8 de Março de 2015 - 12h50
O 8 de março, Dia Internacional da Mulher, é uma data marcada pelas mobilizações e luta das mulheres por conquistas e mais direitos. Nas últimas décadas as mulheres garantiram avanços importantes ampliando a sua participação na política, no mercado de trabalho, no sindicalismo e na economia.
Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
Portal Vermelho - Os meios de comunicação, principalmente, tentam tratar o 8 de março como uma data comemorativa e até mesmo comercial. Qual é a importância dessa data?
Lúcia Rincón - O sentido que o 8 de março tem é o de lembrarmos que é preciso continuar combatendo a desigualdade. Nós avançamos muito naquilo que mais escandaliza os seres humanos, homens e mulheres, que é a violência que usa da submissão, da subalternidade. O marco dela é a Lei Maria da Penha. Nesta semana tivemos um outro grande marco na legislação brasileira que é a aprovação do feminicídio que passa a ser incluído no código penal.
Chegamos ao 8 de março de 2015, com uma bagagem de avanços e conquistas na emancipação das mulheres e da sociedade, mas ainda com muita luta e uma agenda importante pela frente.
Como parte de um retrocesso que estamos vivendo de caráter mundial, vemos um crescimento, uma onda de radicalismos em todos os espaços. E como a presença da mulher na sociedade enfrenta diretamente dois grandes sistemas, que é o capitalismo e o patriarcado, essas forças tentam retomar preceitos antigos que mantém a mulher sem visibilidade, na subalternidade. Nos grandes meios de comunicação há uma propaganda que tenta ignorar e subestimar os avanços para retomar práticas de opressão.
A emancipação da sociedade interessa à democracia porque historicamente e milenarmente, apenas nos períodos democráticos é que a sociedade avançou no reconhecimento daquilo que é de humano. Em contemplar e levar em consideração não apenas os interesses de uma minoria, de uma classe social, no sentido de acumular bens e submeter outras pessoas ao seu julgo. Apenas a democracia nos garante os espaços para discutir a igualdade e avanços pela humanização das relações sociais existentes.
Esse enfrentamento ao retrocesso precisa ser feito, não somente com as conquistas daquilo que é particular das mulheres que nos foi negado, como por exemplo o direito ao voto e voz, mas significa enfrentar também as grandes forças da reação que usam isso como mais um instrumento. Ou seja, precisamos enxergar que essa luta também está no bojo do conjunto da luta da sociedade.
Portanto, é preciso fazer o enfretamento ao retrocesso para que possamos avançar de forma democrática. Fazer o enfrentamento cotidiano e não se calar diante da injustiça e da opressão.
Vermelho - Diante disso, quais são as principais reivindicações das mulheres?
Lúcia Rincón - Nesse momento o que a democracia brasileira exige de imediato é a reformulação do sistema político. Na conjuntura atual isso se materializa na campanha pela reforma política democrática. Para as mulheres é preciso assegurar a paridade de gênero.
Vermelho - Então, a reforma política também traz benefícios para as mulheres...
Lúcia Rincón - Sim, desde que seja democrática e que leve em consideração determinados mecanismos, como a lista alternada, um homem e uma mulher, o que fortalece a democracia no sentido de comtemplar uma diversidade maior de pessoas. Mas também, e principalmente, no que diz respeito ao financiamento público de campanha. As mulheres têm mais dificuldades de acessar os bens, os financiamentos devido ao próprio alijamento do espaço público. Portanto, com o financiamento público de campanha nós teremos um acesso melhor.
A reforma política tem que garantir a governabilidade de uma democracia. O fortalecimento da democracia direta é o ponto que devemos garantir de imediato. No Brasil, a polarização que estamos vivendo e o fato de alguns setores da sociedade insistirem em manter um ponto de crise e ameaçar golpes precisa ser enfrentado. Nossa democracia é jovem e precisa do posicionamento de homens e mulheres firmes para construir uma sociedade igualitária. E, nesse sentido, nós precisamos garantir o resultado da eleição e garantir a governabilidade da presidenta Dilma Rousseff, enfrentando o debate democrático e a divergências de ideias e nas ruas. Ir para o embate dizendo que o processo democrático é uma conquista do povo brasileiro e deve ser mantido respeitando as diferenças, mas também que seja governando para uma maioria que assegure uma sociedade justa e igualitária.
Vermelho - A luta da mulher pela igualdade é histórica. Alguns dizem que a mulher já garantiu o seu espaço e, portanto, a igualdade é uma reivindicação ultrapassada. Como avalia?
Lúcia Rincón - Dois grandes fatos desmascaram esse discurso de que a mulher já conquistou a igualdade. Um deles é o percentual da nossa presença no parlamento que é de 9%. Apesar de sermos maioria na sociedade somos apenas 9% nos postos de poder dessa sociedade.
Outro fato que desmonta essa concepção divulgada pela mídia de que nós já conquistamos tudo foram as declarações das artistas que ganharam o Oscar. Elas reivindicaram a igualdade de salários. No mundo do trabalho, a acumulação e a centralização do capital ainda exigem a subordinação e a exploração das mulheres num patamar que ainda não nos libertamos, seja no Brasil ou no restante do mundo. Ainda fazemos parte do chamado exército industrial de reserva e os dogmas que afirmam que a mulher precisa cuidar da família, a mulher precisa ficar num espaço privado, servem para manter esse processo de exploração.
Precisamos estar alertas das implicações e ir às bases do capital e combater cotidianamente a força do patriarcado. É uma luta permanente que o 8 de março precisa nos lembrar. Lembrar que nós melhoramos, pois já temos a chave da casa. Mas ainda temos hora para chegar.
Vermelho - A maior demonstração disso é a violência contra a mulher?
Lúcia Roncón - A violência contra a mulher acontece de várias formas, mas particularmente, no espaço privado em que um grande percentual de mulheres assassinadas foi vítima dos seres que elas amaram e confiaram. Não existe nada mais dramático do que isso.
Essa violência também se manifesta na falta de políticas públicas, na falta de atendimento à saúde diferenciado, na falta do respeito à sexualidade das mulheres e a apropriação do seu corpo no sentido de garantir a sua identidade e o seu prazer, a sua existência. Penso que a violência é cometida cotidianamente no momento em que as pessoas não reconhecem a igualdade de possibilidades e oportunidades do conjunto dos seres humanos.
Essa é uma questão cultural. Vemos se proliferar discursos em apologia ao estupro, como foi o caso do deputado Jair Bolsonaro e, mais recentemente, os comentários do ator Alexandre Frota. Situações que provocam certa perplexidade....
A cultura, a mídia e seus interesses dificultam transformar as conquistas e leis em direito concreto. Nós, feministas, nunca achávamos que estava superado. Temos consciência que não está superado, mas não vamos desanimar porque o processo é histórico de transformação da cultura.
Recentemente foram encontradas mulheres usando sinto de castidades que eram da Idade Média, e aquela sociedade não julgava isso natural? A força dessa estrutura precisa ser bombardeada cotidianamente porque para essa sociedade o que interessa é a subordinação.
Nós, feministas, trabalhamos cotidianamente, por exemplo, para que a gente consiga uma mídia democrática. Com acesso e políticas públicas que impeçam a propagação desse tipo de apologia. É preciso combater, criminalizar e dizer que estupro é uma violência, seja de homens ou mulheres. Estupro é um desrespeito as pessoas enquanto seres humanos.
A nossa ação política é de combate aos alexandres frotas da vida, aos apresentadores como Rafinha Bastos, do programa “Agora é tarde”, que tem um histórico de bullying com a existência das mulheres.
Nossa luta é para criar plataformas de uma sociedade nova que respeite os seres humanos e os coloque em primeiro lugar, acima dos posicionamentos individualizados, mas sem esquecer que somos indivíduos. O movimento feminista comemora os grandes avanços visando a emancipação das mulheres e de toda a sociedade. Emancipação significa sair das amarras do capital vinculado às políticas financistas e construir novas relações sociais.
Vermelho - Nessa luta pela emancipação e avanço da democracia, a UBM anunciou por meio de nota, que vai participar do ato marcado para o dia 13 de Março. Por quê?
Lúcia Rincón - A UBM estará nas ruas ao lado de todas as entidades brasileiras e reconhece o valor da democracia conquistada. Somos solidárias com o povo brasileiro e as pessoas que constroem a sociedade visando tirar povo da miséria, garantido escola para todos e políticas que significam avanços para a humanidade. Nós estaremos em todas as cidades, empunhando nossas bandeiras vermelhas, rosas, lilases para dizer que é preciso garantir ao povo brasileiro a manutenção de uma conquista tão árdua, que teve tanto mártires para que hoje pudéssemos ter uma sociedade, de fato, democrática, onde a divergência não significa golpe de Estado.
Somos pela legitimidade do governo que venceu nas urnas. É preciso que os brasileiros saibam viver em democracia. Essa é a defesa que vamos fazer. Defesa da legalidade, da Petrobras e do governo Dilma, que foi eleito legitimamente pelo povo brasileiro.
Lúcia Rincón: Garantir uma reforma política democrática é o desafio
O 8 de março, Dia Internacional da Mulher, é uma data marcada pelas mobilizações e luta das mulheres por conquistas e mais direitos. Nas últimas décadas as mulheres garantiram avanços importantes ampliando a sua participação na política, no mercado de trabalho, no sindicalismo e na economia.
Por Dayane Santos, da redação do Portal Vermelho
Arquivo pessoal
Garantiu também avanços na legislação, principalmente contra a violência à mulher, tendo como grande marco a Lei Maria da Penha. “Mas os desafios são muitos”, afirmou a presidenta da União Brasileira de Mulheres (UBM), Lúcia Rincón, em entrevista ao Portal Vermelho.A presidenta da União Brasileira de Mulheres, Lúcia Rincón, destaca as conquistas e desafios da mulher
Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
Portal Vermelho - Os meios de comunicação, principalmente, tentam tratar o 8 de março como uma data comemorativa e até mesmo comercial. Qual é a importância dessa data?
Lúcia Rincón - O sentido que o 8 de março tem é o de lembrarmos que é preciso continuar combatendo a desigualdade. Nós avançamos muito naquilo que mais escandaliza os seres humanos, homens e mulheres, que é a violência que usa da submissão, da subalternidade. O marco dela é a Lei Maria da Penha. Nesta semana tivemos um outro grande marco na legislação brasileira que é a aprovação do feminicídio que passa a ser incluído no código penal.
Chegamos ao 8 de março de 2015, com uma bagagem de avanços e conquistas na emancipação das mulheres e da sociedade, mas ainda com muita luta e uma agenda importante pela frente.
Como parte de um retrocesso que estamos vivendo de caráter mundial, vemos um crescimento, uma onda de radicalismos em todos os espaços. E como a presença da mulher na sociedade enfrenta diretamente dois grandes sistemas, que é o capitalismo e o patriarcado, essas forças tentam retomar preceitos antigos que mantém a mulher sem visibilidade, na subalternidade. Nos grandes meios de comunicação há uma propaganda que tenta ignorar e subestimar os avanços para retomar práticas de opressão.
A emancipação da sociedade interessa à democracia porque historicamente e milenarmente, apenas nos períodos democráticos é que a sociedade avançou no reconhecimento daquilo que é de humano. Em contemplar e levar em consideração não apenas os interesses de uma minoria, de uma classe social, no sentido de acumular bens e submeter outras pessoas ao seu julgo. Apenas a democracia nos garante os espaços para discutir a igualdade e avanços pela humanização das relações sociais existentes.
Esse enfrentamento ao retrocesso precisa ser feito, não somente com as conquistas daquilo que é particular das mulheres que nos foi negado, como por exemplo o direito ao voto e voz, mas significa enfrentar também as grandes forças da reação que usam isso como mais um instrumento. Ou seja, precisamos enxergar que essa luta também está no bojo do conjunto da luta da sociedade.
Portanto, é preciso fazer o enfretamento ao retrocesso para que possamos avançar de forma democrática. Fazer o enfrentamento cotidiano e não se calar diante da injustiça e da opressão.
Vermelho - Diante disso, quais são as principais reivindicações das mulheres?
Lúcia Rincón - Nesse momento o que a democracia brasileira exige de imediato é a reformulação do sistema político. Na conjuntura atual isso se materializa na campanha pela reforma política democrática. Para as mulheres é preciso assegurar a paridade de gênero.
Vermelho - Então, a reforma política também traz benefícios para as mulheres...
Lúcia Rincón - Sim, desde que seja democrática e que leve em consideração determinados mecanismos, como a lista alternada, um homem e uma mulher, o que fortalece a democracia no sentido de comtemplar uma diversidade maior de pessoas. Mas também, e principalmente, no que diz respeito ao financiamento público de campanha. As mulheres têm mais dificuldades de acessar os bens, os financiamentos devido ao próprio alijamento do espaço público. Portanto, com o financiamento público de campanha nós teremos um acesso melhor.
A reforma política tem que garantir a governabilidade de uma democracia. O fortalecimento da democracia direta é o ponto que devemos garantir de imediato. No Brasil, a polarização que estamos vivendo e o fato de alguns setores da sociedade insistirem em manter um ponto de crise e ameaçar golpes precisa ser enfrentado. Nossa democracia é jovem e precisa do posicionamento de homens e mulheres firmes para construir uma sociedade igualitária. E, nesse sentido, nós precisamos garantir o resultado da eleição e garantir a governabilidade da presidenta Dilma Rousseff, enfrentando o debate democrático e a divergências de ideias e nas ruas. Ir para o embate dizendo que o processo democrático é uma conquista do povo brasileiro e deve ser mantido respeitando as diferenças, mas também que seja governando para uma maioria que assegure uma sociedade justa e igualitária.
Vermelho - A luta da mulher pela igualdade é histórica. Alguns dizem que a mulher já garantiu o seu espaço e, portanto, a igualdade é uma reivindicação ultrapassada. Como avalia?
Lúcia Rincón - Dois grandes fatos desmascaram esse discurso de que a mulher já conquistou a igualdade. Um deles é o percentual da nossa presença no parlamento que é de 9%. Apesar de sermos maioria na sociedade somos apenas 9% nos postos de poder dessa sociedade.
Outro fato que desmonta essa concepção divulgada pela mídia de que nós já conquistamos tudo foram as declarações das artistas que ganharam o Oscar. Elas reivindicaram a igualdade de salários. No mundo do trabalho, a acumulação e a centralização do capital ainda exigem a subordinação e a exploração das mulheres num patamar que ainda não nos libertamos, seja no Brasil ou no restante do mundo. Ainda fazemos parte do chamado exército industrial de reserva e os dogmas que afirmam que a mulher precisa cuidar da família, a mulher precisa ficar num espaço privado, servem para manter esse processo de exploração.
Precisamos estar alertas das implicações e ir às bases do capital e combater cotidianamente a força do patriarcado. É uma luta permanente que o 8 de março precisa nos lembrar. Lembrar que nós melhoramos, pois já temos a chave da casa. Mas ainda temos hora para chegar.
Vermelho - A maior demonstração disso é a violência contra a mulher?
Lúcia Roncón - A violência contra a mulher acontece de várias formas, mas particularmente, no espaço privado em que um grande percentual de mulheres assassinadas foi vítima dos seres que elas amaram e confiaram. Não existe nada mais dramático do que isso.
Essa violência também se manifesta na falta de políticas públicas, na falta de atendimento à saúde diferenciado, na falta do respeito à sexualidade das mulheres e a apropriação do seu corpo no sentido de garantir a sua identidade e o seu prazer, a sua existência. Penso que a violência é cometida cotidianamente no momento em que as pessoas não reconhecem a igualdade de possibilidades e oportunidades do conjunto dos seres humanos.
Essa é uma questão cultural. Vemos se proliferar discursos em apologia ao estupro, como foi o caso do deputado Jair Bolsonaro e, mais recentemente, os comentários do ator Alexandre Frota. Situações que provocam certa perplexidade....
A cultura, a mídia e seus interesses dificultam transformar as conquistas e leis em direito concreto. Nós, feministas, nunca achávamos que estava superado. Temos consciência que não está superado, mas não vamos desanimar porque o processo é histórico de transformação da cultura.
Recentemente foram encontradas mulheres usando sinto de castidades que eram da Idade Média, e aquela sociedade não julgava isso natural? A força dessa estrutura precisa ser bombardeada cotidianamente porque para essa sociedade o que interessa é a subordinação.
Nós, feministas, trabalhamos cotidianamente, por exemplo, para que a gente consiga uma mídia democrática. Com acesso e políticas públicas que impeçam a propagação desse tipo de apologia. É preciso combater, criminalizar e dizer que estupro é uma violência, seja de homens ou mulheres. Estupro é um desrespeito as pessoas enquanto seres humanos.
A nossa ação política é de combate aos alexandres frotas da vida, aos apresentadores como Rafinha Bastos, do programa “Agora é tarde”, que tem um histórico de bullying com a existência das mulheres.
Nossa luta é para criar plataformas de uma sociedade nova que respeite os seres humanos e os coloque em primeiro lugar, acima dos posicionamentos individualizados, mas sem esquecer que somos indivíduos. O movimento feminista comemora os grandes avanços visando a emancipação das mulheres e de toda a sociedade. Emancipação significa sair das amarras do capital vinculado às políticas financistas e construir novas relações sociais.
Vermelho - Nessa luta pela emancipação e avanço da democracia, a UBM anunciou por meio de nota, que vai participar do ato marcado para o dia 13 de Março. Por quê?
Lúcia Rincón - A UBM estará nas ruas ao lado de todas as entidades brasileiras e reconhece o valor da democracia conquistada. Somos solidárias com o povo brasileiro e as pessoas que constroem a sociedade visando tirar povo da miséria, garantido escola para todos e políticas que significam avanços para a humanidade. Nós estaremos em todas as cidades, empunhando nossas bandeiras vermelhas, rosas, lilases para dizer que é preciso garantir ao povo brasileiro a manutenção de uma conquista tão árdua, que teve tanto mártires para que hoje pudéssemos ter uma sociedade, de fato, democrática, onde a divergência não significa golpe de Estado.
Somos pela legitimidade do governo que venceu nas urnas. É preciso que os brasileiros saibam viver em democracia. Essa é a defesa que vamos fazer. Defesa da legalidade, da Petrobras e do governo Dilma, que foi eleito legitimamente pelo povo brasileiro.
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