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segunda-feira, 23 de março de 2015

O momento político e o papel dos partidos

Escrevo sobre instigante tema, provocado pelo caro Renato Monteiro, publicitário de mente inquieta, em seu perfil no facebook: devem o PT e o PSDB corrigir o erro de terem trilhado caminhos diferentes no passado e se articularem para atuar em unidade daqui por diante?

Penso que os caminhos diferentes trilhados pelo Partido dos Trabalhadores e o Partido da Social Democracia Brasileira não se devem a má-querenças entre pessoas, por hipótese, Mário Covas/FHC em contraposição a Ulisses Guimarães/Pedro Simon.

De início, a questão nos leva a refletir sobre o por quê da criação dos dois partidos. Ora, porque representavam dois projetos políticos, econômicos e sociais diferentes, projetos que almejavam o poder no período recém-inaugurado da redemocratização a partir de 1985.

Embora os dois partidos fossem compostos de vitoriosos opositores à finada ditadura militar, expressassem fundamentos programáticos de matriz social-democrata e se dispusessem à conquista do poder do Estado na obediência das regras da democracia, avalio que as semelhanças se encerravam por aí mesmo.

Enquanto o PSDB nasceu de uma cisão no campo do PSD/MDB/PMDB, representando parcelas democráticas das classes dominantes, o PT havia surgido da junção de setores do movimento operário, sindical, social, comunidades de base católicas e egressos de diversas organizações que lutaram/lutavam pelo ideal socialista, se propondo a representar os trabalhadores brasileiros. Ainda algo em comum: os dois partidos disputavam o apoio das chamadas classes médias e da intelectualidade.

No campo programático, a diferença entre as duas legendas foi marcante, desde o início. Enquanto o estatuto do PT (1980) propõe como objetivo final a construção do “socialismo democrático”, vem o estatuto do PSDB (1988) apresentar como objetivo da legenda “a realização do desenvolvimento de forma harmoniosa, com a prevalência do trabalho sobre o capital, buscando a distribuição equilibrada da riqueza nacional entre todas as regiões e classes sociais”.

Passados 35 anos da criação do PT e 27 anos do nascedouro do PSDB, julgo que as duas agremiações ainda hoje representam, sem dúvida, projetos diferenciados para o Brasil. Destaco que, nesse período republicano pós-ditadura, não só o PT e o PSDB, mas também o PMDB, como os maiores partidos, são ainda fundamentais para sustentar a democracia brasileira, ainda muito imperfeita, uma jovem experiência, que precisa amadurecer, ampliar-se e aperfeiçoar-se, e jamais retroceder.

Aliás, nunca é demais reafirmar que os partidos políticos são as estruturas fundantes da democracia representativa, pelo que não é admissível que um queira suprimir o outro, ou apear governantes do poder porque o seu candidato não ganhou, sob pena de fraturar-se a democracia via golpe, seja verde-oliva, ou branco - pelo Parlamento ou Judiciário.

A regra do jogo é clara e emana da Constituição da República: eleições presidenciais, com reeleição, a cada 4 anos. Vem aí 2018, propostas e candidatos já estão sendo pensados. É premente a necessidade de todos os partidos defenderem a regra constitucional e defenderem nossa tenra experiência democrática, tão escassa na História da Nação brasileira. Haverá condições para que o PSDB não se desvie do caminho que prevê o jogo democrático e a soberania do voto popular como mecanismos para a conquista do poder estatal, com a possibilidade da alternância entre as forças políticas?

Destaco que no curso da semana passada, Dilma, Marconi e Paulo Garcia proferiram verdadeira aula magna de política no evento do lançamento das obras do BRT norte/sul em Goiânia, comprovando a possibilidade/necessidade de que as esferas federal, estadual e municipal atuem em conjunto e com a harmonia possível para a consecução de obras e políticas públicas de interesse da população. Foram pronunciamentos dignos de estadistas, calcados no respeito à vontade das urnas, na tolerância política, na condenação ao sectarismo, premissas essas que não pressupõem que cada corrente política deve abrir mão de seu conteúdo programático.

Penso que hoje, a Presidenta Dilma deve dedicar todo o esforço para firmar um novo pacto social, político e econômico, sustentado por ampla articulação, buscando enfrentar em melhores condições os efeitos danosos da grave crise sistêmica do sistema capitalista. Como sabido, a supremacia do capital financeiro, do rentismo e da especulação financeira, lançou o mundo todo numa espiral de desaceleração econômica.

Só para ilustrar: EUA travou, milhões foram lançados no desemprego, despejos; até a China desacelerou sua taxa de crescimento (vinha em cerca de 10% nos últimos 30 anos) para 7%. Os países da União Européia tiveram retração, queda da economia de 1,7%, de 2008 a 2014. E é de ressaltar-se que nesse mesmo período a economia brasileira ainda conseguiu crescer 19,3%. Um grande feito, que proporcionou o baixo índice de desemprego, a valorização salarial que promoveu a maior distribuição de renda já ocorrida no país, que precisa avançar e se consolidar.

Aí, pergunto eu: o PSDB apoiaria um novo pacto que mantenha, no essencial, mesmo que alguns ajustes sejam feitos, a busca de recuperar o crescimento econômico com a manutenção de direitos sociais e trabalhistas que tiraram 36 milhões de brasileiros da situação de miséria -fome, mesmo- e elevaram 42 milhões à dita classe média baixa (na verdade, um novo contingente de trabalhadores) que ampliou o mercado interno, antes muitíssimo restrito?

Haverá acordo para não submeter o Brasil e o nosso povo ao perverso modelito da austeridade praticada por governos estadunidense, europeus e de outras plagas? O PSDB bancou e implementou as privatizações nos anos 90. Lula brecou esse ciclo neoliberal a partir de 2003. Quem vai concordar com quem nesse ponto?

Haverá acordo em que o Brasil deve prosseguir a marcha progressista para barrar e superar as imposições unilaterais do Império estadunidense, que segue manipulando a OTAN e países europeus, falindo Estados, invadindo, bombardeando e saqueando petróleo, minério e gás? OU seja: concordará o PSDB com a continuidade da unidade de ação dos BRICs (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul), com seu inovador Banco de Desenvolvimento alternativo ao FMI e Banco Mundial?

E quanto ao petróleo brasileiro? Haverá acordo em manter a avançada lei do sistema de partilha, que reforça a soberania brasileira sobre a sua principal riqueza?

E o piso salarial dos/as professore/as? O PSDB vai passar a apoiá-lo?

A gravidade da situação exige uma repactuação ampla. É ilusão achar que apenas o PT conseguirá resolver o imbróglio político/social/econômico sozinho, ou que apenas com uma pauta mais à esquerda, como defendem certas correntes, será possível mobilizar e por em atividade a ampla massa de 54 milhões de brasileiros/as que reelegeram Dilma há pouco, e reconquistar expressivo eleitorado perdido nas eleições de 2010 e 2014.

Para vencer o imenso desafio da hora, o pacto tem que ser apoiado por amplo, amplíssimo, leque, envolver partidos da esquerda ao centro (olha o PMDB aí, com papel fundamental), quiçá até do centro-direita. E só partidos não bastam. É necessária a participação de entidades do movimento social, lideranças sindicais de trabalhadores e empresariais, religiosas, etc.

Nesse quadro de aguda disjuntiva, avalio como improvável, quem sabe, impossível mesmo, que PT e PSDB se unam em um projeto de unidade política mais ampla, apesar do louvável posicionamento do governador Marconi expresso dia 19 passado.

Da história, nunca devemos esquecer: um ano após decretar a abolição da escravatura, as classes dominantes da época (coronéis e seus latifúndios, comerciantes) retiraram o apoio à Monarquia, o que permitiu o surgimento relativamente tranquilo da República.

Getúlio sofreu um golpe e optou pelo suicídio em 1954, logo após o decreto de elevação do salário-mínimo para os trabalhadores.

Jango sofreu o golpe militar não porque era comunista - e não era mesmo - mas por propor reformas de base, ou seja estava disposto a experimentar políticas de desconcentração de renda nesse Brasil que ainda hoje é uma das sociedades mais desiguais entre as maiores economias do mundo.

No século passado, tinha era a UDN, que não tinha nenhum pudor em apelar para o golpe de Estado quando perdia eleições.  
Corrupção era o mote para os golpes, mesma bandeira hoje seletivamente difundida pelo cartel midiático, que bombardeia, diariamente, o PT como se fosse o inventor das corrupções na Petrobras, mas esconde que o cartel de empreiteiras banca esquemas de corrupção desde os tempos do governo FHC, como tentou divulgar Elio Gaspari em 1998. 

Toda corrupção deve ser investigada e punida, sem ser transformada em bandeira política de agitação, não pode ser usada como arma apontada apenas para o adversário político, porque aí se resvala para o falso moralismo apregoado pela UDN de 45/65.

As políticas econômicas e sociais que Lula e Dilma implementaram desde 2003 resultaram em incipiente democratização econômica na sociedade brasileira, e é isso, fundamentalmente, que provoca reações das elites econômicas pela volta ao status quo ante: a concentração de renda.

É como se dizia lá em Uruaçu no século passado: rapadura é doce, mas não é mole não!

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