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sexta-feira, 17 de julho de 2015

"Lava Jato", 'jornalismo zumbificado' e a psicologia da crise




14.07.2015 
Do Pravda em português






A questão verdadeira é se essas ações para paralisar o país, exacerbar uma diminuição no ritmo da atividade econômica, desencorajar investimentos externos diretos, levar à falência setores inteiros da economia, como construção e energia, gerando, no processo, nova onda de desemprego...

Doutrina do Choque aplicada ao Brasil - 

"Ninguém está questionando a corrupção institucional histórica nem a indignação ante a escala da corrupção e da ação desses cartéis até hoje, em 2015.

A questão verdadeira é se essas ações para paralisar o país, exacerbar uma diminuição no ritmo da atividade econômica, desencorajar investimentos externos diretos, levar à falência setores inteiros da economia, como construção e energia, gerando, no processo, nova onda de desemprego, poderiam de algum modo visar ao melhor interesse nacional, mais do que à promoção eleitoral de um determinado partido ou faixa específica do espectro político. (...)

O Departamento de Justiça dos EUA também está auxiliando a acusação na 'Operação Lava Jato' - o que já começa a levantar preocupações sobre intromissão na soberania nacional do Brasil."
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O Brasil está tendo um 2015 horrível; situação econômica bem menos favorável, inúmeros erros de avaliação política cometidos no início do primeiro mandato da presidenta Rousseff e escândalos sem fim que se seguiram à eleição de 2014, resultaram em dilúvio de manchetes, em casa e no exterior, todas declarando que "Brasil está em crise" ou, como em fevereiro na Time, que o Brasil estaria "À beira do abismo".

Contudo, para observadores experientes do Brasil, e no contexto da situação que se vê na Grécia, esse tipo de linguagem é sensacionalista e excessiva. 2015 será o pior ano de contração do PIB em 25 anos, mas é estatística que, sozinha, não chega nem perto de descrever a situação real. Será ano difícil para os trabalhadores brasileiros? Sim. Provavelmente, se verão retrocessos nos ganhos impressionantes que o Brasil obteve na sua luta contra a desigualdade e a fome? Alguns, sim, pequeno. O Brasil perderá o seu Grau de Investimento que tanto lhe custou obter? Talvez, dependendo de com quem se fala. Mas a questão realmente importante é: será que o governo brasileiro chegará de pires na mão para pedir ajuda ao FMI, tentando evitar o calote? Não.

Em 1991, o Brasil era a 9ª maior economia do mundo. Quando Fernando Henrique Cardoso deixou a presidência, o país já havia caído abaixo de Índia e México, para o 13º lugar. Hoje, é o 7º. Permaneceu por algum tempo no 6º lugar, durante a Crise Financeira Global, pela qual o Brasil foi dos países menos afetados, dentre outras razões, também por tem implantado regulações financeiras protetivas das quais, em 2007, a fraternidade dos Friedman-itas na revista Economistreclamara.

Em 2012, estudo do Federal Reserve examinou o quanto crises econômicas são com frequências profecias que se autocumprem, movidas por algum clima de incerteza alimentado pela imprensa-empresa.

"Há fundamentos tangíveis e muitas vezes dolorosos que determinam o rumo da economia - desemprego, taxas de juros, preços da moradia, inflação, produção industrial, dívida pública. Mas mais que qualquer outra coisa, mercados são psicologia, e uma atmosfera de pânico entre produtores e consumidores faz reduzir as compras, movimentos que acentua ainda mais qualquer retrocesso."

 

A grande mentira 

Brasil Wire tem escrito muito sobre o viés interno e a falta de pluralidade na paisagem da imprensa-empresa brasileira, material que está bem sintetizado numa matéria intitulada "Brasil, o país dos 30 Berlusconis" [ing. "Brazil, the country of 30 Berlusconis"]. A imprensa-empresa no Brasil, monoliticamente toda ela contra o governo do Partido dos Trabalhadores, tem alimentado gozosamente a histeria geral com a linguagem da crise - e o corpo de correspondentes estrangeiros aparece ainda mais gozosamente, puxando o cordão.

Vez ou outra, a televisão ao vivo oferece alguma surpresa. O ex-jornalista de esportes e apresentador de TV Faustão, apresenta hoje um dos programas mais populares da TV brasileira, puxador de audiência dos domingos à tarde na rede Globo. No final de junho, Faustão monologava sobre como o Brasil é país das crises, do desemprego, do desespero, quando pediu que sua convidada, atriz famosa, muito conhecida e respeitada Marieta Severo, falasse sobre esses 'problemas'. A atriz discordou de tudo, da posição pessimista de tantos do público audiente do Programa do Faustão, e explicou que, na opinião dela, a inclusão social é hoje maior do que jamais antes, que a percepção de "crises" é coisa subjetiva. Ainda mais surpreendentemente, houve muitos acenos de cabeça, de pessoas que concordavam com a atriz, no público normalmente robótico daquele programa; depois se soube que a atriz teria recebido ameaças por ter manifestado opiniões tão equilibradas pela televisão, em programa de domingo à tarde.

Quebrar o país, para quebrar o governo 

A atual situação pela qual o Brasil passa não é desconhecida para quem tenha lido A Doutrina do Choque - A Ascensão do Capitalismo de Desastre, de 2007, da autora Naomi Klein, que explica os mecanismos pelos quais políticos de direita, em colusão com aliados políticos dentro da imprensa-empresa, têm frequentemente tentado fabricar crises, como método para fazer avançar seus objetivos.

No livro, Klein comenta o caso do Chile, como exemplar para a América Latina, mas o Brasil também é caso exemplar, e anterior.

No início do golpe militar de 1964 no Brasil, que foi estimulado pelos EUA, houve vários exemplos de exacerbação deliberada de um ambiente político difícil, por forças reacionárias, para assim gerar pretexto para um golpe armado que se anunciaria para "salvar do caos", o Brasil.

Que o golpe de 1964 no Brasil tenha sido estimulado pelo governo dos EUA não é fantasia paranoide, e é fato já claramente demonstrado por documentos do Arquivo de Segurança Nacional dos EUA afinal tornados públicos, nem aquele caso marcou o fim da interferência dos EUA em assuntos internos do Brasil.

Dilma Rousseff não foi eleita nas presidenciais de 2014 - como insiste em repetir uma narrativa da imprensa-empresa zumbificada - por "mínima margem de votos": venceu por mais de 3,5 milhões de votos, porcentagem comparável à de Barack Obama contra Mitt Romney. Mas o mito se perpetua pela imprensa-empresa, de que Rousseff seria presidenta sem legitimidade, e que derrubá-la do governo seria alguma espécie de 'vitória da democracia' no Brasil. Houve também alegações previsíveis e sem qualquer base, de que teria havido fraude eletrônica, e 'comentaristas' a repetir que "amanhã, os mercados não serão generosos com o Brasil". Ninguém está questionando essa corrupção institucional histórica nem a indignação ante a escala da corrupção e da ação desses cartéis ainda em 2015. 

A questão verdadeira é se essas ações para paralisar o país, exacerbar uma diminuição no ritmo da atividade econômica, desencorajar investimentos externos diretos, levar à falência setores inteiros da economia, como construção e energia, gerando, no processo, nova onda de desemprego, poderiam de algum modo visar ao melhor interesse nacional, mais do que a um determinado partido ou faixa específica do espectro político.

Estão em ação tentativas para apresentar a Petrobras - que hoje alcança níveis recordes de produção - como empresa falida e sem salvação possível, que só a privatização poderia recuperar. Enquanto isso, a imprensa-empresa mostra o "juiz Moro" como alguma espécie de salvador da Petrobrás e do país - que os resgataria de uma histeria que a própria imprensa-empresa só fez fomentar ao longo dos últimos anos.

A imprensa-empresa quer que todos acreditemos que essa campanha anti-Brasil em curso hoje seria simplesmente "as instituições do Brasil afinal trabalhando como devem". Dora Cavalcanti, advogada que representa um dos gigantes da construção, a empresa Odebrecht, criticou publicamente as irregularidades em todo o processo e na tramitação do caso pelas estruturas judiciais no Brasil. O Departamento de Justiça dos EUA também está auxiliando a acusação na "Operação Lava Jato" - o que já começa a levantar preocupações sobre intromissão na soberania nacional do Brasil.

O medo é que todos os ganhos sociais obtidos durante a geração anterior sejam desconstruídos, se essa 'mudança de regime' alimentada pela doutrina do choque e capitalismo de desastre acontecer no Brasil. Amostra do que pode estar por vir já se vê agora, nas manobras que Eduardo Cunha está comandando no Congresso (que se pode comparar à paralisia que se estabeleceu entre a Câmara de Deputados de Newt Gingrich e o segundo mandato de Bill Clinton). Eduardo Cunha, que integra o bloco evangélico do Congresso brasileiro e tem longa história de acusações por corrupção, tem usado as fraquezas do Executivo, para forçar votações e discussões públicas sobre 'causas célebres' tipo redução da maioridade penal, financiamento privado de campanhas eleitorais e legislação de terceirização, que a esquerda define como "retrocessos".

O principal partido de oposição no Brasil, o PSDB, recolheu-se para um jogo de espera, em vez de apresentar qualquer tipo de ideia ou políticas de aprimoramento político ou social, itens que muitos brasileiros, com muita razão, procuram e gostariam de poder discutir. Já não parece haver dúvidas de que o Partido dos Trabalhadores deixou-se tomar por uma espécie de 'fadiga de governo'. Desde a eleição, a máquina do partido deixou-se enrolar em infindáveis discussões internas sobre o que o partido deveria fazer para retomar a representatividade que perdeu, aos olhos da classe trabalhadora, classes médias letradas e movimentos sociais de base.

Uma das hipóteses é que se, como muitos economistas preveem, 2016-17 vir uma retomada do Brasil na direção de melhores perspectivas econômicas (o FMI prevê aumentos no PIB de +1,1% para 2016, e de +2,0% para 2017), se fechará a janela de oportunidade com vistas ao golpe midiático, judicial e parlamentar em curso hoje para derrubar Rousseff e o PT do governo, embora não sem resistência (ing., port.). Mas a direita brasileira ultrapassa linhas partidárias como DEM, PP, PSDB e PMDB e não quer apenas derrubar a presidente Rousseff: querem a total extinção do Partido dos Trabalhadores como força política. 

Êxodo

O Brasil conhece bem o êxodo de jovens e ricos. Desde o restabelecimento da democracia em 1989, em vários momentos, como 1994, 1999, 2001, houve êxodo de cérebros para o Hemisfério Norte, em momentos de crise de segurança econômica ou de inflação. O medo de inflação rampante e imprevisível é ainda o principal medo dos que tenham idade suficiente para lembrar dos anos 1990s.

É estranho que o sonho de jovens educados de classe média seja deixar o país, quando, depois de um curto período de otimismo, tudo mudos nos últimos dois anos, com a volta dos velhos medos econômicos. Quanto desse medo é racional? Quanto é induzido pela imprensa-empresa? A crise não é econômica - não, pelo menos, até agora.  A crise é institucional e política.


É preciso questionar a ética por trás da propaganda de imagens falsificadas de um estado em colapso. Que efeito tem isso em termos psicológicos sobre a população?


Entre a classe média superior que fala inglês, não se deve subestimar o efeito da mídia estrangeira - à qual se tem acesso hoje pelas redes sociais - sobre a psicologia do país e sua autoimagem.Complexo de Vira Lata pode ser expressão já desgastada pelo uso, mas o 'viralatismo' que ela descreve é fenômeno genuíno e muito disseminado. Agências de Marketing até identificam o complexo como característica alvo para compradores do que as agências vendam, como brandsestrangeiras [ou apresentadas em ingês (NTs)].

Os megaeventos da Copa de Mundo de futebol de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016, quando o Brasil obteve o direito de hospedá-los, foram divulgados como se "o país do futuro" afinal tivesse 'chegado lá'. Embora trazendo também preocupações éticas e econômicas bem documentadas, esses eventos também serviram como plataformas de mídia, para veículos estrangeiros alimentarem imagens sensacionalistas de caos, para leitores habituados a material que só faz reafirmar a superioridade pós-colonial deles mesmos. Independente de contexto sociopolítico, o material é familiar: estereótipos de miséria, crimes, violência, corrupção sempre "abaixo do Rio Grande", com eventuais rápidas exibições de inocentes belezas naturais.

Há três principais linhas de propaganda anti-Brasil sempre presentes em toda a cobertura em língua inglesa (também, em alguma medida, em inglês europeu). 

- Uma é a questão da degradação ambiental, que insiste que o Brasil deve ser proibido de desenvolver-se, tropo que nada tem de novo e persiste já há décadas. 

- Outra é o 'problema' da "economia fechada" do Brasil (que nunca deixa de fazer referência à propriedade majoritariamente estatal da Petrobrás). 

- A terceira, é o Brasil moderno sempre retratado como "estado fracassado".

Exemplo de como a narrativa editorial desse "estado fracassado" é levada à opinião pública pode ser visto no modo como o racionamento de água em São Paulo foi noticiado, sobretudo se comparada essa cobertura e a cobertura dos eventos na Califórnia, onde a situação é muito mais grave. A chuva continuada e em alguns meses maior que a média de novembro a abril foi completamente ignorada; foi ignorado também o detalhe crucial de que apenas 5% da água é direcionada para o consumo doméstico - cerca de 40% de toda a água do Estado de São Paulo é consumida só na indústria de produção do Etanol. Não se fala disso. A explicação oferecida é que "Brasileiros tomam banho demais".

Todos os projetos & soluções em andamento para aliviar a carência de água foram consideradas 'pouco interessantes' para os leitores e telespectadores. Muito mais atraente, em termos editorais, foi a possibilidade de fim do mundo, por falta d'água, à maneira de filme de Mad Max.

Em fevereiro de 2015, Ian Bremmer do Eurasia Group publicou essa matéria espantosa na revistaTime, que circulou pelas mídia tradicionais e sociais, antes dos protestos da direita contra o governo, como 'prova' de que uma 'revista conceituada' da 'imprensa estrangeira' já sabia que o país estaria caindo aos pedaços. Não satisfeito, o mesmo Bremmer publicou nova loucurada aindamais ridícula, para 'comprovar' o que ele mesmo escrevera, como se o 'endosso' comprovasse a validade do artigo.

Junho

Além do momento de economia mais lenta, a atual 'crise' começou a ser percebida, gostem ou não, em junho de 2013, quando o governo da presidenta Dilma Rousseff, que então alcançava 79% de aprovação, passou repentinamente a ser alvo de movimentos de rua, para manifestar a 'insatisfação' popular, que levou quase um milhão de pessoas às ruas - embora motivado pela provocação feita pela polícia militar do estado de São Paulo, que atacara com violência um pequeno protesto acontecido antes.

Depois daquela manifestação de brutalidade, quando uma jornalista quase perdeu um olho, atingida por uma bala de borracha, houve uma grande manifestação em São Paulo, com bem poucas evidências de qualquer sentimento Anti-Rousseff ou Anti-PT. O que realmente se via era uma espécie de insatisfação geral e difusa, contra o 'sistema político', 'os políticos' e os serviços públicos. Nessa noite monumental, o noticioso Globo News exibiu repetidas vezes cenas de uns poucos milhares de pessoas que escalaram a cobertura do prédio do Congresso em Brasília, com subtexto bem claro.

Atacado pela direita e pela esquerda, o Partido dos Trabalhadores parecia nesse período ter perdido o controle do pacto social que o mantivera no poder, até ali, por três mandatos presidenciais.

Resultado disso foi um PT intimidado, eleição presidencial mais disputada do que se teria previsto um ano antes, eleição do Congresso mais conservador desde 1968 e esse golpe midiático, judicial e parlamentar paralisante. Resultados que seriam as últimas coisas que os manifestantes originais teriam desejado ou previsto ou esperado.

Soube recentemente que grupos de direita e explicitamente antigoverno, com os "Vem Pra Rua" &MBL, que foram formados em junho de 2013, imediatamente depois dos protestos e no momento em que o movimento original se recolhia, fizeram sua 'participação' com apoio e suporte financeiro de ONGs com sede fora do Brasil e instituições de ensino também com sede fora do Brasil. Essas organizações continuaram sua campanha, mantida com bilhões de organizações dos EUA a tentar mudar a opinião pública jovem no Brasil em relação à privatização da saúde e da educação públicas, para pôr fim aos programas de bem-estar social, pró desregulação das finanças e outros temas 'correlatos'. Recentemente, representantes do MBL estiveram com Eduardo Cunha em Brasília para apresentar uma petição para o impeachment (ilegal) da presidenta.

Analisado de hoje, aquele quadro de junho de 2013, o que se vê é que a esquerda brasileira deixou-se efetivamente enganar e realmente entregou o que a direita esperava: o enfraquecimento da presidenta Rousseff e do PT.

Um golpe muito 'à brasileira' 

Para observador externo, é golpe vasto de mais para ser visto por inteiro e complicado demais para ser compreendido. Matéria publicada na Folha de S.Paulo (ing.) fala em 'tomada do poder', outros falam de clusterfuck [lit. "fodeu-total"], mas pode-se usar a palavra "golpe"? Sim se pode. Em 2015, o conceito de "golpe" já há muito tempo deixou de exigir a presença de tanques nas ruas.

Contra uma muralha de silêncio na imprensa-empresa estrangeira, movimentos sociais e partidos da coalizão lançaram declarações antigolpe nos últimos dias. Se não basta para provocar preocupação internacional, o que estaria faltando? 

Rousseff como se sabe foi mantida prisioneira e torturada durante três anos durante a ditadura que foi ativamente assistida e apoiada pelos EUA, especialmente durante os mandatos de Kissinger ("E essa semana os dois se encontraram"), e o poder dominante naqueles anos de ditadura permanece vivo sob várias formas no Brasil, mas especialmente no Senado.

Por todo o continente há esforços recentes bem documentados, alguns bem-sucedidos, para derrubar governo eleitos, no Paraguai, no Equador, na Bolívia e, claro, na Venezuela, em todos os casos usando uma combinação de distorção 'jornalística' e protestos de rua induzidos por empresas-de-mídia ("imprensa-empresas"), combinados com jogadas parlamentares e dos corpos jurídicos. No caso do Paraguai, há comunicação documentada em telegramas do Departamento de Estado divulgados por Wikileaks, que comprovam que os EUA sabiam do, e sugerem conivência noimpeachment de Fernando Lugo - e desde o momento em que foi eleito. Uma das ideias que circulam é que a ação contra Lugo estava relacionada a interesses do petróleo no Paraguai; outras motivações que estariam por trás da derrubada de Lugo incluem tornar possível um veto contra a entrada da Venezuela, como membro pleno, do Mercosul. Mas o Paraguai acabou suspenso do Mercosul depois do golpe, e foi impedido de exercer tal veto.

modus operandi em toda a América Latina é em grande medida semelhante, mas o Brasil é vasto e diverso, e qualquer tentativa de desestabilização, seja iniciada por elites locais, interesses de fora ou alguma combinação das duas coisas, como quase sempre é o caso, terá sempre de acontecer em muitas frentes, sem garantias de sucesso. Há quem diga, erradamente, que 2013 teria sido um golpe malsucedido, mas os esforços dos então golpistas nunca pararam. Uma estratégia de Guerra de 4ª Geração observada em outros países latino-americanos como a Bolívia, inclui o longo jogo de destruir bases sociais e movimentos de base que possam apoiar partidos que não favoreçam interesses norte-americanos. O registro de popularidade da presidenta Rousseff, que era recorde, de79% em maio 2013, hoje está 10%. Mas mesmo esse número tem de ser examinado com atenção - parte considerável da insatisfação com Rousseff advém do que parece ser inabilidade para administrar as forças de direita, que agora tentam sequestrar o poder.

Como esse jornalista escreve, o principal motivo de preocupação dos eleitores brasileiros, e tema que afeta a popularidade de qualquer presidente, são os empregos, os aumentos de impostos e a inflação. 2015 está sendo ano ruim nesses três quesitos, o que sempre fará aumentar a impopularidade de qualquer governante.

Internamente, Roberto Amaral, ex-presidente dos socialistas, escreveu em março, que o golpe já acontecera - a partir do momento em que Eduardo Cunha assumiu a liderança do Congresso. A hipótese de Amaral é que o país seria hoje governado por Cunha, pelo procurador no processo da "Operação Lava Jato" Sergio Moro, por Renan Calheiros, presidente do Senado, pelo juiz Gilmar Mendes da Suprema Corte e pela Globo TV, cujo âncora William Waack aparece citado nos telegramas do Departamento de Estado como homem a serviço, provavelmente, dos EUA.

O PSDB, tido como principal partido da oposição divulgou documento em que diz que não apoia qualquer golpe ou impeachment - mas não há dúvida de que estão prontos a saltar para o bote golpista, se se criar um vácuo de poder. Como partido preferido da imprensa-empresa brasileira, e dos EUA e aliados, a volta ao poder dos políticos do PSDB seria resultado mais provável no caso de colapso do Partido dos Trabalhadores. E nem é preciso repetir, porque é muito claro para todos, que nenhum golpe para derrubada (ilegal) de governo democraticamente eleito na América do Sul - muito menos num país de território gigante, como o Brasil - seria jamais tentado sem a garantia prévia de que os EUA reconheceriam qualquer governo que nascesse do golpe. 

Em 1998, documentos que permanecem secretos referiam-se a um esquema norte-americano para ajudar a garantir resultados eleitorais favoráveis. Revelações recentes de Wikileaks mostram que a Agência de Segurança Nacional dos EUA mantêm escutas clandestinas nas comunicações de várias figuras chaves responsáveis por assuntos da economia do Brasil. 

No mundo profissional dos cara-de-pôquer da diplomacia dos EUA, a atual embaixadora Liliana Ayelde, apesar de ter sido expulsa da Bolívia sob acusações de envolvimento em ações para desestabilizar o governo, e de estar no Paraguai como embaixadora durante o golpe que derrubou Fernando Lugo, nem por isso é uma Victoria Nuland.

No momento em que esse artigo está sendo escrito o senador José Serra, do PSDB, que há muito tempo negocia por trás das cortinas com empresas estrangeiras de petróleo e com o Departamento de Estado sobre a abertura dos campos de petróleo do pré-sal brasileiro, atualmente controlados pela Petrobras, está tentando fazer passar pelo Senado a correspondente legislação nesse sentido.

Além do "Nacionalismo dos recursos" [orig.  "Resource Nationalism"], a baixa receptividade aos controversos novos tratados comerciais, a emergência dos países BRICS e seu banco de desenvolvimento que fará concorrência ao Banco Mundial e ao FMI, e a consolidação, que amplia a integração regional, do bloco do Mercosul, são preocupações conhecidas e bem documentadas doDepartamento de Estado dos EUA sobre o Brasil. Essa informação disponível e de livre acesso para todos, é infelizmente alvo de censura editorial e/ou de autocensura nas empresas-imprensa - e desde antes de todos sabermos das atividades de organizações norte-americanas como a Associação Interamericana de Imprensa (ing. IAPA).

Para coincidir com a recente visita da presidenta Rousseff aos EUA, Brasil Wire publicou matérias sobre um conjunto de conflitos que têm de ser resolvidos, para que os dois países construam parceria legítima, entre iguais. Simultaneamente, a revista Foreign Policy que pertence ao grupo doWashington Post publicou matéria sob o título "Por que o Brasil não engolirá a isca com que Dilma o tenta", comentando como fato consumado a derrubada de Rousseff  (Outros artigos anteriores, da mesma FP [esse artigo mais antigo, e esses dois artigos] sobre a eleição da presidenta Rousseff em 2010, já manifestavam sentimentos semelhantes). Mais matérias semelhantes foram publicadas pela Reuters, cujo diretor de sucursal (e ghostwritter de Fernando Henrique Cardoso), deixou recentemente o Brasil, depois do escândalo do #PodemosTirarSeAcharMelhor - que sugeria viés pró-oposição. E também o canal Bloomberg, financiado pela [corretora] Terminal e dedicado a agitar mercados, juntou sua voz a esse mesmo coro de 'inevitabilidade'.

Definir uma crise 

Se se olha além dos dados crus da economia, o Brasil tem sido muito bem-sucedido nos últimos 12 anos, gerando estatísticas que realmente contam mais, a saber, as que têm a ver com a vida diária real das pessoas. Por mais que especialistas midiáticos ativos na imprensa financeira anglo-saxônica frequentemente acusem o governo do Partido dos Trabalhadores de estar "desperdiçando os ganhos do boom das commodities", a verdade é que o Brasil usou um clima econômico global favorável para atender questões importantes e realmente prioritárias, como pagar sua dívida internacional; erradicar a fome; construir um programa de transferência básica de renda para um programa de bem-estar; e aumentos massivos nos gastos em educação e saúde. Em 2005,  o Brasil disse ao FMI que não mais precisaria de empréstimos, e pagou o que devia, servindo-se de reservas acumuladas. Desde então, o Brasil acumulou uma das maiores reservas mundiais de dólares - US$375bn, dez vezes superior ao que tinha na década passada - e mantém a posição de 3º maior possuidor de papéis da dívida externa dos EUA, com mais de $320bn.

O Brasil é também país de território enorme, e, se o crescimento do PIB de estados tradicionalmente ricos como SP estão andando para trás, vê-se uma história de vasto sucesso comparativo do imenso norte do país, cujo PIB cresceu até 8%. Mais importante que isso, o crescimento que se espalhou demograficamente resultou em crescimento a níveis chineses para os mais brasileiros mais pobres - com a camada mais alta da pirâmide, dos mais ricos, não ultrapassando pobres índices alemães de crescimento. 

O Brasil é o único país dentre as grandes economias emergentes de mercado que conseguiu combinar crescimento e redução da desigualdade. Nada, até esse momento, indica qualquer tipo de reversão cíclica que altere essa tendência, mas o Brasil tem de manter-se atento, porque a estagnação é um risco; e reconstruir a confiança do país é vitalmente necessário.

O professor Fernando Luz Lara, que vive nos EUA, escreveu para Brasil Wire sobre coeficientes GINI convergentes que medem trajetórias opostas da desigualdade (a) no Brasil e (b) nos EUA - leitura muito indigesta para os que, ganham a vida a tentar ignorar o fracasso da economia neoliberal, que jamais entregou o que prometeu à maioria das populações.

O Brasil já passou por tempos piores. E conhecerá tempos melhores. *****

 

8/7/2015, Brasil Wire, Londres, Reino Unido (dica de Oriente Mídia, pelo Twitter)

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quarta-feira, 15 de julho de 2015

O factoide das “Pedaladas Fiscais”

Muvuca Popular

15/07/2015


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Inconformados ante a quarta vitória consecutiva do povo brasileiro, materializada com a reeleição da presidenta Dilma, setores golpistas da oposição, sob o comando do candidato derrotado Aécio Neves em conluio com o famoso PIG – Partido da Imprensa Golpista, têm empreendido esforço descomunal visando perpetrar um golpe na democracia e na vontade soberana do eleitor.

Tais tentativas iniciaram antes mesmo do pleito, onde o semanário “esgoto” Veja, antecipou sua edição, que normalmente circula nos sábados, para sexta-feira com uma “falsa” denúncia que estampava numa montagem com as fotos da presidenta Dilma e do ex-presidente Lula e a chamada em letras garrafais “Eles sabiam de tudo”, referência ao caso de corrupção na Petrobrás, numa clara tentativa de reverter a derrota iminente do candidato Aécio Neves.

A seguir, nas primeiras horas do dia da eleição, surgiu o boato, amplamente divulgado pelas mídias sociais e por alguns meios de comunicação, de que o doleiro Alberto Youssef, autor da “denúncia” da Veja, havia sido assassinado na sede da Polícia Federal, em outra tentativa desesperada para atingir a candidatura da presidenta Dilma.

Entretanto, essas duas “balas de pratas” não tiveram o efeito desejado e Dilma foi reeleita.

Já no dia posterior à divulgação do resultado, que confirmou a reeleição da presidenta Dilma, o PSDB, do candidato derrotado Aécio Neves, colocou sob suspeita o resultado das eleições e entrou com uma ação exigindo uma auditoria das urnas eletrônicas, ação que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) negou por unanimidade, confirmando assim a licitude do processo eleitoral.

Há de se ressaltar, que o TSE disponibilizou todos os dados das eleições para o PSDB para que o mesmo fizesse sua própria auditoria, sendo que até o presente momento o tucanato não conseguiu detectar nenhuma fraude nas urnas eletrônicas.

Mas a sanha golpista não parou por aí.

Dias depois, quando a Presidenta era diplomada, o PSDB ingressou com uma ação do TSE pedindo a cassação do registro de sua candidatura e de seu vice e que o Tribunal empossasse os candidatos derrotados Aécio Neves e Aloisio Nunes. Pretensão estapafúrdia que recebeu o pronto repúdio do presidente da Corte, ministro Dias Tóffoli, que assim manifestou: "As eleições de 2014, para o Poder Judiciário, são uma página virada. Não haverá terceiro turno na Justiça Eleitoral. Que especuladores se calem. Já conversei com a corte e esta é a posição, inclusive do nosso corregedor-geral eleitoral, com quem conversei, e de toda a composição. Não há espaço para, repito, terceiro turno que possa cassar o voto destes 54.501.118 eleitores". 

Depois tentaram imputar à Presidenta um “crime de responsabilidade” e consequentemente a sua cassação, em função da revisão do famigerado “superávit primário”. Mais uma tentativa de golpe fracassado, haja vista que o Congresso Nacional referendou a “flexibilização” da meta pelos placares acachapantes de 240 X 60 e 39 X 01, respectivamente na Câmara dos Deputados e no Senado, após quase 19 horas de conturbada sessão.

Agora, mais uma vez, a oposição golpista joga todas as suas fichas nas chamadas “pedaladas fiscais” (atrasos nos repasses de recursos públicos para bancos e autarquias), surgidas a partir de um falso e frágil argumento de que a Presidenta teria afrontado a Lei de Responsabilidade Fiscal, algo que não coaduna com a realidade.

Primeiro, porque tal prática (pedaladas) ocorreu desde os tempos em que o tucano Fernando Henrique Cardoso era presidente. Ou seja, quem iniciou as “pedaladas” foi o próprio PSDB, sendo que o TCU jamais apontou ilegalidade nesse procedimento; segundo, o próprio relatório do TCU exclui a presidenta Dilma da lista de 17 autoridades apontadas como responsáveis pelas “pedaladas” e, terceiro, num acordão do próprio TCU descaracteriza tal prático como sendo uma “operação de crédito” e sim como “meros atrasos de curtíssimo prazo”, como bem lembro o advogado geral da União Luis Inácio Adams, durante audiência ocorrida recentemente no Senado.

Além do mais, mesmo na (improvável) hipótese do TCU recomendar uma reprovação das contas do Executivo, a palavra final será dada pelo Congresso Nacional, instância responsável pelo julgamento das contas do Governo Federal.

Mas, por incrível que pareça, essa função constitucional do Congresso, infelizmente, não vem sendo praticada desde os tempos do ex-presidente Fernando Collor de Melo. Ou seja, ainda estão na fila para julgamento as contas do ex-presidente Collor, das duas gestões dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva e da primeira gestão da presidenta Dilma Rousseff.

Assim, tudo indica que esse factoide não será capaz de concretizar o sonho de consumo dos derrotados e golpistas – o impeachment da presidenta Dilma e a condução do Aécio Neves à Presidência da República, mesmo ele sonhando constantemente com isso, a ponto de, em um “ato falho”, ter afirmado durante uma entrevista à Rádio Gaúcha que a última convenção nacional do PSDB havia lhe reelegido “Presidente da República”!

Daqui um pouco, só falta a “oposição golpista” pedir “impitiman” por conta do momento de baixo “índice de popularidade” da Presidenta! “E venham tentar. Venham tentar. Se tem uma coisa que eu não tenho medo é disso. Não contem que eu vou ficar nervosa, com medo. Não me aterrorizam (...), como bem desafiou a presidenta Dilma em recente entrevista.  

Miranda Muniz  é  agrônomo, bacharel em direito, oficial de justiça-avaliador federal, diretor de comunicação da CTB/MT – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil e secretário sindical do PCdoB-MT

'Política imposta pela Alemanha é crime contra a Humanidade'

Carta Maior

15/07/2015

Sujeitar o povo a condições de asfixia - criando premeditadamente as condições para uma catástrofe humanitária - viola todas as convenções internacionais.


InfoGrécia
reprodução

A poucas horas da votação das medidas prévias de austeridade, a presidente do Parlamento grego voltou a apelar ao Governo para que não aceite a chantagem dos credores para um acordo em que já nem o FMI acredita. Leia aqui o discurso de Zoe Konstantopoulou na semana passada a justificar a abstenção na proposta, traduzido pelo blogue Aventar.
 
«Minhas senhoras e senhores, caros colegas,
 
Nos momentos como este, devemos agir e falar com sinceridade institucional e coragem política. Devemos assumir, cada um, a responsabilidade que nos cabe.
 
Protegendo, como a nossa consciência nos obriga, as causas justas e os direitos sagrados, invioláveis e não negociáveis do nosso povo e da nossa sociedade.
 
Salvaguardando a herança legada por aqueles que deram a sua vida e a sua liberdade para que hoje possamos ser livres.
 
Preservando a herança das novas gerações e das vindouras, bem como a civilização humana, o mesmo acontecendo com os valores inalienáveis que caracterizam e dão sentido à nossa existência individual e colectiva.
 
O modo como cada um opta por decidir e agir pode variar, mas ninguém tem o direito de zombar, degradar, denegrir ou usar com uma finalidade política as decisões emanadas de um processo e de uma decisão difícil e consciente, intimamente ligados ao cerne da nossa existência.
 
Seremos todas e todos julgados pelas nossas atitudes e decisões, pelos nossos sim e pelos nossos não, pelos nossos actos e pelas nossas omissões, pela nossa coerência, pelas nossas resistências, pela nossa abnegação e pelo nosso desinteresse.
 
Desde há cinco meses que o Governo, que tem por tronco a Esquerda e por coração as forças anti-memorando, se entrega a um combate desigual, nas condições de asfixia e de chantagem contra uma Europa que traiu os objectivos inscritos nos seus Estatutos, a saber, o bem-estar dos povos e das sociedades, uma Europa que utiliza uma moeda comum, o euro, não como meio para alcançar o bem-estar social, mas como alavanca e instrumento de subjugação e de humilhação dos povos e dos governos rebeldes, uma Europa que está em vias de se transformar numa prisão de pesadelo para os seus povos, apesar de ter sido construída para ser a sua casa acolhedora comum.
 
O povo grego confiou a este Governo a grande causa da sua libertação das malhas do memorando, do torno vicioso da sua colocação sob tutela e sob vigilância, impostas à sociedade sob pretexto de uma dívida – uma dívida ilegal, ilegítima, odiosa e insustentável, cuja natureza – tal como o demonstraram as conclusões preliminares da Comissão para o apuramento da Verdade sobre a Dívida Pública – era já do conhecimento dos credores desde 2010.
 
Uma dívida que não surgiu como um fenómeno meteorológico, antes foi criada pelos governos precedentes, mediante contratos manchados pela corrupção, por comissões, luvas, cláusulas leoninas e juros astronómicos, de que bancos e empresas estrangeiras beneficiaram.
 
Uma dívida que a Troika, com o beneplácito dos precedentes governos, transformou fraudulentamente, fazendo de uma dívida privada uma dívida pública, salvando assim bancos franceses e alemães, bem como bancos privados gregos, condenando o povo grego a viver nas actuais condições de crise humanitária, enquanto mobilizando e gratificando os órgãos da corrupção mediática encarregues de aterrorizar e de enganar os cidadãos.
 
Esta dívida, que nem o povo nem o Governo actual criaram ou fizeram aumentar, é desde há cinco anos usada como instrumento de subjugação do povo por forças que agem a partir do interior da Europa, no quadro de um totalitarismo económico.
 
A despeito da moral e do direito, a Alemanha ainda não honrou até este dia as suas dívidas para com a pequenina Grécia resistente, cuja atitude heróica a História reconheceu. Tratam-se de dívidas de ultrapassam a dívida pública grega e representam um montante de 340 mil milhões de euros, segundo os cálculos emanados da Comissão de Justiça do Tribunal de Contas, que foi criada pelo governo precedente, data em que a alegada dívida pública grega foi estimada em 325 mil milhões de euros.
 
A Alemanha beneficiou do maior apagamento de dívida do pós-Segunda Grande Guerra, a fim de poder reerguer-se, com o patrocínio generoso da Grécia. Esta mesma Alemanha emprestou protecção a responsáveis por empresas culpadas por actos de corrupção, realizados em parceria com os governos precedentes e os seus partidos políticos, tais como a Siemens, que a Alemanha protegeu, subtraindo-os todos à obrigação de apresentação perante a justiça grega.
 
Assim, a Alemanha comporta-se como se a História e o povo grego tivesse contraído dívidas junto dela, como se pretendesse um ajustamento de contas, realizando a sua vingança histórica pelas suas próprias atrocidades, aplicando e impondo uma política que constitui um crime não apenas relativamente ao povo grego mas também contra a própria Humanidade – no sentido penal do termo, pois trata-se aqui de uma agressão sistemática e de grande escala contra uma população, com o objectivo premeditado de produzir a sua destruição parcial ou total.
 
A que infelizmente há que acrescentar, apesar do seu dever de procurar estar à altura das suas responsabilidades e do momento histórico, a cumplicidade dos governos e das instituições perante esta agressão.
 
Minhas senhoras e meus senhores, caros colegas,
 
Sujeitar o povo e o Governo a condições de asfixia e à ameaça de uma violenta bancarrota, pela criação artificial e premeditada das condições para uma catástrofe humanitária, constitui uma violação directa de todas as convenções internacionais que protegem os direitos do Homem, da Convenção da ONU, das convenções Europeias, e até mesmo dos próprios Estatutos do Tribunal Penal Internacional.
 
A chantagem não é uma fatalidade. E a criação e aplicação de condições cuja finalidade é a de suprimir o livre arbítrio, não permite a ninguém poder falar sobre “liberdade de escolha”.
 
Os credores chantageam o Governo. Agem fraudulentamente, apesar de saberem desde 2010 que a dívida não é sustentável. Agem conscientemente, uma vez que reconhecem nas suas declarações a necessidade de conceder uma ajuda humanitária à Grécia. Uma ajuda humanitária por que razão? Para alguma catástrofe natural imprevista e inesperada? Um sismo imprevisto, uma inundação, um incêndio?
 
Não. Uma ajuda humanitária que é a própria consequência das suas escolhas conscientes, calculada para privar o povo dos seus meios de subsistência, fechando a torneira da liquidez, como forma de represália pela decisão democrática do Governo e do Parlamento de organizar um referendo e de dar a voz ao povo para que pudesse ser ele a decidir o seu futuro.
 
O povo grego honrou o Governo que teve confiança nele, bem como o Parlamento que lhe deu o direito de tomar nas suas mãos a sua vida e o seu destino. E disse um NÃO corajoso e confiável,
 
NÃO às chantagens,
 
NÃO aos ultimatos,
 
NÃO aos memorandos da subjugação,
 
NÃO ao pagamento de uma dívida que não foi por ele criada e de que não é responsável,
 
NÃO a mais medidas de miséria e de submissão
 
Esse NÃO, os credores obstinam-se com persistência a querer transformar num SIM, com a cumplicidade pérfida de todos os que são co-responsáveis por esses memorandos e que tiraram proventos deles: os que criaram a dívida.
 
Esse NÃO do povo ultrapassa-nos a todos e obriga-nos a defender o seu direito a lutar pela sua vida, a lutar para que não mais viva uma vida pela metade, ou uma vida de servidão, e para ter orgulho em tudo o que vai deixar aos seus sucessores e à Humanidade.
 
O Governo é hoje objecto de uma chantagem, a fim de levá-lo a aceitar tudo o que não quer, que emana não de si próprio e que agora combate. O primeiro-ministro falou com sinceridade, com coragem, franqueza e de forma desinteressada. É o mais jovem primeiro-ministro e é também aquele que, ao invés de todos os seus congéneres, mais lutou pelos direitos democráticos e sociais do povo e das novas gerações, que representou e representa a nossa geração e lhe dá esperança. Presto-lhe e continuarei a prestar-lhe a minha homenagem, pela sua atitude e pelas suas escolhas. Mas ao mesmo tempo, posta perante a minha responsabilidade institucional, enquanto Presidente do Parlamento, considero que não posso fechar os olhos e fazer de conta que não percebo a chantagem.
 
Nunca poderia votar em favor da legitimação do conteúdo do acordo, e penso que isso também é válido para o primeiro-ministro, que é hoje objecto de uma chantagem que usa contra ele a arma da necessidade de sobrevivência do seu povo. E julgo que também o Governo e os grupos parlamentares que o apoiam pensam desta forma.
 
A minha responsabilidade para com a História desta Instituição, assumo-a respondendo “presente” no debate e na votação de hoje. Penso, assim, ser mais útil ao povo, ao Governo, e ao primeiro-ministro, às gerações futuras e às sociedades europeias, expondo à luz do dia as verdadeiras condições nas quais o parlamento é chamado a tomar decisões, recusando a chantagem, em nome da alínea 4 do Artigo 120 da Constituição grega.
 
O povo grego é o segundo a ser vítima de uma tal agressão emanada do interior da zona euro. Foi precedido por Chipre, em Março de 2013.
 
A tentativa de impor medidas que o povo rejeitou em referendo, usando a chantagem do encerramento dos bancos e a ameaça da falência, constitui uma violação brutal da Constituição, ademais de privar o Parlamento dos poderes que lhe são atribuídos por essa mesma Lei Fundamental.
 
Cada uma e cada um tem o direito e o dever de resistir. Nenhuma resistência na História foi fácil. No entanto, pedimos o voto e a confiança do povo para enfrentar as dificuldades e é face a essas dificuldades que devemos agora ser bem sucedidos. E fazendo-o sem medo.»
 
Tradução do Grego de Yorgos Mitralias (revisto por Patrick Saurin) e do Francês por Sarah Adamopoulos para o blogue Aventar.




sábado, 11 de julho de 2015

Dilma, Xangai e o sopro de esperança

Carta Maior

10/07/2015
Editorial

A proteção ao emprego anunciada por Dilma mostra que é possível repactuar a economia fora da receita neoliberal para o Brasil. 

por: Saul Leblon

Roberto Stuckert Filho/ PR

A Presidenta Dilma Rousseff fez três movimentos nas últimas horas que podem ser relevantes se refletirem o sopro de um vento novo, não a reatividade efêmera dos abanos em ambientes sufocantes.
 
Seu efeito mais visível foi sacudir a resistência ao golpe que o conservadorismo discute abertamente no país.
 
Há aqui uma hierarquia a destacar, cuja importância não é negligenciável.
 
Não foi o golpismo que gerou a convergência progressista das últimas horas. 
 
Foi a contundência de Dilma em denuncia-lo, e a determinação de combate-lo, que imantou forças e vozes até então esmorecidas e dispersas.
 
Bingo número um: não haverá resistência sem que o principal protagonista político da trama participe, articule  e convoque a sociedade.
 
Na Grécia, Tsipras foi às ruas defender o ‘Não’ contra o jogral midiático que amplificava o cerco dos mercados. 
 
Não o fizesse, hoje seria um cadáver político, arrastando seu partido junto para o descarte da História.
 
No Brasil, a movimentação presidencial sacudiu uma letargia exasperante que se arrasta há oito meses.
 
Uma das principais avenidas do trânsito golpista atual é a prostração decorrente do fosso aberto nesse período entre o governo reeleito em 2014 e a sua base social.
 
Em reunião no Palácio, na 2ª feira, Dilma revalidou a aliança com o PMDB não putchista. 
 
Embora limitada, e como toda composição, um equilíbrio precário entre forças diferentes, seria um erro menosprezar esse diálogo.
 
Por dois motivos.
 
Um, setores democráticos subsistem no PMDB (o bravo senador Roberto Requião é um exemplo); dois, a prioridade crucial agora é impedir a ampliação da Liga dos Golpistas.
 
Todo esforço conservador consiste em remar na direção oposta: trazer integralmente o PMDB para a articulação da qual Eduardo Cunha é um operador desabusado.
 
Ao terceirizar a Câmara Federal à Liga dos Golpistas, Cunha já arregimentou amplas fileiras do PMDB e dos nanicos à conspiração aberta.
 
Na entrevista ao veículo da família Frias, na 3ª feira, Dilma afrontou esse aluvião num de seus veios mais salientes.
 
Debulhou-o em bateia assertiva e desassombrada.
 
O editorial da Folha acusou a pancada na 4ª feira.
 
Com dificuldade para ocultar as próprias digitais no cerco à Presidenta, o jornal grunhiu a esperança de que tribunais façam o serviço sujo de derruba-la. E fungou à matilha adestrada em mastigar a chefe da nação: 
 
‘Ainda não é o caso’ (Folha; editorial 08/07/015).
 
Não se pode subestimar os maxilares dessa gente.
 
Seu histórico compõe um calendário de escombros da legalidade, que se renova cada vez que o interesse popular trisca ou ameaça o privilégio elitista. 
 
Foi assim em 1932, 1954, 1964, 2002, 2006, 2010, 2014... 
 
A mitigação contida no ‘ainda’ da Folha, reflete, de qualquer forma,  o temor de uma resistência imprevisível.
 
‘Venha tentar. Venha tentar (dar o golpe)’, desafiou Dilma ao predador que saliva diante da presa, sem saber exatamente do que ela é capaz. 
 
Bingo número 2: é fundamental dar ao golpe o seu nome, expor à nação aqueles que adestram o seu conformismo para a ‘fatalidade’.
 
Dilma é capaz de variadas modalidades de resistência.
 
Não é hagiografia, é uma questão de biografia.
 
Em situações até mais extremadas, não hesitou.
 
Diante da articulação de elites e rentistas, amplificada pela mídia que mastiga diuturnamente a legitimidade dos seus 54 milhões de votos, por que hesitaria agora?
 
Na reunião com as centrais sindicais no Planalto, no mesmo dia, para apresentar uma salvaguarda de emprego e renda diante da crise, deu-se a terceira e mais importante inflexão da Presidenta
 
Mais do que em todas as outras, reside aqui, talvez, a chave da interrogação que tanto atemoriza a Liga dos Golpistas. 
 
Ainda há espaço para uma repactuação do desenvolvimento que reaproxime governo, forças progressistas e setores produtivos?
 
Bingo número 3: essa é a pergunta de um milhão, que o movimento de Dilma repôs, a contrapelo dos interesses que negam a sua pertinência.
 
A Política de Proteção ao Emprego, anunciada no momento em que o exército de demitidos atinge 8% da população ativa, carrega relevância econômica e social específica.
 
Porém, mais que isso.
 
A PPE é o filho temporão de uma outra lógica de enfrentamento da crise. 
 
Nascido tardiamente, oito meses após a deflagração de um programa de ajuste ortodoxo, deveria --e, como se vê , poderia, tê-lo antecedido.
 
Tivesse sido o primogênito da reeleição, teria demarcado uma outra lógica ordenadora da transição de ciclo de desenvolvimento no país.
 
Essa é a força do PPE:  ser o protótipo de algo maior, uma câmara de negociação política para a reordenação em curso da economia; uma ferramenta da democracia para se contrapor ao cavalo xucro da crise capitalista (*leia ao final desta nota um resumo do funcionamento do programa). Uma espécie de ‘Grécia’ a transgredir normas e interditos da hegemonia ortodoxa imposta ao manejo da crise brasileira.
 
Lateja na lógica da PPE aquilo que a Liga dos Golpistas mais teme: a semente de um aggiornamento na luta pela democracia social brasileira; a ponte política que não desmonta, nem implode salvaguardas e padrões de estabilidade já conquistados, mas ergue as linhas de passagem para o futuro, calafetando o vácuo de onde emergem as manifestações mórbidas da crise.
 
Quais?
 
As que avultam no coreto golpista, onde a banda dos cunhas, aécios, caiados, kins catupirys, sardenbergs e assemelhados faz gato e sapato da legalidade.
 
Homólogos da radicalização da direita urbi et orbi, eles engrossam o pelotão dos gansos sinaleiros da crise capitalista que, paradoxalmente, insiste em declara-la superada, sendo espancados pela sua ressurgência no momento seguinte.
 
Um episódio resume todos os demais: campanha de 2014, debate na Globo entre o ex-ministro Guido Mantega e o centurião dos mercados e assessor de Aécio, Armínio Fraga. Mirian Leitão interrompe Mantega abrupta e peremptória: 
 
'A crise mundial passou; o problema é o Brasil'. 
 
Sim, o Brasil, grasnam os gansos sinaleiros, ‘a’ ilha de crise num mundo de oceânica prosperidade.
 
A bofetada da vez nessa turma veio do derretimento de três trilhões de euros na Bolsa de Xangai.
 
Por trás do ploft da bolha, encontra-se a valorização anual descabida de 150% nos preços das ações – em meio a um ciclo de desaceleração da economia chinesa.
 
Os ingredientes tóxicos da farmacêutica neoliberal,  vendida aqui como receita virtuosa para o país, estão aí resumidos.
 
Quais sejam, a decantada capacidade de autorregulação dos mercados e, sobretudo, a proficiente da racionalidade financeira para ordenar o crescimento de uma nação.
 
O saldo da crença, mais uma vez, não corresponde ao enunciado miraculoso.
 
O empoçamento de capitais na roleta global, em detrimento da máquina produtiva, explica boa parte da valorização artificial de papeis em Xangai e alhures, adquiridos por milhares de pequenos aplicadores que tomam dinheiro a juro para alicerçar pirâmides de ações  (leia a análise de Luiz Gonzaga Belluzzo sobre a recorrência das bolhas na desordem neoliberal).
 
Ao primeiro tranco da liquidez volátil e pró-cíclica que opera à moda das manadas, dá-se a mutação do fastígio (acionário, imobiliário etc) em ruína e pó.
 
Um novo 1929 foi abortado na China pelas armas da repressão policial a especuladores, ademais da inclemente ação de bordoadas estatais que causam calafrios nos sacerdotes da autorregulação.
 
Elas vieram na forma de proibição de vendas das carteiras de grandes especuladores; congelamento da negociação de 50% das ações; aquisições impositivas e irrigação de recursos para deter a desova de pequenas acionistas.
 
O empoçamento da liquidez que faz estragos em Xangai, Londres, Paris ou São Paulo corresponde ao empoçamento do futuro na vida de centenas de milhões de pessoas em todo o mundo.
 
Já foi transcrito neste espaço o desabafo da insuspeita OCDE: grandes empresas mundiais estão sentadas em trilhões de dólares em caixa, mas não investem em produção.
 
Por quê? Porque falta no mundo aquilo que sobrava no Brasil, mas a ortodoxia está tratando de desidratar: empregos, demanda, ordenação pública do investimento, corrida à infraestrutura. 
 
Sem consertar esse motor quebrado da economia mundial, a OCDE, que agrega as 35 economias mais ricas, vê com ceticismo a superação da crise capitalista, lipoaspirada por essas bandas como ‘a crise do PT’. 
 
Em um mundo de sobras humanas, parte despejada no Mediterrâneo, parte no desemprego, salgadas com o sódio grosso desigualdade, os investimentos globais definham sete anos após a implosão da ordem neoliberal, em 2008.
 
O paradoxo que desalenta a OCDE e o próprio FMI (leia ao final duas notas técnicas do Fundo sobre a necessidade de controlar a farra financeira) ilustra a gravidade dos desafios enfrentados na luta pelo desenvolvimento nos dias que correm.
 
Fatos que precisam ser sublinhados, mais uma vez, diante do alucinado diagnóstico de que a retomada do desenvolvimento brasileiro é mera questão de faxina ‘no intervencionista lulopopulista’:
 
a) o investimento fixo (em bens de produção) nos países ricos e  já neoliberalizados como se quer aqui, está em média 17% abaixo do patamar de 2008;
 
b) o fluxo global de investimentos estrangeiros produtivos voltou a declinar em 2014;
 
c) mais de 200 milhões de pessoas continuam desempregadas – número 30 milhões superior ao período anterior à crise;
 
d) nos países desenvolvidos (já neoliberalizados), a renda média dos 10% mais ricos equivale hoje a quase dez vezes a renda média dos 10% mais pobres --contra a sete ou oito vezes há uma geração.
 
e) enquanto governos carecem de capitais para obras de infraestrutura, a OCDE informa que investidores institucionais tinham US$ 57 trilhões sob sua gestão no fim de 2013, o equivalente a 120% do PIB somado de todo os países ricos.
 
Alguma surpresa que esse paiol em chamas produza Xangais em série?
 
Companhias com os cofres abarrotados destinam fatias crescentes de seus lucros aos acionistas, grandes investidores especulativos e à recompra das próprias ações.
 
O onanismo rentista financia surtos de alta (bolhas) de ativos, seguidos de crashs dantescos, sem que se esboce uma coordenação mundial para reprimir a farra, com a contundência exibida agora pela China. A emergencia dos BRICs, reunidos em Moscou, é o único e promissor ensaio nessa direção, sugestivamente minimizado pelo dispositivo neoliberal.  
 
É preciso extrair consequências dessas causas.
 
A mais importante delas nos leva de volta à semente de esperança contida no programa de defesa do emprego lançado pela Presidenta Dilma, em bem-vinda reação ao cerco golpista que a desafia.
 
Não cabe ilusões.
 
Políticas de desenvolvimento não lograrão êxito no século XXI –ainda que os preços estejam alinhados, como quer Levy— se não forem providenciados instrumentos de proteção contra a supremacia da lógica rentista.
 
Carta Maior considera que o PT subestimou a extensão desse descolamento do capital em relação ao seu projeto de desenvolvimento para o Brasil.
 
A subestimação explica, em parte, que se tenha apostado em uma regeneração das condições de mercado anteriores à crise de 2008.
 
Mais que isso. Que esse erro de cálculo histórico tenha levado a dois outros, interligados.
 
O primeiro, insistir apenas na prorrogação de estímulos ao consumo quando medidas estruturais de autoproteção do desenvolvimento deveriam ter sido tomadas diante da desordem financeira que veio para ficar –e da qual a crise de 2008 era um regurgito metabólico, não um soluço passageiro. Por exemplo, o controle de capitais em 2008, quando o próprio FMI o endossava.
 
O segundo, nos dias que correm, render-se à gororoba da assepsia neoliberal no momento em que os desequilíbrios macroeconômicos explodem no país e uma repactuação política do desenvolvimento figura como a verdadeira alternativa ao descontrole. 
 
Ilusão resgatar essa alternativa agora em que o cerco golpista se estreita?
 
Mais ilusório, repetimos, é supor que a roda da democracia social poderá ser destravada aqui sem esse repto.
 
A política de valorização do emprego encerra, em ponto pequeno, aquilo que o campo progressista –e o governo Dilma--  está desafiado a construir a toque de caixa, em resposta ao emparedamento econômico e político em curso. 
 
Basicamente, a PPE reúne Estado, centrais sindicais e  setores produtivos, com triplo objetivo: a) preservar empregos; b) reduzir custos diante de queda de vendas e c) mitigar a perda de receita fiscal diante da recessão. 
 
Trata-se, enfim, de baixar o metabolismo da economia de forma negociada e, sob controle pactuado, transitar rumo a um novo ciclo de crescimento com justiça social.
 
Esse é o corredor estreito da esperança que foi reaberto pela inflexão da Presidenta Dilma nos últimos dias.
 
Alargá-lo não é uma questão de fé. 
 
É obra inadiável: dela, porém, só o discernimento histórico das frentes progressistas em formação –e a grandeza de suas lideranças-- poderá dar conta.
 
O tempo urge.
 
(*)  Para saber mais (I)
 
Síntese da Política de Proteção do Emprego
 
A PPE reduz  a jornada de trabalho e o salário em até 30% durante seis meses, prorrogáveis por mais seis. Não pode haver demissão nesse período; o saldo do FGTS fica preservado, assim como todos os direitos trabalhistas. Os trabalhadores inscritos no programa terão estabilidade quando de seu término (para duração de 6 meses, 2 meses de estabilidade e para duração de um ano, 4 meses). O teto para a redução de jornada e de salário é de até 30%, definido por acordo coletivo, negociado com o sindicato da categoria. O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) complementa 50% deste percentual. Se o PPE evitar a demissão de 50 mil trabalhadores  o governo gastará R$ 112,5 milhões em complementações durante seis meses. Sua receita porém será da ordem de R$ 181,3 milhões em contribuição previdenciária, ademais de economizar  R$ 291 milhões em seguro-desemprego. 
 
Para saber mais (II)
Notas técnicas do FMI 
Estados Unidos: Programa de Avaliação do Setor Financeiro – Supervisão e Gestão de Risco Sistêmico –
 A importância de reforçar o monitoramento do risco sistêmico e construir ferramentas macroprudenciais eficazes é amplamente reconhecida. Nos Estados Unidos, onde os mercados financeiros exibem um maior grau de heterogeneidade que em outros países, e onde o monitoramento e a regulação são responsabilidade de uma série de diferentes agências especializadas, é especialmente clara a necessidade de construir estruturas que garantam o compartilhamento de informações interagências, de preencher lacunas na regulamentação, obter um bom panorama dos riscos sistêmicos e desenvolver uma estrutura eficaz e cooperativa para enfrentar as eventuais ameaças à estabilidade financeira. Este artigo revisa estes processos nos Estados Unidos, bem como analisa os progressos alcançados quando diversas áreas importantes de risco foram identificadas, particularmente no setor não bancário.
A criação do Conselho de Monitoramento da Estabilidade Financeira (FSOC), em 2010, preencheu uma lacuna importante na estrutura da estabilidade financeira dos Estados Unidos, e é central na resposta regulatória aos problemas que atingiram o setor financeiro em 2007-2009 . A Lei Dodd Frank (DFA) atribui ao Conselho uma série de poderes que lhe permitem responder às ameaças emergentes à estabilidade financeira . Na prática, o Conselho trabalha principalmente através de comunicação reforçada, consulta e coordenação do trabalho das agências reguladoras financeiras dos EUA; a eficácia do FSOC depende amplamente do sucesso do Conselho em construir e pôr em prática um objetivo coletivo e comum às agências reguladoras financeiras dos EUA para identificar e tratar os riscos sistêmicos, e para trabalhar juntos pela promoção da estabilidade financeira. O trabalho empreendido pelo FSOC é bem-vindo. Contudo:
 
- O propósito coletivo e a responsabilidade do FSOC seriam reforçados se cada agência-membro e cada membro recebesse a missão explícita de promover a estabilidade financeira e, portanto, apoiar o trabalho do FSOC (sujeito à missão e objetivos das agências-membros e dos membros) . 
 
- Outras ações são necessárias para: melhorar a base de dados; superar obstáculos ao compartilhamento de dados; apoiar a coordenação e a consulta sobre normas e regulamentações prudenciais; aprimorar as estruturas de monitoramento de riscos; proporcionar maior clareza sobre a natureza e a escala de ameaças sistêmicas emergentes identificadas; e reforçar a transparência e a propriedade coletiva das ações necessárias ao enfrentamento dos riscos identificados, através do esclarecimento e da publicação dos desdobramentos específicos, além de deixar claras as responsabilidades, incluindo o cronograma esperado para a implementação e a comunicação dos resultados.
 
- O desenvolvimento de ferramentas macroprudenciais ainda está em andamento; as agências-membros e os membros do FSOC devem continuar concentrados em medidas para responder ao aumento dos riscos cíclicos e setoriais e para fortalecer a resiliência aos riscos dos mercados financeiros; assim como deixar claro a estrutura para a implementação de políticas macroprudenciais.
 
(Nota do FMI 02)
Estados Unidos: Programa de Avaliação do Setor Financeiro – Avaliação de Estabilidade do Sistema Financeiro
 
Passos bem-vindos foram dados em direção ao fortalecimento do sistema financeiro. O Conselho de Monitoramento da Estabilidade Financeira (FSOC) consiste hoje em um fórum útil para um trabalho coordenado; o perímetro regulatório foi expandido; o compartilhamento de informações entre as agências melhorou; testes de estresse estão levando a mudanças na avaliação e gestão de risco; e novos poderes de resolução foram estabelecidos.
 
Antes que a memória da crise comece a se apagar, será importante completar a agenda de reformas e resistir a tentativas de derrubar medidas anteriormente acordadas. É, portanto, fundamental que a regulação iniciada pela Lei Dodd-Frank (DFA) seja completada e que diversas outras medidas já acordadas comecem a ser postas em prática. A paisagem regulamentar continua fragmentada, resultando em lacunas, sobreposições, e em respostas potencialmente tardias a riscos emergentes, e por isso deve ser simplificada. Enquanto o FSOC tem dado passos importantes para lidar com o problema de instituições ‘Too-Big-to-fail' (grandes demais para ir à falência), normas aperfeiçoadas para instituições não bancárias precisam ser postas em prática. Falhas fundamentais são encontradas no financiamento habitacional, nos fundos mútuos do mercado monetário e nos acordos de recompra tripartidos, e é preciso considerar a questão do mercado de empréstimo de títulos.
 
Enquanto isso, surgiram novos bolsões de vulnerabilidades, em parte em resposta à busca contínua por rendimento. Enquanto a maioria dos indicadores sugere que os riscos para a estabilidade financeira diminuíram, ainda há áreas potenciais de preocupação. Bancos grandes e interconectados dominam o sistema, ainda mais do que antes. Os riscos estão elevados no setor não bancário, onde riscos "run" e "redemption" estão aumentando, como resultado de alavancagem e transformações de maturidade, e cadeias de financiamento por atacado profundamente interligadas. As seguradoras assumiram maior risco de mercado e podem ser confrontadas com um passivo a descoberto em um cenário desvantajoso.
 
Isso requer um foco contínuo no reforço da estrutura micro e macroprudencial. O FSOC deve ser reforçado com as agências membro recebendo uma missão explícita de estabilidade financeira. Devem ser coletados dados abrangentes necessários para a construção de uma visão clara dos riscos sistêmicos e interconexões. Uma instituição reguladora nacional independente é um imperativo para o setor de seguros para preencher lacunas em relação às normas internacionais (incluindo deficiências na avaliação e requisitos de solvência) e garantir coerência na regulamentação e supervisão. É preciso atualizar orientações de supervisão bancária para risco de concentração, operação e de taxa de juros. Deve ser completada a regulamentação pendente do setor de títulos e derivativos, e as questões sobre o funcionamento eficaz do mercado devem ser tratadas à medida que surgirem. A supervisão dos gestores de ativos deve ser reforçada, incluindo requisitos explícitos de gestão de riscos, controle interno, e o esforço estruturado para realizar testes de estresse das instituições. Normas de gestão de risco para Infraestruturas do mercado financeiro precisam ser plenamente implementadas.
 
Finalmente, precisa ser claramente definida a responsabilidade pela prontidão e pela gestão de uma crise do sistema. O FSOC é o candidato natural para este papel. O desenvolvimento de planos de recuperação confiáveis para todas as instituições e infraestruturas financeiras importantes para o sistema será um componente importante deste trabalho.
 
Tradução das notas por Clarisse Meireles







quinta-feira, 9 de julho de 2015

Por trás da crise grega


09.07.2015 
 
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Ao focar exclusivamente os aspectos monetários da crise grega, a narrativa construída e distribuída pela mídia perde de vista grande parte do que realmente atormenta os gregos e também do que poderia possibilitar alguma solução.


Por mais de meio século, os gregos viveram tempos de grande perigo. Nos anos 1930s, viveram sob uma ditadura brutal, cujo modelo foi a Alemanha Nazista, com polícia secreta copiada da Gestapo e com os dissidentes mandados para morrer num campo de concentração numa ilha. E então, aconteceu coisa estranhíssima: Benito Mussolini invadiu a Grécia. 

Para proteger o autorrespeito e o próprio país, os gregos puseram de lado o ódio contra a ditadura de Metaxas e uniram-se para combater o invasor estrangeiro. Os gregos fizeram tão belo trabalho na defesa do país deles, que Adolf Hitler teve de adiar a invasão da Rússia, para ir até lá resgatar os fascistas italianos.

Há quem diga que esse movimento pode ter salvo Josef Stalin, porque o adiamento forçou a Wehrmacht a combater na lama, neve e gelo da Rússia, condições para as quais não estava preparada. Mas, ironicamente, isso também salvou a ditadura de Metaxas e a monarquia. 

O rei e os mais altos oficiais gregos fugiram para o Egito então ocupado pela Grã-Bretanha e, como novos aliados, foram declarados parte do "Mundo Livre".

Enquanto isso, na Grécia, os alemães saqueavam grande parte da indústria grega, dos estaleiros e estoques de comida. Os gregos passaram fome. Como Mussolini disse então, "os alemães tiraram dos gregos até os cordões dos sapatos." 

Então os gregos começaram a reagir. Em outubro de 1942, iniciaram um movimento de resistência que, em dois anos, tornou-se o maior da Europa. 

Quando a França se orgulhava dos seus menos de 20 mil partisans, o movimento da resistência grega alistara 2 milhões de resistentes, e já derrotara pelo menos duas divisões de soldados alemães. E sem nenhuma ajuda externa. 

Quando o desfecho da guerra começou a se configurar, o primeiro-ministro britânico Winston Churchill decidiu devolver a Grécia ao regime de antes da guerra, com a monarquia e o antigo governo. Temia a influência dos comunistas ativos dentro do movimento de resistência. 

Churchill tentou conseguir que o exército anglo-americano, que se aprontava para invadir a Itália, invadisse não a Itália, mas a Grécia.

 Fato é que tanto insistiu nessa mudança no plano de guerra que quase rompeu a aliança militar dos Aliados. Quando não conseguiu o que queria, mandou para a Grécia todos os soldados que ainda estavam sob o comando dele. 

Com isso precipitou uma guerra civil que rachou ao meio o país. Os líderes da resistência clandestina foram derrotados e o movimento foi esmagado. A burocracia, a polícia e os programas da ditadura do pré-guerra retomaram o controle do país. 

Depois da guerra, com a Grã-Bretanha já arruinada e sem meios para sustentar sua política imperial, Londres entregou a Grécia aos norte-americanos que anunciaram a "Doutrina Truman" e afogaram o país em dinheiro, com o que impediram o sucesso eleitoral da esquerda. 

O dinheiro norte-americano funcionou bem por algum tempo, mas a mão pesada da ditadura criou uma nova geração de supostos democratas que desafiaram a ditadura. 

Esse é o tema belamente exposto no filme Z, de Costa Gavras, estrelado por Yves Montand. Como o filme mostra, o movimento liberal do início dos anos 1960s foi derrotado por uma nova ditadura militar, "o governo dos coronéis". 

Quando a junta militar foi derrubada em 1974, a Grécia conheceu um breve período de 'normalidade', mas nenhuma das fissuras profundas que havia na sociedade haviam sido realmente remediadas. Independente de que partido político designasse os ministros, a burocracia sempre autoperpetuada continuava no controle. A corrupção era generalizada. 

E, mais importante que tudo isso, a Grécia tornara-se um sistema político que Aristóteles chamaria de oligarquia. 

Os muito ricos usavam o dinheiro para criar para eles mesmos um estado dentro do estado.

 Estenderam seu poder para todos os nichos da economia e construíram o sistema bancário grego de modo que se tornou essencialmente extra-territorializado. 

O porto de Piraeus encheu-se de megaiates de gente que não pagava impostos e Londres foi comprada, pelo menos em boa parte, por gente que sangrava a economia grega. Todo o dinheiro "inteligente" [orig. "smart money"] da Grécia estava aplicado fora do país. 

A crise atual 

Esse estado de coisas poderia ter durado muito mais tempo, mas quando a Grécia uniu-se à União Europeia em 1981, banqueiros europeus (principalmente alemães) farejaram uma oportunidade: voaram em bandos para a Grécia, para oferecer empréstimos. Até quem não tinha renda que tornasse razoável qualquer empréstimo ganhou empréstimos. 

Na sequência, os banqueiros começaram a cobrar pagamentos. Chocados, os empresários começaram a demitir. O desemprego cresceu. As oportunidades evanesceram. 

Não há qualquer remota chance de aqueles empréstimos serem pagos. Nunca deveriam ter sido oferecidos e nunca deveriam ter sido aceitos. Para manter-se à tona o governo cortou em serviços públicos (não cortou gastos militares) e o povo sofreu muito.

 Nas eleições de 2004, o povo ainda não havia sofrido o suficiente a ponto de eleger a coalizão radical liderada pelo partido "Unidade" (SYRIZA). Naquele ano, o partido recebeu apenas 3,3% dos votos. 

Então, depois do crash financeiro de 2008 vieram anos de dificuldades que aumentavam dia a dia, todos os políticos eram considerados culpados de tudo e havia muita ira. 

Era ira popular, dos que se sentiam desorientados pelos banqueiros e pela própria loucura. Não havia esperança nem havia saída à vista, e os gregos começaram a virar-se na direção do partido SYRIZA. 

Depois de várias tentativas, afinal nas eleições de 2015 o SYRIZA alcançou 36,3% dos votos, e elegeu 249 dos 300 membros do Parlamento. 

Hoje, as condições que empurraram na direção dessa eleição são ainda mais graves: a renda nacional da Grécia caiu 25% e o desemprego entre os mais jovens é superior a 50%. Assim sendo, o que resta aos negociadores fazer? 

Com Alemanha e UE a exigir mais e mais arrocho, os gregos estão furiosos. Há no país memórias profundas de ódio aos alemães (antes eram soldados, agora são banqueiros). 

Os gregos foram mal interpretados, mal representados e traídos pelos seus próprios políticos vezes sem conta. 

O primeiro-ministro Alexis Tsipras sabe que, se for marcado com o rótulo "vendido", sua carreira está acabada. 

E o pacote do dito 'resgate' que o FMI e o BCE ofereceram pesa muito contra a Grécia. Os gregos veem a opção de sair do euro como semelhante à posição que Grã-Bretanha e Suécia assumiram desde o início, de não adotar a moeda europeia -, mas terá de haver ajuste doloroso para a economia grega, caso a Grécia tome a decisão, sem precedentes, de desligar-se do euro. 

Mesmo assim - a menos que FMI e BCE façam nova oferta, que tragam alguma coisa que dê aos gregos chance de uma vida melhor e cancelem parte significativa da dívida -, entendo que os gregos acertarão se votarem "Não", no domingo; se rejeitarem as demandas dos banqueiros, que querem mais e mais arrocho; e se se abandonarem o euro. *****

 

2/7/2015, William R. Polk, Consortium News

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segunda-feira, 6 de julho de 2015

O fim do sangramento da Grécia


Economista vencedor do Nobel diz que ‘bullying’ contra os gregos foi um momento vergonhoso para uma Europa democrática

por 
Votantes do “não” se reuniram em frente ao Parlamento grego em Atenas no domingo - Dimitris Michalakis / Reuters

NOVA YORK - A Europa se esquivou de uma bala no domingo. Confundindo muitas previsões, os eleitores gregos apoiaram fortemente a rejeição de seu governo às demandas dos credores. E mesmo os apoiadores mais fervorosos da União Europeia devem estar suspirando de alívio.

Claro, esta não é a forma que os credores gostariam que você enxergasse. A versão deles, ecoada por muitos da imprensa de negócios, é de que a falência na tentativa de intimidar a Grécia ao consentimento foi um triunfo de irracionalidade e irresponsabilidade sobre bons conselhos tecnocráticos.

Mas a campanha de bullying — a tentativa de aterrorizar os gregos ao cortar financiamento bancário e ameaçar o caos geral, tudo com a meta quase escancarada de empurrar a corrente esquerdista do governo para fora — foi um momento vergonhoso em uma Europa que afirma acreditar em princípios democráticos. Isso teria instalado um terrível precedente se a campanha obtivesse sucesso, mesmo se os credores tivessem razão.

E mais, eles não tinham. A verdade é que os tecnocratas de estilo próprio da Europa são como médicos medievais que insistiam em sangrar os pacientes — e quando o tratamento oferecido deixasse os pacientes ainda mais doentes, demandavam ainda mais sangue. O “sim” na Grécia teria condenado o país a anos de mais sofrimento sob políticas que não têm dado certo e, de fato, dada a aritmética, não funcionam: austeridade provavelmente afunda a economia mais rápido do que reduz a dívida, de modo que todo o sofrimento não serve a propósito algum. A vitória esmagadora do lado “não” oferece ao menos a chance de uma fuga desta armadilha.

Mas como tal saída pode ser administrada? Há alguma maneira de a Grécia permanecer na zona do euro? E isso é desejável em algum caso?

A questão mais imediata envolve os bancos gregos. Antes do referendo, o Banco Central Europeu (BCE) cortou o acesso a fundos adicionais, ajudando a precipitar o pânico e a forçar o governo a impor um feriado bancário e o controle de capitais. O banco central agora enfrenta uma escolha incômoda: se mantiver o financiamento normal, estará admitindo que o congelamento prévio foi político, mas se não, vai efetivamente forçar a Grécia a introduzir uma nova moeda.

Especificamente, se o dinheiro não começar a fluir de Frankfurt (sede do BCE), a Grécia não terá opção a não ser começar a pagar salários e pensões com promessas de pagamento, o que de fato seria uma moeda paralela — e poderá se tornar em breve a nova dracma.

Suponhamos, por outro lado, que o BCE retome a linha de financiamento normal, e a crise bancária seja amenizada. Ainda resta a questão de como restaurar o crescimento econômico.

Nas negociações fracassadas que levaram ao referendo de domingo, o ponto central era a demanda da Grécia por alívio permanente da dívida, para remover a ameaça que pairava sobre a economia. A troika — as instituições que representam os interesses dos credores — recusou, apesar de sabermos agora que um dos membros da troika, o Fundo Monetário Internacional, havia concluído independentemente que a dívida grega não pode ser paga. Mas será que vão reconhecer agora que a tentativa de retirar a coalizão de esquerda do governo fracassou?

Não faço ideia — e, de qualquer forma, existe agora um argumento forte de que a saída da Grécia do euro é a melhor das piores opções.

Imagine, por um momento, que a Grécia nunca tivesse adotado o euro, que ela tivesse somente fixado o valor da dracma em termos de euros. O que análises econômicas básicas diriam que ela deveria fazer agora? A resposta, esmagadoramente, seria que ela deveria desvalorizar a moeda — deixar o valor da dracma cair, tanto para estimular exportações e quebrar o ciclo de deflação.

Claro, a Grécia não tem mais uma moeda própria, e muitos analistas afirmavam que a adoção do euro era um movimento irreversível — afinal, qualquer insinuação de saída da zona do euro acarretaria corridas bancárias e crise financeira. Mas, neste ponto em que a crise financeira já aconteceu, os custos maiores da saída do euro já foram pagos. Por que, então, não buscar os benefícios?

A saída da Grécia do euro funcionaria tão bem quanto a desvalorização bem-sucedida da Islândia em 2008-2009, ou o abandono da Argentina da política “um peso, um dólar” em 2001-2002? Talvez não, mas considere as alternativas. A menos que a Grécia receba realmente um alívio principal da dívida, e talvez ainda assim, abandonar o euro oferece a única rota de fuga plausível do seu interminável pesadelo econômico.

E sejamos claros: se a Grécia terminar fora do euro, não significa que os gregos são europeus maus. O problema da dívida do país reflete concessão e recebimento de empréstimos irresponsáveis, e, de qualquer maneira, os gregos pagaram pelos pecados do seu governo muitas vezes. Se eles não conseguem ser bem-sucedidos com a moeda comum da Europa, é porque tal moeda não oferece nenhuma trégua a países com problemas. A coisa mais importante agora é fazer o que for preciso para estancar o sangramento.

O QUE O CARTEL DA MÍDIA NÃO FALA SOBRE A CRISE GREGA...



- Por que a Grécia deve muito?

- Porque os bancos, principalmente alemães, emprestaram muito, para as famílias e para o governo grego...

- Por que, uai?

- Para os gregos comprarem os produtos fabricados na Alemanha, França, contratarem as empresas estrangeiras para fazer obras, uai...

E AGORA, NO PLEBISCITO DE 5 DE JULHO, O POVO GREGO DISSE NÃO!

Que não pagarão juros e dívidas às custas de mais  arrocho e corte de direitos dos trabalhadores, do sacrifício da soberania da Grécia, do congelamento da sua economia. 

Decisão foi corajoso enfrentamento à lógica perversa do capital financeiro mundial, do neoliberalismo antipovo.

Em resumo, é isso, os banqueiros querem ganhar sem trabalhar, só na especulação, mamando juros, lascando com o povo e arruinando os países. 

Na decisão grega não há tergiversação: o povo disse não ao pagamento da dívida com FMI e BCE às custas de seus empregos, arrocho salarial e cortes de direitos. 

E a TV quer nos engabelar dizendo que a Grécia é a vilã dessa exploração sem limites...

É preciso sempre duvidar da Globo e do cartel da mídia.

No Brasil, em 2014, a maioria, de 54 milhões de eleitores, votou em Dilma pelas mesmas razões. 

Quem criou a crise atual do capitalismo não foi a esquerda; foi a ganância do capital especulativo mundial, que transformou o planeta em um grande cassino, onde muito se joga e pouco se produz; tudo liderado pelos EUA e países centrais da Europa. 
 
Basta de capitalismo sem risco, em que os governos socializam com o povo o prejuízo quando os bancos quebram.  

Como o da Grécia, outros governos, entre eles o da presidenta Dilma, estão tomando medidas imediatas para enfrentar a crise capitalista, defender os empregos, a economia e a soberania de cada Nação. 

Mas no fundo, para o médio e longo prazo, a alternativa para os trabalhadores e empresas da produção é o socialismo. 

Ao inferno com os banqueiros usurários e suas crises pré-fabricadas.