16 de Maio de 2016 - 16h21
Façamos as contas: o ministro da Justiça do governo do golpe enfatiza que o chefe do Executivo, seu patrono Michel Temer, é quem tem o poder para nomear (ou destituir) o procurador-geral da República e o diretor-geral da Polícia Federal. Temer extinguiu a Controladoria-Geral da União, que tinha autonomia na fiscalização, e parte do bando macho e branco que indicou para os ministérios é investigada na Lava Jato. Além disso, o estado de exceção se anuncia.
A entrevista de Moraes à Folha de S.Paulo, publicada nesta segunda-feira (16), é mais uma fotografia do que vem aí. Aliás, é fiel ao sentido do governo do golpe à retomada do mote "ordem e progresso", apelando ao apaziguamento e à resignação da população através do trabalho e do abandono do protesto e da resistência diante da ilegitimidade, para supostamente garantir a superação ordeira da crise.
A ênfase na prerrogativa do chefe do Executivo para a nomeação do procurador-geral da República e do diretor-geral da Polícia Federal foi a resposta a uma pergunta sobre as práticas dos governos Lula e Dilma, por exemplo, de escolher um procurador a partir de uma eleição interna pela categoria, uma forma de buscar garantir sua autonomia, que entretanto não deixa de ter suas críticas.
Na mesma toada, o ministro interino disse que revisará "todas as portarias deste ano de todas as áreas", inclusive as demarcações de terras indígenas, que poderão ser revogadas por pressão da bancada ruralista, segundo a entrevista.
Para se afirmar competente à frente do cargo, Moraes, que integrou o Ministério Público de São Paulo, retratou o governo do tucano Geraldo Alckmin – que coloca a Polícia Militar para reprimir estudantes exigindo a averiguação do desvio de verbas da merenda escolar – como “honesto”, motivo pelo qual não é tão investigado. Mais precisamente, ele alegou: “um governo honesto é menos investigado porque não tem escândalos”.
A posição é por si só tão chauvinista que sequer precisamos discorrer na argumentação sobre 1) “não tem [mais] escândalos” porque a mídia monopolizada e cúmplice não se “empenhou”, tendo outras prioridades; 2) não esquecemos o cartel dos trens no governo de outro tucano exemplar, José Serra, hoje envergonhando o Brasil como chanceler (uma investigação na Suíça apurou, por exemplo, que a empresa Alstom já pagava propinas a governos desde 1997). E etcétera.
Fica cada vez mais evidente um ranço da gangue golpista contra o governo Dilma: a investigação da corrupção. Personagens de George Orwell (que repetiriam “nós somos ímpios, ela é bandida” ad nauseam até se tornar “verdade”) integrados a um aparato dedicado a isso fazem o trabalho escabroso de mergulhar a massa do golpe protestando de verde-amarelo nesse conto.
Enquanto o combate à corrupção, no qual todos e todas nos empenhamos inclusive através da proposta da reforma política, é mais uma vez manipulado pela direita reacionária e cínica, que se orgulha da fotografia do retorno ao passado oligárquico, a discussão sobre o estado de exceção anunciado deve continuar permeando, e cada vez mais, as análises desta conjuntura.
As manifestações da direita e dos conservadores, como os discursos oportunistas de deputados e senadores, não só apelaram ao que de mais sombrio temos na história do Brasil, como a ditadura e os torturadores, à intervenção dos Estados Unidos e à “limpeza” do governo (por personagens comprometidos na corrupção endêmica), como também mostraram completo desprezo pelo direito e os princípios da Constituição federal, anunciando que as exceções serão a regra.
Nunca é demais repetir o perigo que esta lógica representa à democracia e aos direitos civis e políticos – culminando na suposta legitimação de um governo golpista e de um retorno à faceta mais agressiva do neoliberalismo vassalo. Como disse Giorgio Agamben, é preciso atentar para o fato de que o estado de exceção torna-se o novo paradigma de governo. É também contra isso que nos colocamos; temos no Ministério da Justiça um reflexo desta lógica, ainda que interina e ilegítima, bastante perigosa, da qual a população deve se conscientizar.
Façamos as contas: o ministro da Justiça do governo do golpe enfatiza que o chefe do Executivo, seu patrono Michel Temer, é quem tem o poder para nomear (ou destituir) o procurador-geral da República e o diretor-geral da Polícia Federal. Temer extinguiu a Controladoria-Geral da União, que tinha autonomia na fiscalização, e parte do bando macho e branco que indicou para os ministérios é investigada na Lava Jato. Além disso, o estado de exceção se anuncia.
Por Moara Crivelente*
Guilherme Santos/Sul21
O ministro da Justiça do golpe, Alexandre de Moraes, já disse que “nenhum direito é absoluto” – preparando a legitimação do estado de exceçãodeclarado pelo soberano, como teorizou Carl Schmitt, jurista que se aproximou do governo nazista. Não é surpresa que a classe média e alta formando a argamassa dessa reviravolta anti-democrática no país aplauda a retórica e a prática. Afinal, todo o processo contra Dilma – e seus eleitores, diga-se de passagem – é sustentado nela e no que muitos já identificaram como a despolitização da cidadania.
A entrevista de Moraes à Folha de S.Paulo, publicada nesta segunda-feira (16), é mais uma fotografia do que vem aí. Aliás, é fiel ao sentido do governo do golpe à retomada do mote "ordem e progresso", apelando ao apaziguamento e à resignação da população através do trabalho e do abandono do protesto e da resistência diante da ilegitimidade, para supostamente garantir a superação ordeira da crise.
A ênfase na prerrogativa do chefe do Executivo para a nomeação do procurador-geral da República e do diretor-geral da Polícia Federal foi a resposta a uma pergunta sobre as práticas dos governos Lula e Dilma, por exemplo, de escolher um procurador a partir de uma eleição interna pela categoria, uma forma de buscar garantir sua autonomia, que entretanto não deixa de ter suas críticas.
Na mesma toada, o ministro interino disse que revisará "todas as portarias deste ano de todas as áreas", inclusive as demarcações de terras indígenas, que poderão ser revogadas por pressão da bancada ruralista, segundo a entrevista.
Para se afirmar competente à frente do cargo, Moraes, que integrou o Ministério Público de São Paulo, retratou o governo do tucano Geraldo Alckmin – que coloca a Polícia Militar para reprimir estudantes exigindo a averiguação do desvio de verbas da merenda escolar – como “honesto”, motivo pelo qual não é tão investigado. Mais precisamente, ele alegou: “um governo honesto é menos investigado porque não tem escândalos”.
A posição é por si só tão chauvinista que sequer precisamos discorrer na argumentação sobre 1) “não tem [mais] escândalos” porque a mídia monopolizada e cúmplice não se “empenhou”, tendo outras prioridades; 2) não esquecemos o cartel dos trens no governo de outro tucano exemplar, José Serra, hoje envergonhando o Brasil como chanceler (uma investigação na Suíça apurou, por exemplo, que a empresa Alstom já pagava propinas a governos desde 1997). E etcétera.
Fica cada vez mais evidente um ranço da gangue golpista contra o governo Dilma: a investigação da corrupção. Personagens de George Orwell (que repetiriam “nós somos ímpios, ela é bandida” ad nauseam até se tornar “verdade”) integrados a um aparato dedicado a isso fazem o trabalho escabroso de mergulhar a massa do golpe protestando de verde-amarelo nesse conto.
Enquanto o combate à corrupção, no qual todos e todas nos empenhamos inclusive através da proposta da reforma política, é mais uma vez manipulado pela direita reacionária e cínica, que se orgulha da fotografia do retorno ao passado oligárquico, a discussão sobre o estado de exceção anunciado deve continuar permeando, e cada vez mais, as análises desta conjuntura.
As manifestações da direita e dos conservadores, como os discursos oportunistas de deputados e senadores, não só apelaram ao que de mais sombrio temos na história do Brasil, como a ditadura e os torturadores, à intervenção dos Estados Unidos e à “limpeza” do governo (por personagens comprometidos na corrupção endêmica), como também mostraram completo desprezo pelo direito e os princípios da Constituição federal, anunciando que as exceções serão a regra.
Nunca é demais repetir o perigo que esta lógica representa à democracia e aos direitos civis e políticos – culminando na suposta legitimação de um governo golpista e de um retorno à faceta mais agressiva do neoliberalismo vassalo. Como disse Giorgio Agamben, é preciso atentar para o fato de que o estado de exceção torna-se o novo paradigma de governo. É também contra isso que nos colocamos; temos no Ministério da Justiça um reflexo desta lógica, ainda que interina e ilegítima, bastante perigosa, da qual a população deve se conscientizar.
*Moara Crivelente é doutoranda em Política Internacional e Resolução dos Conflitos e membro do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), assessorando a presidência do Conselho Mundial da Paz.
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