global, nem de reduzir as armas nucleares nem de reconstruir o poder do trabalho. Só promoverão os interesses dos grandes capitalistas interconectados, sob a máscara de que estariam cuidando do interesse público. O 'escândalo' do banco Wells Fargo é bom para uma rodada ou duas de encenação 'preocupação' política, para assegurar que o resultado seja mais e mais continuado apoio ao sistema que fabricou aquele banco e aquele escândalo. 

A evidência de que Marx e Lênin identificaram muito claramente essas disfunções do capitalismo há mais de um século é indicação de que temos modelos analíticos eficientes a aplicar quando sejam necessários.

Finalmente, e é relevante para qualquer economista que tenha lido até aqui, bolhas financeiras tem consequências distribucionais (Gráfico 1) e também são economicamente desestabilizatórias. O modelo de 'fundos aplicáveis' que relaciona empréstimos bancários aos depósitos mediante taxas de juros perdeu o poder descritivo-explicativo em relação à financeirização da economia dos anos 1970s em diante. (E nunca foi mecanicamente acurado.) 

O paradoxo criado por juros baixos na era atual é que eles motivam uma alavancagem financeira sempre crescente, que amplia a instabilidade econômica. Pode implementar uma gestão Keynesiana da demanda mediante políticas fiscais, sem a necessidade de juros perpetuamente baixos. Como o cambalacho do banco Wells Fargo sugere, como ponta visível do iceberg, o sistema hoje existente de capitalismo de finanças tem de ser posto abaixo, para que a reconciliação social seja possível.*****



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segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Neruda - A Poesia pede licença

23 de Setembro de 2016 - 15h46 

 


Peço licença para falar sobre a poesia. Ou sobre o poeta. Ou talvez a poesia e o poeta sejam um só, que neste caso o poeta foi feito, vida inteira, da mesma matéria, do verso e do amor, da dor e do ritmo, da poesia que corta, sangra e apaixona. Peço licença. É que em um dia feito hoje, há 43 anos, morria de dor e de fascismo o poeta Pablo Neruda, o que disse que “o que mais se parece com a poesia é um pão ou um prato de cerâmica ou uma madeira delicadamente lavrada, ainda que por mãos rudes”.


Wikicommons
Mas a poesia não morreu com o poeta. Como ele mesmo dizia, a poesia “tem as sete vidas do gato”

Mas a poesia não morreu com o poeta. Como ele mesmo dizia, a poesia “tem as sete vidas do gato”

O dono de um nome com uma sonoridade ímpar escolheu outro, justificando-o como uma homenagem. Ricardo Eliecer Nefatlí Reyes Basoalto, um nome real, um nome de poeta. E ele escolheu Pablo, um nome plebeu feito a sua poesia, poesia de mineiros e de pescadores, poesia de estudantes e de operários, poesia de bêbados e de amantes suicidas, poesia de mulheres belas e terrivelmente passionais, poesia do singelo e do épico, de maremotos e vulcões e terremotos. A poesia de Pablo foi a América Latina em convulsão, feito os vulcões da cordilheira, em permanente erupção. 

Não comecei Pablo pela sua poesia. Minha primeira leitura foi sua autobiografia, “Confesso que vivi”. Comecei Pablo pelo final, e o homem profundamente identificado com o seu povo encantou-me antes mesmo que a sua poesia. Comecei Pablo pelo adolescente magro, envolto numa fantasmagórica capa cinzenta, sonhando com a poesia e com as mulheres. É que eu também era, à época, um adolescente magro, feio, desengonçado, que sonhava mais com as mulheres do que com a poesia, aquelas bem mais inacessíveis do que esta. Diferente de Pablo, no entanto, eu não tive a sorte de uma viúva de coração fogoso, que me desse amor em desacordo com a minha desnutrição. Sonho ainda despir aquela viúva de imensos olhos azuis das suas sedas negras e violetas, “uma fruta nevada envolta numa aura de dor”.

Comecei o poeta chileno pela aventura do adolescente com a mulher desconhecida a lhe visitar no celeiro, em uma debulha de trigo. Nunca vi o trigo e não conheço celeiros, mas fantasio com aquela noite escura, pensando naquela mulher, no seu cheiro, na cama de palha que ela dividiu com o poeta.

Comecei Neruda pelo sujeito que virou cônsul meio ao acaso, escolhendo uma cidade desconhecida que ficava numa depressão do globo terrestre. O mesmo cônsul que protagonizou histórias de amor e ódio em países distantes e inimagináveis.

Comecei Dom Pablo pelo comunista que percorreu o país inteiro, seja em fuga espetacular pela cordilheira, seja em campanha eleitoral, partilhando a cama e a mesa com os mineiros do Chile, com os pescadores, com os trabalhadores da cordilheira.

Somente depois disso é que conheci a poesia poderosa de Neruda. Poucos poetas celebraram com tanta intensidade o amor e a revolução. O mesmo poeta que escreveu “Em teus olhos guerreavam as chamas do crepúsculo/ e as folhas caíam na água de tua alma”, escreveu também “Trigo e aço aqui nasceram/ da mão do homem, de seu peito./ E um canto de martelos alegra o bosque antigo”. O mesmo Neruda que escreveu “ali, mulher do amor, me acolheram os seus braços./ Era a sede e a fome, e tu foste a fruta./ Era o duelo e as ruínas, e tu foste o milagre”, escreveu os versos de guerra “sairemos das pedras e do ar/ para morder-te:/ sairemos da última janela/ para derramar-te fogo:/ sairemos das ondas mais profundas/ para cravar-te com espinhos”.

O poeta escreveu em uma de suas obras: “Não venho para resolver nada./ Vim aqui para cantar/ e para que cantes comigo./ (...)/ Canta comigo até que as taças/ se derramem deixando púrpura desprendida/ sobre a mesa”. Desde o longínquo dia em que o conheci tenho atendido ao seu convite, tenho cantado com ele e com a poesia, e muitas vezes já as taças tingiram de púrpura as toalhas das mesas.

Estão no “Canto Geral” os versos que trago guardados com ternura de menino: “Sobe comigo, amor americano./ Beija comigo as pedras secretas”. Carrego estes versos entalhados na alma e na memória, cuidadosamente gravados dentro de mim. Inúmeras vezes eu os usei, inúmeras vezes convidei um amor americano para beijar comigo as pedras secretas da paixão e da poesia.

Há 43 anos mataram Pablo Neruda. Sim, Neruda foi morto pela mesma mão que assassinou Allende e que feriu de morte a pátria chilena. Neruda morreu, como já disse, de dor e de fascismo. Era um homem perigoso para os opressores, para aqueles soldados que ocuparam a sua casa e ouviram dele: “Olhem em todos os lugares, a única coisa perigosa que encontrarão para vocês é a poesia”. O mesmo fascismo que o matou estende hoje sua sombra ameaçadora sobre a América. Usa novas roupas, vestes elegantes, mostra um rosto jovem e sorridente. Mas não nos enganemos, é o mesmo e velho fascismo, com sua face de maldade a jurar de morte a paixão e a poesia, a mirar com ódio o coração da liberdade. 

Mas a poesia não morreu com o poeta. Como ele mesmo dizia, a poesia “tem as sete vidas do gato”. Nos dias sombrios de hoje, o que podemos dizer à memória do poeta, com a sua irrevogável esperança, são os mesmos versos que ele escreveu em homenagem a Luis Emilio Recabarren: “Juramos que a liberdade/ levantará sua flor nua/ sobre a areia desonrada./ Juramos continuar teu caminho/ Até a vitória”.


Por Joan Edesson de Oliveira



domingo, 25 de setembro de 2016

Um tiro contra a Filosofia e a Sociologia – A Educação Brasileira retorna à Ditadura Militar


alexandre-frota-da-aula-de-moral-e-civica

Por Bajonas Teixeira, colunista de política do Cafezinho 

“Sempre que ouço a palavra cultura, tenho vontade de sacar uma arma” (Herman Göring, ministro de Hitler e um dos planejadores do holocausto judeu)

Para fazer frente às “ideologias”, à “ameaça do comunismo e da subversão”, a Ditadura Militar implementou uma série de medidas e de leis. Nas práticas adotadas, por exemplo, espiões e alcaguetes infiltrados nas universidades foram encarregados de mapear os agitadores e aponta-los aos órgãos repressivos, exatamente como o capitão Willian Pina Botelho que se infiltrou entre os manifestantes agora em São Paulo.

Do ponto de vista de políticas para a educação, tendo em vista a criação de uma geração sem crítica, sem reflexão e inteiramente submissa aos imperativos da obediência, a Ditadura preparou leis para banir a sociologia e à filosofia dos currículos substituindo-as por disciplinas de doutrinação autoritária.

A lei n. 5692/71, deslocou as disciplinas relacionadas à ciências humanas (a filosofia, a sociologia e a psicologia) introduzindo no lugar delas as matérias de Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil (OSPB). Na verdade, essas disciplinas nunca existiram, nem poderiam existir, como conteúdos de conhecimento específicos porque elas não passavam de nomes dados pela Ditadura aos seus interesses ideológicos.

A sociologia, diferente desses simulacros de conteúdo, é uma disciplina que existe, que conta com inúmeros grandes nomes (Marx, Durkheim, Weber, Adorno, Habermas, etc.), e se ramifica em muitas escolas e tradições de pesquisa. A Moral e Cívica é um mera invenção sem qualquer conteúdo.

Não havia o que ensinar sob a rubrica Educação Moral e Cívica. Que Moral seria essa, quando, há um século, o moralismo havia sido superado pela critica e a pesquisa das ciências humanas? Moral aqui era só a síntese do que os militares entendiam por sociedade obediente, disciplinada e ordeira.

Do mesmo modo, Cívica, não tinha nada que ver com civilizado ou civilização, menos ainda com “civil”, a não ser no sentido de ensino da adoração aos símbolos da pátria, ou seja, um tipo de nacionalismo vazio já moribundo nos tempos da República Velha. Ressuscitar essas coisas era, na verdade, inventar um freezer social, congelar a política e varrer qualquer questionamento.

O essencial era isso: recuperar mitologias ocas para produzir cérebros anestesiados e incapacitados de esboçar a menor atitude crítica. Era como um regime para que os jovens perdessem a musculatura cultural e se tornassem anêmicos, incapazes de luta. E é isso que o Decreto do governo Temer, encabeçado por "Mendoncinha", o ministro da educação (que comédia) quer nos impor. É um projeto de educação orientado para a "segurança nacional", ou seja, para objetivos autoritários.

Os anos finais da Ditadura ressuscitaram um intenso debate que, muito prolongado e arrastado, terminou por reintroduzir a filosofia e a sociologia como disciplinas obrigatórias no Ensino Médio.

Está no artigo 35 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (dezembro de 1996) quanto ao ensino médio, § IV:

IV – serão incluídas a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias em todas as séries do ensino médio.

A implementação dessa lei nunca foi satisfatória, faltando aos políticos de esquerda na democracia uma real compreensão do que estava em jogo. Para se ter uma ideia desse descompromisso com a necessidade do pensamento crítico em uma sociedade democrática, tanto a profissão de jornalista quando a de sociólogo, duas importantes frentes da crítica social e política,  incluem-se hoje entre aquelas que se pode obter registro sem diploma. O STF foi fundamental para isso, ao derrubar a obrigatoriedade do diploma para jornalistas. Veja-se a lista:

“As categorias regulamentadas por lei que devem realizar o registro profissional no MTE [Ministério do Trabalho e Emprego] são: Arquivista e Técnico de Arquivo; Artista e Técnico em espetáculos de diversão; Atuário; Guardador e lavador de veículos autônomo; Jornalista; Publicitário e Agenciador de Propaganda; Radialista; Secretário e Técnico em secretariado; Sociólogo; e Técnico de segurança do trabalho.”

Ao que tudo indica, o decreto absurdo que bane a sociologia e a filosofia, caso permitamos que seja implementado, trará enormes prejuízos para a democracia, uma vez que não há democracia sem capacidade de pensar e sem sensibilidade para os elementos determinantes das relações sociais: o poder, os interesses, as ilusões objetivas, as diferenças e influencias culturais, etc.

Tomara que uma grande resistência se levante nas escolas, e que o ensino médio no país inteiro se decida por medidas de combate a esse decreto absurdo. Cada vez mais me convenço que o país terá que parar se quiser parar o golpe.

Caros leitores, Os convido a visitar e curtir a página MÁQUINA CRÍTICA. Nosso desejo é mobilizar o pensamento crítico em favor da democracia, sem esquecer outros temas e debates que importam. Ps: Continuaremos normalmente nossa colaboração com O Cafezinho, que está nos apoiando nesse projeto. Abraços